Medicina personalizada: uma análise das mudanças de paradigma na regulação

Por Thamires Pandolfi Cappello e André Rinaldi Fukushima

A generalização de serviços, protocolos, tratamentos e das necessidades da sociedade nos parece uma ideia que destoa das novas tendências proporcionadas pela evolução da medicina. Por mais necessários e úteis que os protocolos gerais sejam para o atendimento da população, considerar o indivíduo como um ser único, dotado de peculiaridades genéticas e sociais, tende a ser um novo marco para o alcance de resultados efetivos em saúde, seja em questões terapêuticas ou em questões de gestão.

A medicina personalizada, como o próprio nome sugere, visa trazer ao atendimento médico uma abordagem individual levando em conta as particularidades genéticas, pessoais e inerentes à cada indivíduo. Tem como objetivo primordial proporcionar assistência médica integral e holística, com foco nas características de cada ser, tendo como consequência efeitos no âmbito individual e, também, no âmbito coletivo, uma vez que proporciona resultados clínicos efetivos, além de uma gestão em saúde assertiva, que pode implicar na contenção de gastos e melhor redistribuição de receitas.

O que se pretende é direcionar o foco para diagnósticos mais precisos levando em consideração características específicas e individuais do paciente e a relação deste com diversas doenças. A análise além de genética, também aborda questões pessoais, como hábitos de vida e o meio social. Com a coleta dessas informações, os profissionais de saúde poderão utilizar ferramentas para o suporte das decisões clínicas por meio da Real Word Data em busca de soluções terapêuticas, capazes de antecipar oportunidades de tratamentos eficazes.

Atualmente, a maior concentração da aplicação da medicina personalizada é visível na área de oncologia e de doenças raras, muito embora, seja evidente o esforço da comunidade científica na disseminação para as demais áreas.

Trata-se de um ecossistema complexo que estabelece uma nova vertente de organização e prestação dos serviços em saúde, com interesse em estabelecer uma terceira via entre o público e o privado, ampliando o mapeamento da sociedade sobre questões relativas à saúde, prevenção de doenças e formação de recursos humanos qualificados.

Embora, historicamente seja possível observar a prevalência nos estudos relacionados à medicina personalizada em diversos países, o Brasil está dando os primeiros passos com a criação de condições para o florescimento do modelo.

Isso porque, historicamente, o Brasil passou por profundas e marcantes modificações e reestruturações, especialmente na década de 80, consideradas um divisor de águas do ponto de vista das inovações, nos campos da saúde, da educação e da política-regulatória.

Nessa reestruturação, especialmente na área educacional, passou a ser explorada a ideia do modelo de Hélice Tríplice, proposto pela Universidade Norte Americana de Stanford, que trouxe a integração entre universidades, indústria e governos para que dessa aliança surgissem ideias para preenchimento das lacunas nas áreas científicas. Embora esse modelo já esteja superado em outros países, sua readaptação no Brasil é compatível com o cenário atual de desenvolvimento. O avanço nessa área é lento quando comparado a outros locais do mundo, a exemplo da Suíça, Cingapura e Japão.

Entretanto, em um estudo publicado na The Economist Inteligence Unit Health Care, em 2020, intitulado: “Medicina personalizada na América Latina Universalizando a promessa de inovação”, o Brasil ficou em primeiro lugar nos indicadores, sendo considerado apto para a prática da medicina personalizada. Foi listado, inclusive, entre os cinco países mais preparados a receber esse modelo de inovação. No estudo, o Brasil teve as áreas de governança corporativa, conscientização e atitudes, infraestrutura e administração financeira consideradas maduras suficiente para implementação do modelo.

O mesmo se repetiu em 2021, em estudo publicado na revista Future Proofing Health Care, intitulado “A medicina personalizada de precisão representa melhor qualidade de vida para os pacientes”, no qual o Brasil também ficou em primeiro lugar nos indicadores relevantes para a prática da medicina personalizada.

Ocorre, todavia, que há no país diversas questões regulatórias e estratégicas que precisam evoluir para que seja possível a aplicação do modelo de forma eficaz, segura e econômica do ponto de vista de gestão. Isso porque, os processos regulatórios ainda são pouco flexíveis e relativamente morosos no quesito inovação.

A aplicação do referido modelo traz à tona questões éticas e bioéticas, além de implicações legais relacionadas ao processamento de dados pessoais aplicados à saúde, também conhecido como e-science.

O modelo proposto pela medicina personalizada, por seu caráter disruptivo, traz desafios regulatórios, jurídicos, políticos e educacionais. Isso porque lacunas regulatórias terão que ser preenchidas, visando a segurança jurídica na atuação, além da capacitação profissional especializada capaz de formar profissionais aptos ao manuseio e aplicação com efetividade do modelo.

A medicina pode estar avançando para uma nova vertente, a qual, se bem estudada, regulamentada e aplicada poderá implicar na efetividade da gestão dos sistemas de saúde com a diminuição de custos e aumento proporcional na qualidade de vida e saúde da população brasileira. Para tanto, será necessário que todas as arestas sejam avaliadas para que os efeitos não acabem sendo o contrário do esperado, ou seja, ao invés de avanço científico e gerenciamento de custos, teríamos aumento de custos e atraso em toda cadeia de implementação.


*Thamires Pandolfi Cappello. Doutoranda em Saúde Pública pela USP. Mestre em Direito pela PUC/SP. Coordenadora e professora dos cursos de pós-graduação em Direito Médico, Hospitalar e da Saúde e pós-graduação em Gestão Hospitalar da FASIG. Fundadora do Health Talks BR.

*André Rinaldi Fukushima Doutor em Patologia Experimental e Comparada e Mestre em Toxicologia Analítica pela USP, Bacharel em Farmacia formado pela USJT/SP. Coordenador de expansão, inovação e qualidade acadêmica do Centro Univeristário das Américas – FAM﹒Coordenador de Pós-Graduação, Pesquisa e Regulação da Faculdade de Ciencias da Saúde IGESP — FASIG.

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