Coalizão quer desenvolver vacina da próxima pandemia em 100 dias

Por Daniel Medeiros

A coalizão CEPI, de inovações em preparação a pandemias, lançou a meta de criar a vacina da próxima emergência global de saúde no tempo recorde de até 100 dias, considerando, inclusive, testes clínicos e aprovação regulatória. A organização com sede na Noruega reúne governos, farmacêuticas e institutos de saúde, entre eles a brasileira Fiocruz, está trabalhando para criar, antes que a próxima pandemia ocorra, bibliotecas com projetos de vacinas para as mais de 270 espécies de vírus, das 25 famílias virais atualmente conhecidas, que são capazes de infectar humanos. A ideia básica é usar a inteligência artificial para acelerar a análise do código genético dos patógenos em busca de vulnerabilidades comuns às famílias virais.

Com essa informação, a coalizão espera poder desenvolver imunizantes eficazes contra famílias inteiras de vírus, com maior probabilidade de eficácia e segurança, de modo que possam ser fabricados, testados e aprovados no intervalo de apenas 100 dias.

A meta ousada tem por base uma realização prévia de um dos membros da coalizão. A NEC OncoImmunity, subsidiária norueguesa da NEC, junto com a francesa Transgene, conseguiu desenvolver num prazo similar uma vacina genômica para os cânceres de cabeça, ovário e pescoço, com a ajuda da inteligência artificial. Em teste clínico nos Estados Unidos e na Europa, a vacina é desenvolvida do zero para cada paciente, a partir da análise das vulnerabilidades do DNA e do RNA das células cancerígenas.

Segundo o CEO da empresa, Richard Stratford, a NEC OncoImmunty agora quer reposicionar a tecnologia para desenvolver vacinas para doenças contagiosas, o que implica em seus próprios desafios. “Desenvolver vacinas individuais contra cânceres requer um imunizante seguro e eficaz numa pessoa em particular. Para doenças infecciosas, obviamente, as vacinas têm de cobrir toda a população humana. Há também o desafio de criar imunizantes eficazes contra famílias virais inteiras”, explicou em fala no NEC Visionary Week 2022. Stratford acredita ser possível utilizar a inteligência artificial para identificar partes do código genético dos vírus relacionadas a reações adversas e removê-las da vacina final a fim de torná-la ainda mais segura. O especialista diz também que a tecnologia pode acelerar a compreensão do código genético de famílias virais inteiras em tempo recorde, resolvendo o maior desafio de criar imunizantes numa pandemia.

O CEO da CEPI, Richard Hatchett, lembra que o desenvolvimento da primeira vacina contra o coronavírus Sars-CoV-2, causador da Covid-19, no então prazo recorde de 326 dias só foi possível porque os vírus da mesma família causadores da SARS e da MERS já haviam sido extensivamente estudados anos antes.

“Sabíamos que partes do vírus atacar e como fazer vacinas de RNA mensageiro. Isso nos permitiu iniciar rapidamente o desenvolvimento de um imunizante eficaz. Se pudéssemos utilizar patógenos protótipos de cada família viral, sequenciando seu código genético, temos condições de preparar uma plataforma de resposta rápida. Sabemos que também temos de encurtar todas as outras etapas do desenvolvimento de vacinas. Mas com a ajuda dos parceiros da coalizão, temos a certeza de que desenvolver vacinas no tempo de 100 dias é um desafio possível”, afirmou Hatchett.

Em abril último, a NEC OncoImmunity e a CEPI iniciaram um projeto de pesquisa para desenvolver a primeira vacina eficaz contra vários tipos de coronavírus com o projeto do imunizante sendo orientado por inteligência artificial. Além da vacina genômica contra câncer e da vacina contra múltiplos coronavírus, a NEC também trabalha no desenvolvimento de uma vacina contra Hepatite B em parceria com a farmacêutica japonesa Shionogi, segundo explica Takayuki Morita, CEO da empresa. “Começamos na pesquisa farmacêutica como ‘enablers’, mas logo percebemos que perderíamos uma oportunidade se não nos tornássemos um player no desenvolvimento de medicamentos por inteligência artificial, que está apenas começando”, disse.

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