Doenças raras em foco: momento histórico para a ciência brasileira

Por Roberto Giugliani

As doenças raras desafiam sistemas de saúde no mundo todo e, no Brasil, não é diferente. Ainda convivemos com barreiras importantes, como acesso difícil e desigual a especialistas e a testes diagnósticos, com investigações que se arrastam por anos.

O impacto dessas doenças é expressivo. Embora cada enfermidade seja individualmente pouco frequente, calcula-se que existam entre 7 mil e 8 mil diferentes doenças raras, que juntas afetam até 13 milhões de brasileiros. A grande maioria tem origem genética.

Quando o diagnóstico atrasa – ou nunca chega – o que se prolonga é a incerteza. Famílias vivem anos peregrinando por consultas e exames sem obter uma resposta conclusiva, acumulando frustração, sofrimento e também custos silenciosos ao sistema de saúde, que precisa lidar com internações que poderiam ser evitadas e tratamentos, muitas vezes, desnecessários ou equivocados.

Diante desse cenário, iniciativas que estimulem a cooperação científica e ampliem a capacidade investigativa do país são essenciais. Um exemplo foi a realização, no final de outubro, da Conferência da Rede Internacional de Doenças Não Diagnosticadas (UDNI) no Rio de Janeiro – evento realizado, pela primeira vez, no hemisfério Sul e na América Latina. O movimento sinaliza que a comunidade global reconhece o potencial técnico e institucional da região.

E o Brasil mostrou que esse reconhecimento tem fundamento. A edição de 2025 foi a maior da história da UDNI, com 405 inscritos de 45 países, 55 palestrantes e moderadores, diversas sociedades médicas parceiras e debates que foram das fronteiras da genômica ao uso de inteligência artificial em casos complexos. A expressiva participação latino-americana reforça que o continente está pronto para avançar de forma mais coordenada.

Mas é fundamental reconhecer: um evento não resolve desafios estruturais. Ele pode inspirar, provocar, acelerar, mas só políticas contínuas consolidam mudanças reais. O país precisa ampliar o número de centros especializados e organizá-los em rede, formar mais profissionais treinados na área, integrar a genômica ao cuidado cotidiano e fortalecer a pesquisa clínica, que ainda opera aquém do seu potencial.

Nesse sentido, um movimento recente merece destaque especial. Um acordo firmado entre Ministério da Saúde, Fiocruz, Gemma Therapeutics e Casa dos Raros prevê o desenvolvimento de terapias gênicas no Brasil, com custos mais acessíveis. O primeiro protocolo, voltado à atrofia muscular espinhal (AME), deverá começar ainda em 2025. É um passo concreto rumo às tecnologias que moldarão o futuro da medicina e um sinal de que o país pode, sim, ocupar posição de liderança neste tema.

O impacto desse conjunto de iniciativas – UDNI, novos acordos, fortalecimento da pesquisa – será medido em resultados tangíveis: diagnósticos mais rápidos, famílias com respostas, terapias avançadas acessíveis. Capacidade técnica não nos falta; vontade de avançar, tampouco. O que ainda precisamos é transformar esse potencial em ações coordenadas dentro de um plano consistente, aperfeiçoando e alavancando as políticas públicas na área.

Se conseguirmos sustentar o que profissionais, sociedades médicas e organizações civis vêm defendendo há décadas, o Brasil poderá, enfim, assumir o protagonismo que demonstrou ser capaz de exercer no campo das doenças raras. É exatamente isso que os milhões de brasileiros que convivem com essas condições esperam – e merecem.


*Roberto Giugliani é Diretor Executivo da Casa dos Raros, Head de Doenças Raras da Dasa Genômica, Professor Titular da UFRGS e Médico Geneticista do HCPA (Porto Alegre, RS).

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