Projeto VigiaSUS revela disparidade na classificação de risco em câncer de próstata
Estratégia amplamente utilizada e validada por sistemas de saúde e institutos de pesquisa internacionais, a vigilância ativa no câncer de próstata ainda não é uma terapêutica muito difundida no Brasil. Para obter dados sobre o uso dessa metodologia em pacientes com a doença de baixo risco, o Ministério da Saúde desenvolve, em parceria com o Hospital Moinhos de Vento, de Porto Alegre, o projeto VigiaSUS, viabilizado por meio do Programa de Apoio a Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (Proadi-SUS). Neste mês, foram apresentados os resultados preliminares do levantamento.
A vigilância ativa é uma estratégia de observação vigilante, com realização de exames periódicos no paciente envolvendo toque retal, teste PSA, biópsias e ressonância multiparamétrica de próstata. A terapêutica tem como objetivo evitar ou postergar o uso de tratamentos radicais, como a prostatectomia e radioterapia, em pacientes com a doença de baixo risco. Além disso, tem impacto significativo na qualidade de vida desses homens, evitando problemas como incontinência urinária e impotência.
Realizado em 18 centros de todas as regiões do país – outros três estão em processo de ativação –, o VigiaSUS é dividido em três grandes eixos: prospectivo – que objetiva avaliar e coletar dados da estratégia –, retrospectivo – que avalia o impacto orçamentário da vigilância ativa no sistema de saúde –, e um último que analisa a percepção dos médicos urologistas em relação à terapêutica.
Atualmente, o projeto conta com 190 participantes, dos quais 112 estão em vigilância ativa. Um dos diferenciais do estudo é a presença de 14% de homens pretos e 18% pardos, percentuais inéditos em levantamentos desse tipo no mundo. “Nas outras coortes internacionais, a média de participantes pretos é de 6%, nenhuma chega a 10%”, destacou a pesquisadora do Hospital Moinhos de Vento, Juliana Beust de Lima. O índice é importante, pois indivíduos afrodescendentes costumam desenvolver a doença de forma mais agressiva.
Para ser elegível ao VigiaSUS, é preciso ter diagnóstico de adenocarcinoma de próstata realizado nos últimos 12 meses, com doença localizada, exame de PSA menor que 10 ng/ml e biópsia prostática com Escore de Gleason menor ou igual a 6. Essa classificação é feita no momento do diagnóstico e repetida pela equipe de pesquisa a fim de confirmar ou não o escore.
Até o momento, de um total de 151 pacientes que tiveram os testes refeitos, 30,5% foram reclassificados para Gleason 7, revelou a médica patologista do Moinhos de Vento Carmen Estivallet. Isso mostra uma discrepância na avaliação emitida pelos laudos do Sistema Único de Saúde (SUS), uma vez que esses pacientes encontram-se com uma doença de risco intermediário. A maior taxa de reclassificação das amostras foi percebida no Nordeste (40%) e no Sul (30%).
No âmbito retrospectivo, está sendo feito um levantamento do impacto orçamentário dessa estratégia no SUS. Para poderem traçar um comparativo com o custo de outros procedimentos, os investigadores estão apurando o custo de outros tratamentos. A partir da análise de 499 pacientes que passaram por prostatectomia e radioterapia, chegou-se a um valor médio individual de mais de R$ 9,6 mil. “Queremos, com isso, entender o impacto financeiro da implantação da vigilância ativa no sistema de saúde”, afirmou o pesquisador do Moinhos de Vento, Santiago Tobar.
A análise da percepção dos médicos urologistas sobre a estratégia apontou quais eram as principais dificuldades para a implementação da prática. Para 80% dos profissionais, a não aderência do paciente era o fator mais relevante. Outros 70% se mostraram preocupados em adotar a vigilância ativa em razão da falta ou atraso dos exames necessários para o acompanhamento. “60% dos nossos urologistas indicavam de rotina a vigilância ativa para pacientes de baixo risco, porém, uma parcela significativa, de 30%, não indicava quase nunca”, pontuou o pesquisador e oncologista do Hospital Moinhos de Vento, Jeziel Basso.
Proadi-SUS
O Hospital Moinhos também lidera e participa de uma série de estudos realizados por meio do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (Proadi-SUS). Atualmente, a Instituição possui 37 projetos aprovados junto ao Ministério da Saúde, os quais repercutirão em maior qualidade no atendimento à população de todo o país. Entre as iniciativas, estão pesquisas sobre prevenção ao AVC, assistência em asma e prevalência de HPV entre jovens.