Transformação digital revoluciona a gestão de OPME
Por Gustavo Veloso e Davi Uemoto

O setor de saúde, em especial, a gestão do ciclo de receita de Órteses, Próteses e Materiais Especiais (OPME), passa por um momento crítico no Brasil. A complexidade operacional, o excesso de burocracia e a comunicação fragmentada entre hospitais, médicos, fornecedores e operadoras de planos de saúde resultam em processos morosos, onerosos e pouco transparentes. Nesse contexto, a transformação digital surge como uma poderosa aliada para enfrentar esses desafios e revolucionar o modelo atual.
A ABRAIDI, ao longo dos últimos anos, tem exposto as distorções na saúde que comprometem a sustentabilidade da saúde suplementar e, na última pesquisa divulgada, revelou que os pagamentos pendentes ou não realizados por planos de saúde ou hospitais chegaram a R$ 4,587 bilhões, o que representou 36% do faturamento das empresas. A Associação propõe avançar para uma fase de construção coletiva de soluções e maior colaboração entre todos os envolvidos.

A ideia é criar uma Agenda de Convergência, baseada em ética, diálogo, transparência e compromisso com o bem coletivo. Essa construção deve ser mediada por uma terceira parte neutra – como, por exemplo, o Instituto Ética Saúde – e envolver acordos formais entre hospitais, operadoras, fornecedores e entidades reguladoras, com o objetivo de reconfigurar o relacionamento comercial com foco na sustentabilidade do setor e na qualidade da assistência ao paciente.
O ciclo de receita de OPME é caracterizado por etapas que vão desde a solicitação e aprovação dos materiais até seu uso em procedimentos cirúrgicos e posterior faturamento. A gestão envolve múltiplos atores – hospitais, médicos, fornecedores e operadoras de planos de saúde – e um fluxo descentralizado de informações, o que gera atrasos, erros e perdas financeiras.
Entre os principais problemas, destacam-se a solicitação descentralizada, quando médicos indicam os materiais com base na necessidade clínica, mas a burocracia para aprovação pelas operadoras pode ser demorada e inconsistente; aquisição ineficiente onde a logística hospitalar, baseada em mapas cirúrgicos diários, pode gerar impactos no estoque e na previsibilidade de entrega; falta de integração onde registros físicos e ausência de sistemas compartilhados prejudicam a rastreabilidade de uso e dificultam o controle de inventário.
Somados a esses três primeiros entraves, o faturamento lento das contas hospitalares, muitas vezes dependente de processos manuais, gera glosas, atrasos e desconfiança na relação com fornecedores. Isso compromete o recebimento com pagamentos tardios ou condicionados à liberação de operadoras, o que mina a sustentabilidade dos fornecedores repassando esses riscos aos preços praticados.
Diante de um cenário tão desafiador, a digitalização surge como solução estratégica. A proposta é integrar todo o ecossistema de OPME em uma única plataforma digital, com informações compartilhadas em tempo real por todos os integrantes da cadeia. Essa abordagem pode eliminar falhas operacionais, aumentar a previsibilidade e trazer maior controle financeiro.
As funcionalidades essenciais de uma solução digital incluem a autorização antecipada de procedimentos, garantindo que fornecedores possam preparar estoques com segurança; visibilidade de agendas cirúrgicas para melhorar a logística e reduzir cancelamentos ou atrasos; rastreabilidade de materiais em tempo real e assim permitindo controle preciso do consumo e facilitando o fechamento de contas; automação financeira com dashboards inteligentes para monitorar o status de contas e pagamentos; e uso da tão aplicada inteligência artificial e blockchain para prever necessidades logísticas, mitigar riscos e garantir conformidade regulatória.
A implementação de um modelo digital integrado promete benefícios expressivos com redução de ineficiências operacionais, melhoria no controle de custos e estoques, transparência e confiança nas relações comerciais e ciclo de receita mais curto e confiável. Embora demande investimento inicial e mudança cultural, os ganhos em eficiência, sustentabilidade e segurança compensam. Instituições que adotam soluções digitais tendem a apresentar melhor desempenho financeiro, maior capacidade de planejamento estratégico e menores riscos regulatórios.
A transformação digital aplicada à gestão de OPME não é apenas uma tendência, mas uma necessidade urgente. Ela permite modernizar processos, reduzir perdas e garantir que os dispositivos médicos certos cheguem ao paciente com agilidade e precisão. Somente com colaboração real e ferramentas tecnológicas eficazes será possível construir um novo ciclo – desta vez virtuoso – para o sistema de saúde brasileiro.
*Gustavo Veloso é CEO da Surgical Mapp e Davi Uemoto, gerente executivo da ABRAIDI.