Transformação digital e os desafios da saúde privada
A saúde suplementar brasileira atravessa um momento decisivo. De um lado, há uma pressão crescente provocada pela elevação dos custos assistenciais, aumento da sinistralidade, judicialização de procedimentos e fraudes no sistema. De outro, uma população cada vez mais exigente cobra qualidade no atendimento, agilidade nos processos e um cuidado mais humano e personalizado. Nesse cenário, a tecnologia se consolida como peça-chave para enfrentar esses desafios e transformar o setor.
A sinistralidade tem sido um dos maiores pontos de atenção para as operadoras. Em muitos casos, ela ultrapassa os 85%, comprometendo a sustentabilidade dos planos e exigindo reajustes que penalizam os beneficiários e os contratantes. A judicialização, por sua vez, impõe decisões que muitas vezes desconsideram diretrizes clínicas ou viabilidade econômica, distorcendo o modelo de cuidado e ampliando a insegurança jurídica. Soma-se a isso a incidência de fraudes e desperdícios — práticas que drenam recursos e reduzem a eficiência do sistema.
Paralelamente, cresce a demanda por uma experiência mais fluida e satisfatória. O beneficiário quer ter acesso fácil à rede, entender sua cobertura, consultar um médico sem burocracia e acompanhar seu tratamento de forma integrada. Ou seja, ele deseja um plano de saúde que, de fato, cuide da sua saúde e não apenas que reembolse despesas médicas.
É nesse ponto que a tecnologia se apresenta como uma aliada indispensável. Ferramentas de big data e analytics já são capazes de identificar padrões de comportamento, antecipar riscos e orientar intervenções mais eficazes. A inteligência artificial vem ganhando espaço em áreas como autorização automatizada de procedimentos, apoio à decisão clínica e personalização de planos de cuidado, com ganhos expressivos em agilidade e precisão. A Internet das Coisas (IoT), aplicada à saúde, permite o monitoramento remoto de pacientes crônicos por meio de dispositivos vestíveis, reforçando o cuidado contínuo e ajudando a evitar complicações.
Outro pilar importante é a digitalização do prontuário médico e sua integração entre diferentes elos do sistema. A interoperabilidade das informações é essencial para que hospitais, laboratórios, clínicas e operadoras possam compartilhar dados de forma segura, eficiente e em tempo real, algo fundamental para uma assistência verdadeiramente centrada no paciente. Nesse mesmo sentido, a telemedicina se consolidou como um canal estratégico de cuidado, especialmente quando integrada a modelos híbridos de atenção que combinam tecnologia e presença física, sempre com foco na resolutividade.
Todos esses avanços só fazem sentido se resultarem em um sistema mais sustentável e orientado à saúde, não à doença. E isso só será possível com investimentos consistentes em inovação, governança de dados e uma cultura organizacional aberta à transformação digital.
*Paulo Bittencourt é CEO do Plano Brasil Saúde.