Terapia gênica pode ser resposta futura para tratamento de doenças autoimunes
O Prêmio Nobel de Medicina 2025 reconheceu os cientistas Mary E. Brunkow, Fred Ramsdell e Shimon Sakaguchi que realizaram os estudos sobre a tolerância imunológica periférica. As descobertas identificaram as chamadas células T reguladoras, que atuam na proteção do sistema imune, impedindo que linfócitos ataquem órgãos e tecidos saudáveis. Um exemplo do sucesso do estudo é o tratamento da Ipex, uma doença de origem genética na qual o sistema imune ataca as células do próprio organismo, por meio de terapia gênica.
O médico imunologista Leonardo Oliveira Mendonça, pesquisador do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HCFMUSP) e do Centro Nacional de Erros Inatos da Imunidade e Imunodesregulação (CNE3I), comenta da relação das células T com a Ipex. “Anteriormente a teoria do horror autotóxico, que o corpo ataca ele mesmo, acreditava que o corpo só tinha a capacidade de se autodestruir em determinadas etapas da vida, no caso quando ainda temos timo, uma glândula que atinge seu auge na infância. Com o tempo foram descobertas as células T reguladoras, um subgrupo de células do sangue periférico, que na verdade eram as responsáveis por essa capacidade de autodestruição, e isso só foi confirmado graças à descoberta da doença Ipex. Essa doença é uma autoimunidade que acomete o intestino, uma lesão de pele que lembra alergia cutânea, chamada dermatite atópica, e isso está associado à mutação do gene fox p3, que é justamente o gene que forma aquelas células T.”
Tratamento utilizado
“Ipex é uma doença para a qual hoje não temos um tratamento específico. Então, os tratamentos são feitos com imunossupressores, que seriam usados para outra doença autoimune qualquer, mas ele acaba não respondendo bem. Outra opção é o transplante de medula óssea, que, apesar de ser curativo e benéfico, expõe a pessoa a complicações sérias.”
No tratamento da Ipex, que está ligada ao cromossomo X, ou seja, só atinge homens, Mendonça faz o acompanhamento de um garoto norte-americano. “Esse menino que eu acompanhei o tratamento dos 4 aos 15 anos não possuía um tratamento específico para ele e não conseguia realizar o transplante de medula, pois nenhuma era compatível com ele. Dessa forma, a professora italiana Rosa Baqueta desenvolveu uma terapia gênica para o fox p3, na qual ela utiliza um vírus para corrigir esse fox p3 defeituoso; depois, extraindo várias células do próprio paciente, ela corrige todas e infunde essas células corrigidas no próprio paciente, como um transplante autólogo.”
Depois do tratamento, o garoto teve diversas melhorias nas alergias alimentares, de pele, respiratórias (asma, rinite) e na artrite que tinha, inclusive seu cabelo, que não crescia na parte posterior da cabeça, começou a crescer. A única característica que não teve melhora foi o vitiligo, autoimunidade contra o próprio melanócito da pele.
O especialista afirma que o avanço rápido nesses estudos do Focus-T3 pode ser essencial para o desenvolvimento do tratamento de diversas doenças gênicas. “O tratamento teve um resultado muito bom, muito seguro, não teve nenhum efeito diverso, nenhuma complicação, então, eu vejo esse método com um futuro muito promissor. E, o melhor, não só para a Ipex, mas para outras doenças, visto que o aprendizado que foi adquirido com esta servirá para inúmeras outras condições.” (Com informações do Jornal da USP)