Autismo e o Tema 1082: uma incompatibilidade inquestionável

Por Priscila Gambeta da Silva

O transtorno do espectro autista (TEA) é uma condição permanente que acompanha o indivíduo ao longo de toda a sua vida. Não se trata de uma doença que pode ser curada, mas sim uma condição que exige terapia contínua e apoio constante. Crianças autistas se tornam adultos autistas, e, embora suas necessidades evoluam com o tempo, elas nunca desaparecem.

Nesse contexto, é comum que sejam ajuizadas demandas judiciais para discutir a aplicabilidade do Tema Repetitivo n. 1.082 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aos casos de TEA.

Em junho de 2022, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.082), estabeleceu uma tese visando maior segurança jurídica nos contratos coletivos. Segundo a decisão, a operadora, mesmo após rescindir unilateralmente o plano ou o seguro de saúde coletivo, deve garantir a continuidade da assistência ao beneficiário internado ou em tratamento de doença grave, até a efetiva alta, “garantindo sua sobrevivência e incolumidade física” desde que ele assuma integralmente o pagamento das mensalidades (REsp 1.842.751).

A questão em debate é extremamente relevante e envolve uma gama de questões a serem ponderadas, em especial a correta interpretação dos limites do que seria “tratamento médico garantido de sua sobrevivência” e os mecanismos regulatórios que amparam os beneficiários, assegurando a migração desses consumidores para outras operadoras (portabilidade de carências), aptas a garantir a continuidade do tratamento.

Primeiramente, é essencial entender que o TEA não é uma doença que requer tratamento no sentido tradicional da palavra. Não há medicamentos ou procedimentos médicos capazes de curar ou eliminar o autismo. O que existe são terapias e intervenções comportamentais que auxiliam na melhoria da qualidade de vida e do desenvolvimento das habilidades sociais, comunicativas e cognitivas do indivíduo. Embora tenham um papel importante, esses tratamentos e terapias multidisciplinares não podem ser considerados “tratamento médico garantidor da sobrevivência” do paciente.

Em segundo lugar, é importante destacar que a interrupção do plano de saúde não representa um risco iminente à vida de uma pessoa com TEA. A vida do indivíduo autista não está em perigo caso ele fique sem terapia por um período limitado. No entanto, isso não diminui a importância da terapia – muito pelo contrário.

É fundamental entender que a estrutura dos planos coletivos, regulamentada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), oferece soluções adequadas para garantir a continuidade do tratamento médico de pacientes que necessitam de cuidados contínuos, como nos casos de TEA ou em situações de doenças crônicas.

Para garantir a continuidade da assistência aos beneficiários que perderam o vínculo com o plano de saúde ou tiveram seu contrato rescindido, a ANS assegura o direito à portabilidade de carências. Isso significa que os beneficiários podem contratar um novo plano sem precisar cumprir novos prazos de carências ou cobertura parcial temporária (no caso de doenças ou lesões preexistentes), conforme estabelecido pela RN 438/2018.

Portanto, cabe à operadora e às administradoras, comunicar diretamente aos usuários sobre o direito à portabilidade, “indicando o valor da mensalidade do plano de origem, discriminado por beneficiário”, assim como o início e o fim da contagem do prazo de 60 dias para exercício da prerrogativa (artigo 8º, § 1º, RN 438/2018). Esse direito deve ser garantido sem a exigência de preenchimento do formulário de declaração de saúde para identificar doenças ou lesões preexistentes, exceto quando o plano de destino oferecer coberturas que não estejam previstas na segmentação assistencial do plano de origem.

A rescisão de contratos coletivos de planos de saúde é uma possibilidade prevista tanto em contrato quanto na legislação do setor (9.656/1998) e nas regras da Agência Nacional de Saúde Suplementar. No entanto, para ser válida, essa rescisão nunca deve ocorrer de forma discriminatória ou com o objetivo de restringir acesso a tratamentos.

Ainda que o Tema Repetitivo n. 1.082 do STJ não incida em relação aos beneficiários com TEA, existem mecanismos regulatórios que protegem os consumidores, assegurando que não fiquem desamparados. Esses mecanismos garantem a continuidade dos tratamentos, o acesso às terapias e o apoio necessário, mesmo que o contrato de plano de saúde coletivo seja rescindido.

Dedicar esforços para acolher e informar os beneficiários sobre o processo de portabilidade pode ser uma forma eficaz de reduzir a insegurança, especialmente nos momentos que antecedem a rescisão dos contratos coletivos. Isso contribui para que mais esclarecimentos sobre a dinâmica que envolve os cancelamentos de contrato coletivo cheguem de forma adequada ao consumidor.

Nesse sentido, é fundamental o papel da ANS na criação e divulgação de materiais informativos. A Agência disponibiliza aos consumidores uma cartilha didática sobre cancelamento e portabilidade, que pode ser encontrada no site da ANS.

Clique aqui para acessá-la.


*Priscila Gambeta da Silva é advogada do Bhering Cabral Advogados.

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