Tecnologia: Velhos problemas, novas soluções para a saúde
Por Fillipe Loures
Não é novidade que a promessa da transformação digital na saúde brasileira sofre com vários obstáculos. Prontuários físicos e sistemas isolados e mal projetados mantiveram hospitais, clínicas e unidades básicas de saúde em uma espécie de zona de estagnação tecnológica. Mas esse cenário finalmente começa a mudar — até mais rápido do que prevíamos — com a inteligência artificial (IA) generativa. Uma tecnologia que pode destravar caminhos, acelerar a reinvenção dos modelos de cuidado e até tornar aquilo que conhecemos como “padrão ouro” rapidamente obsoleto.
Para muitos médicos brasileiros, a insistência no uso de prontuários em papel não é apenas uma resistência ao novo; é, na verdade, uma escolha que fazem diante de sistemas antigos, pouco intuitivos e que impõem mais complicações do que soluções — e ainda roubam tempo da consulta que deveria ser gasto com o paciente. É aqui que a IA começa a se destacar, oferecendo fluxos de trabalho mais amigáveis que eliminam a necessidade de digitação manual e automatizam a coleta e análise de dados.
De acordo com o Mapa da Transformação Digital dos Hospitais Brasileiros 2024, elaborado pela FOLKS, 62% das instituições reconhecem a importância da transformação digital em seus planos estratégicos. Ainda assim, apenas 18% contam com estratégias estruturadas. Ou seja, a lacuna entre discurso e prática é grande, mas a pressão por mudança cresce e a inteligência artificial pode ser o elo que faltava para transformar intenção em ação.
Desafios clássicos como interoperabilidade complexa, infraestrutura precária, pouco investimento em pesquisa e déficit na capacitação dos profissionais de saúde desafiaram gestores do setor por anos. Mas esses obstáculos não são mais tão intransponíveis quanto pareciam. A própria natureza da IA generativa, com sua grande capacidade de se adaptar a diferentes contextos e de lidar com dados estruturados (que correspondem a mais de 80% dos dados do setor), permite que soluções sejam construídas mesmo em cenários de baixa maturidade digital e que grandes saltos de geração de valor passem a ser frequentes.
A chave para a transformação é oferecer algo melhor, mais simples, mais eficiente e centrado no usuário. Profissionais sobrecarregados, que enfrentam jornadas exaustivas e lidam com múltiplas demandas, não precisam de mais sistemas sofisticados. Precisam, sim, de soluções que funcionem integradas à sua rotina clínica.
A IA pode e deve ser esse caminho. Um caminho que não exige que se adapte a prática clínica às limitações tecnológicas, mas que adapte a tecnologia à realidade de quem cuida. Com escuta, investimento e atenção às particularidades do sistema de saúde brasileiro, será possível abordar, sob novas perspectivas, os problemas antigos que insistem em perdurar.
*Fillipe Loures é médico e fundador da Voa Health.