Dispositivos médicos: a saúde do brasileiro precisa ser feita no Brasil
Por Jamir Dagir Jr., Franco Pallamolla e Ruy Baumer
Embora o Brasil tenha registrado, em 2024, US$ 1,17 bilhão nas exportações de dispositivos médicos, o país ainda depende significativamente da importação de produtos médico-hospitalares. Ou seja, hoje o país importa mais do que exporta. Essa dependência revela a necessidade urgente de fortalecer a produção nacional de dispositivos médicos, o que não só contribuiria para a redução do déficit comercial, mas também aumentaria a segurança e a autonomia do sistema de saúde brasileiro, gerando mais empregos e fomentando a inovação no setor.
Durante a pandemia de Covid-19, a indústria brasileira desempenhou um papel decisivo, desenvolvendo e produzindo, em solo nacional, equipamentos essenciais como ventiladores pulmonares, luvas, seringas, além de tecnologias para diagnóstico, tratamento e monitoramento de pacientes, especialmente com o fechamento dos mercados internacionais. Em 2024, o setor de dispositivos médicos contribuiu com cerca de 2,1% para o PIB da Indústria de Transformação, mas, mesmo assim, após cinco anos do auge da pandemia, o Brasil ainda importa US$ 9,79 bilhões, o que representa 64% do total de dispositivos médicos demandados domesticamente.
O Brasil tem um potencial enorme para produzir localmente os insumos necessários ao atendimento da população, reduzindo a dependência externa e garantindo maior segurança no abastecimento do mercado. No entanto, para que isso ocorra de forma estruturada, é essencial que haja políticas públicas eficazes, que incentivem a produção local e garantam previsibilidade ao setor. Para isso, é essencial a adoção de mecanismos como a margem de preferência para produtos nacionais nas compras públicas e organização da demanda, por exemplo. Esses instrumentos permitem maior previsibilidade, estimulando a capacidade produtiva e reduzindo a dependência de importações.
Além disso, a redução da carga tributária ou mesmo a isenção para dispositivos médicos deve ser considerada. Atualmente, hospitais públicos e filantrópicos são imunes a impostos na importação de dispositivos médicos, enquanto a indústria nacional enfrenta uma carga tributária elevada. Essa distorção precisa ser corrigida para que o Brasil tenha uma produção local competitiva.
Outra barreira para o fortalecimento da indústria de dispositivos médicos no Brasil é a defasagem da tabela de remuneração do Sistema Único de Saúde (SUS). Sem uma revisão do modelo de pagamentos que reflita a realidade econômica e os avanços tecnológicos, a sustentabilidade das empresas que fornecem ao setor público fica comprometida.
A remuneração dos serviços prestados pelo sistema público é, historicamente, um desafio para a indústria de dispositivos médicos no Brasil. A sustentabilidade do SUS passa pela atualização permanente dos valores pagos pelos serviços de saúde, tal como acontece com os planos de saúde e medicamentos, que têm reajustes anuais. Recolocar essa discussão na pauta é urgente para garantir a qualidade e a disponibilidade de produtos essenciais para a população.
Uma política industrial voltada ao setor de dispositivos médicos deve garantir previsibilidade, segurança jurídica, incentivos à inovação e à produção local, além da busca pela redução do chamado “custo brasil”. O fortalecimento desse setor é estratégico para a saúde e para a economia do país, gerando empregos, promovendo o desenvolvimento tecnológico e garantindo acesso a tratamentos de qualidade para a população brasileira.
A redução da dependência em relação ao exterior é mandatória, pois a necessidade de consumir produtos importados pode criar desafios para o sistema de saúde brasileiro, tanto em crises globais quanto em períodos de instabilidade econômica, como a atual escalada tributária em curso no mundo. Em contraste, uma indústria local fortalecida assegura o fornecimento constante e seguro de dispositivos médicos, independentemente das condições econômicas internas ou externas.
A saúde feita no Brasil precisa ser uma prioridade. O fortalecimento da nossa indústria é essencial para a sustentabilidade do sistema de saúde e para oferecer um tratamento digno e qualificado para a população. É hora de transformar essa visão em políticas concretas que beneficiem toda a sociedade.
*Jamir Dagir Jr. é presidente da ABIMO – Associação Brasileira da Indústria de Dispositivos.
*Franco Pallamolla é Vice-Presidente de Relações Institucionais da ABIMO – Associação Brasileira da Indústria de Dispositivos Médicos.
*Ruy Baumer Presidente do SINAEMO – Sindicato da Indústria de Artigos e Equipamentos Odontológicos, Médicos e Hospitalares do Estado de São Paulo e diretor titular do ComSaude da Fiesp.