Perspectiva: O relógio inteligente vai substituir o eletrocardiograma?

Por André Cripa e Thays Takahashi

Os wearables traduzem-se por qualquer aparelho capaz de ser “vestido”. Um dos mais conhecidos são relógios inteligentes (smart watches), mas há uma série de dispositivos, como pulseiras, óculos, anéis, adesivos, jaquetas e mochilas digitais. Cada vez mais populares no Brasil, eles contam os passos, medem a temperatura, o ritmo cardíaco, o tempo de sono, mas, do ponto de vista médico, a maioria ainda não ultrapassa a barreira do bem-estar e não oferece dados para um diagnóstico médico seguro.

Ainda há, com razão, muita resistência de médicos e de cientistas sobre os wearables porque os dispositivos atuais têm como foco maior as funções recreativas, e não a precisão. É uma escolha das empresas, que ainda tateiam a recepção dos aparelhos em relação ao público final.

É fato que os aparelhos têm registrado aumento de vendas no país: um estudo do IDC Brasil apontou salto de 145% nesse segmento no primeiro trimestre de 2021, ante mesmo período de 2020. Os wearables são amplamente aceitos pelos early adopters (os consumidores ligados nas novas tecnologias), mas ainda há dúvidas quanto à recepção do público em geral.

A conta é relativamente simples: para que os wearables cheguem a um nível de dispositivo médico, é necessário atender a uma série de requisitos científicos e passar por um detalhado processo de aprovação em órgãos regulamentadores (no Brasil, a Anvisa), o que demanda altos investimentos. A maioria dos fabricantes ainda não está disposta a esperar por um retorno a médio/longo prazo, mesmo porque uma tecnologia como essa chegaria ao mercado com um valor alto para os clientes.

Já há, porém, alguns exemplos. Um dos relógios inteligentes mais conhecidos do mercado na atualidade tem algumas autorizações da Anvisa para determinadas funções de seu aplicativo. Uma delas é a análise de dados da frequência do pulso para a identificação de episódios de um dos tipos de arritmia cardíaca, a fibrilação atrial. A outra permite funções como criar, gravar e exibir um ECG (eletrocardiograma) com base nas medições feitas.

Se um paciente chegar a um consultório médico, portanto, o profissional pode deixar de exigir um eletrocardiograma e utilizar, no lugar, os dados do relógio digital? Segundo a Anvisa, não.

Há muitas perguntas ainda a serem respondidas sobre esse assunto. E se o paciente ficar um tempo do dia sem o relógio? E se, ao ter recarregada sua bateria, o aparelho não tiver medido uma situação importante? E se a fibrilação do paciente tiver sido ventricular, e não atrial?

A perspectiva dos próximos anos é que esse cenário de dúvidas mude rapidamente. Com a pandemia de Covid-19, houve uma corrida global das empresas de tecnologia para desenhar produtos que possam acompanhar pacientes a distância e prevenir doenças, uma nova era de tecnologias médicas digitais que vem sendo chamada de Medtech 3.0.

Assim, a tendência é que a função recreativa desses aparelhos possa começar a mudar e evoluir para uma alternativa de diagnóstico clínico domiciliar capaz de oferecer um atendimento remoto personalizado, que economize tempo, dinheiro e, principalmente, cuide da saúde dos seus usuários, graças aos benefícios da Inteligência Artificial (IA).

Segundo um estudo da consultoria Postindustria, o tamanho do mercado para as várias aplicações da IA na saúde deve crescer de US$ 10,4 bilhões em 2021, para impressionantes US$ 120,2 bilhões em 2028. Atualmente, a IA é usada em diagnósticos, tratamentos, pesquisas e treinamentos em saúde, mas o potencial é enorme conforme as tecnologias vão sendo mais difundidas.

O monitoramento remoto contínuo a partir de dispositivos digitais vestíveis e a possibilidade de comunicação periódica via internet vão transformar a relação entre médicos e pacientes em uma parceria. Através da tecnologia, os pacientes poderão compartilhar com profissionais dados mais precisos. Ao mesmo tempo, os usuários vão estar empoderados sobre a sua saúde, sendo mais conscientes e passando a se cuidar melhor.

A capacidade dos wearables de produzir dados individualizados aumenta o desafio da segurança digital dos pacientes. São informações valiosas, que precisam de proteção para evitar riscos para os pacientes e manter os dispositivos seguros. Por isso a ação e o aval dos órgãos reguladores é tão importante: são eles que vão garantir não só a precisão dos dispositivos, mas principalmente a segurança para profissionais e pacientes.

Em um futuro não muito distante, o médico não deixará de olhar nos olhos do paciente – pessoalmente ou por uma tela. Ele ainda vai pesquisar sobre o seu histórico – com perguntas/respostas ou em uma página na nuvem onde há o registro de todas as medições feitas por dispositivos médicos. E continuará fazendo exames clínicos – no consultório ou a distância.

A tecnologia permitirá, na primeira consulta, que o profissional médico tenha dados suficientes para propor um tratamento imediato, sem necessidade de uma bateria de exames – inclusive, sim, um eletrocardiograma.

Isso é ganho de tempo. E o tempo é valioso para a Medicina.


*André Cripa, especialista em Transformação Digital na Saúde pela Harvard Medical School e Economia da Saúde pela Harvard Business School, é Chief Innovation and Digital Officer na CTC, uma das 150 maiores empresas de tecnologia do Brasil.

*Thays Takahashi é médica especializada em Gestão de Saúde pela Unesp.

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