O cenário regulatório e a segurança dos produtos de Cannabis

Por Gustavo de Lima Palhares

Com as diversas iniciativas da indústria e de outros players, bem como movimentos regulatórios envolvidos no negócio de Cannabis no país, o assunto nunca esteve tão aquecido quanto agora, com o objetivo de “organizar a casa” e garantir segurança e eficácia das alternativas, possibilitando o acesso à substância pelos potenciais pacientes – aqueles que podem se beneficiar do uso de algum dos canabinoides existentes na planta de forma eficaz e segura.

É importante lembrar que a regulamentação do uso medicinal da Cannabis no Brasil foi aprovada inicialmente em 2015, com a publicação da RDC de nº 17, pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Essa resolução foi resultado de pressão popular, inclusive por meio de Ação Civil Pública, proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) em 2014, que levou o regulador a implementar medidas excepcionais, permitindo a importação de produtos à base de Cannabis mediante indicação médica. No entanto, a regulamentação permitia a importação de produtos sem registro e sem qualquer garantia de segurança e eficácia, resolvendo parcialmente a questão, até que uma resolução mais estruturada fosse proposta para definir as regras para registro dos produtos e, assim, garantir o acesso seguro e eficaz aos tratamentos.

Em dezembro de 2019, a agência criou uma nova regulamentação: a RDC nº 327, que estabeleceu regras claras para registro, fabricação e prescrição de produtos de Cannabis para comercialização em farmácias, criando um arcabouço regulatório e segurança jurídica para a evolução do mercado no país. Com a RDC 327, a Anvisa passa a garantir segurança e qualidade daqueles produtos que sejam oficialmente registrados pelo órgão, isentando a responsabilidade dos médicos e pacientes, que antes eram obrigados a analisar a procedência dos produtos importados sem, muitas vezes, terem a capacidade para isso. É, então, implementado um modelo viável de acesso com capilaridade e segurança.

Além desses pontos, a resolução também estabelece um prazo de cinco anos para que as empresas apresentem estudos clínicos em humanos, que comprovem as aplicações e resultados de seus produtos. Aquelas que apresentarem seus respectivos estudos poderão receber um registro de medicamento, dentro das regras das RDCs 24/2011 ou 26/2014 – legislação específica vigente. Até agora, 14 empresas obtiveram a autorização sanitária para comercialização de Produtos de Cannabis via RDC 327, sendo duas delas com fabricação local e um modelo mais eficiente que o de produtos fabricados integralmente fora do país.

Andando em paralelo, mais recentemente, em 19 de julho de 2023, a Anvisa publicou a Nota Técnica n. 35/2023/SEI/COCIC/GPCON/DIRE5/ANVISA, deixando claro que a regulamentação de importação direta (antiga RDC 17 e nova RDC 660) trata de “produtos sem registro na Anvisa e que não tiveram sua eficácia, qualidade ou segurança avaliados pela Agência”. Além disso, esclarece ainda que “não é permitida a importação de produtos compostos pela planta de Cannabis in Natura”, as conhecidas flores de Cannabis, para consumo pelo fumo. O regulador então reforça seu comprometimento com um mercado seguro e baseado em ciência.

É importante mencionar que vários estados estão regulamentando o fornecimento gratuito via Sistema Único de Saúde (SUS), como é o caso de São Paulo, com a lei nº 17.618, sancionada pelo governador Tarcísio de Freitas, em 31 de janeiro deste ano. Essa lei possibilitará não só o acesso aos produtos pela população, mas também uma maior economia para a região, que poderá selecionar, por meio de licitação, as empresas com melhor preço e que cumpram as exigências da RDC 327.

Com regulamentação estruturada e a crescente aceitação dos benefícios medicinais da Cannabis, a perspectiva para o mercado é promissora. A organização e o comprometimento da agência reguladora, juntamente com a participação ativa de empresas sérias e comprometidas, contribuirão para que o país alcance um cenário mais seguro e eficaz no tratamento dos potenciais pacientes.

Comercialização no exterior e opções mais seguras localmente

Diferentemente dos Estados Unidos, onde a regulamentação do setor não foi federalizada e os controles de segurança, qualidade e eficácia de produtos derivados da Cannabis não foram estabelecidos, o Brasil tem se destacado como um exemplo de profissionalismo e qualidade regulatória. Com a implementação da RDC 327 e a recente nota técnica, a Anvisa demonstra um claro interesse em impulsionar o mercado e permitir o registro de medicamentos que comprovem não apenas sua segurança, mas também sua eficácia.

Atualmente, já é possível obter tratamentos de qualidade que atendem a todos os padrões e critérios estabelecidos pela nossa agência local. Os caminhos para os estudos clínicos também estão abertos, especialmente após a Anvisa estipular o prazo de registro para as empresas, conforme mencionei anteriormente. Como resultado, apenas as empresas comprometidas com projetos de longo prazo e que estejam de acordo com a RDC 327 seguirão o caminho para registro de seus produtos.

O progresso rumo à aprovação dos produtos como medicamentos é fundamental para o desenvolvimento desse mercado no Brasil. Com essa abordagem, é esperado que haja um fortalecimento do caminho farmacêutico do setor, evitando que mercados paralelos coloquem a população em risco.

Seguindo essa direção, é certo que o Brasil se tornará, nos próximos anos, uma das maiores referências globais na pesquisa clínica, assim como já está se tornando no quesito regulatório que envolve o universo da Cannabis medicinal. Com uma regulamentação eficiente, que prioriza o interesse da população, o país está se consolidando como uma referência internacional no setor, beneficiando a saúde e contribuindo com a ciência.


*Gustavo Palhares é advogado por formação, CEO e co-fundador da Ease Labs.

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