Planos de saúde placebo e o crescimento das clínicas populares

Por Joe Sestello

As clínicas populares cresceram vertiginosamente no país nos últimos anos. A brecha, à época de sua constituição, permitiu a essas empresas atuarem à margem da regulamentação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Na prática, significa dizer que, além de não serem submetidas às regras do órgão regulador quanto aos reajustes, provisionamento, estruturação da rede de assistência, também não são obrigadas a cumprirem o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde, ofertando apenas o básico – atendimento ambulatorial e exames de baixa complexidade –, deixando o usuário sem assistência no momento em que ele mais precisa.

O ‘plano de saúde acessível’ comercializado por estas clínicas não cumpre o que promete. Se por um lado os grupos empresariais acumulam lucros, na ponta o usuário tem a falsa sensação de segurança. Por serem restritos e com alcance limitado, o beneficiário acaba sendo empurrado para o Sistema Único de Saúde (SUS), seja para atendimento de uma urgência ou emergência, bem como nos casos em que necessitar de procedimentos mais complexos e caros – internações, cirurgias, exames de alta complexidade. Portanto, não há vantagem para o cliente que pagou, mas não levou, bem como para a rede de saúde pública. E esta sobrecarga fica ainda mais desleal quando este paciente é regulado tardiamente no sistema.

A proposta de implantação dos planos populares encaminhada pelo governo do então presidente Michel Temer para análise da ANS repercutiu negativamente entre todas as entidades do setor. O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), por exemplo, declarou, na ocasião, que os planos acessíveis não possuíam condições de ofertar serviços que assegurassem ao consumidor a qualidade mínima necessária e segurança, causando graves prejuízos e fazendo ‘explodir’ a judicialização da saúde suplementar.

Sabe-se que uma pequena parcela da população brasileira tem plano de saúde e a maioria depende do serviço público. Entretanto, vale ressaltar que o SUS é um direito de todos garantido pela Constituição. Proponho uma reflexão: se a taxa de cobertura da saúde suplementar cresce conforme as condições de a população contratualizar o plano (como pessoa física ou jurídica), então podemos dizer que o aumento do número de contratos das clínicas populares é um indicador que aponta a dificuldade de acesso ao SUS?

O desserviço das clínicas populares também representa um retrocesso do ponto de vista legal. O rol de cobertura instituído pela lei dos planos de saúde é direito do beneficiário, estabelecendo que as operadoras devam garantir a realização de todos os procedimentos nele previstos por meio da rede assistencial própria, credenciada, contratada ou referenciada, independentemente da abrangência do plano ou da capacidade operacional da operadora.

É fundamental ao usuário estar alerta sobre os riscos ao adquirir um plano acessível, com valor muito abaixo do praticado pelo mercado. Ao se encantar pelo anúncio com preço popular, acaba recebendo muito menos do que espera. Como se pagasse por um, porém levasse apenas meio produto. É primordial fazer o cálculo para se verificar as vantagens e desvantagens, principalmente, quando o assunto é garantia assistencial. Buscar informações sobre as melhores condições de atendimento e cobertura é o melhor caminho. Afinal, quanto vale a sua vida e a da sua família?


*Joé Sestello é diretor presidente da Unimed Nova Iguaçu.

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