Navegação oncológica: o cuidado centrado no paciente
Por Alfredo Scaff
No mês em que celebramos o Dia Mundial do Câncer, somos convidados a refletir sobre a importância de colocar o paciente oncológico no centro do cuidado. Essa abordagem vai além do foco na doença e nos procedimentos, enxergando o ser humano em sua totalidade.
Campanhas como “United by Unique” (unidos pelo que é único, em tradução livre), liderada pela União Internacional de Controle do Câncer (UICC), destacam a necessidade de reconhecer cada indivíduo com suas histórias, desafios e necessidades que demandam atenção personalizada.
Mas é essencial não esquecer e fortalecer as ações de promoção, prevenção e diagnóstico precoce realizadas em âmbito populacional. Combater o tabagismo e suas formas atualizadas, como o vape, deve ser incentivado e ampliado. Além disso, a substituição do método de rastreamento do câncer do colo do útero para o teste de DNA HPV precisa ser concretizada.
O conceito de cuidado centrado no paciente, defendido pela Organização Mundial da Saúde (OMS), valoriza não apenas o tratamento clínico, mas também os aspectos emocionais, sociais e culturais. Essa abordagem é ainda mais relevante no Brasil, onde os desafios do sistema de saúde pública exigem estratégias inovadoras para atender às necessidades dos pacientes oncológicos e suas famílias.
Uma dessas estratégias é a Navegação de Pacientes, metodologia que surgiu em 1990 e já é aplicada com sucesso em diversos países. Estudos, como o publicado pelo New England Journal of Medicine, mostram que a navegação de pacientes melhora significativamente os resultados ao garantir que os indivíduos recebam suporte durante todas as etapas do cuidado, desde o diagnóstico até o tratamento e o acompanhamento. Esse modelo conta com profissionais especializados, como enfermeiros e assistentes sociais, que orientam os pacientes, ajudam a superar barreiras logísticas e promovem a continuidade do tratamento.
No Brasil, iniciativas que integram esse modelo ainda são escassas, mas projetos como o “Navegadoras”, da Fundação do Câncer, têm demonstrado resultados promissores. Implementado em parceria com a Prefeitura de Niterói – RJ, o programa já apresenta impactos positivos na vida de pacientes em tratamento por câncer. A iniciativa conta com profissionais de enfermagem oncológica treinadas para atuar como um elo entre pacientes e o sistema de saúde. Essas navegadoras ajudam a coordenar exames, consultas e tratamentos, além de oferecer suporte emocional.
A integração das Navegadoras ao sistema de saúde também reflete o papel essencial da comunidade no cuidado oncológico. O modelo reconhece que o suporte de redes familiares e sociais fortalece a experiência do paciente, oferecendo uma visão mais holística e humanizada. Essa abordagem amplia o alcance do cuidado centrado nas pessoas, indo além das paredes do hospital e conectando pacientes a um ecossistema de suporte às suas necessidades. É um mapa e uma bússola para a jornada terapêutica, que tem como resultado o tratamento no momento mais oportuno possível.
Ao dar voz às histórias de pacientes e profissionais, a campanha da UICC – “United by Unique” – nos lembra que cada pessoa é única, mas não está sozinha. Esse senso de comunidade e propósito compartilhado é a base para um cuidado mais humano, equitativo e eficaz.
Investir no paciente como protagonista do cuidado não é apenas uma questão ética, mas uma estratégia comprovada para melhorar a qualidade de vida e os resultados no tratamento do câncer.
*Alfredo Scaff é consultor médico da Fundação do Câncer e médico epidemiologista.