Cientistas do MIT usam Big Data e IA para promover a saúde

Os trabalhos científicos na área de saúde são geralmente caros e demorados, além de baseados em pesquisas realizadas sobretudo em países ricos. Ou seja, os cuidados de saúde prestados em todo o mundo são apenas uma reprodução dos resultados obtidos em estudos com americanos ou europeus, não considerando as particularidades das populações locais, inclusive da brasileira. Outro problema recorrente na assistência à saúde é a chamada “medicina baseada em eminência”, quando um profissional consulta um especialista sobre determinado assunto e este responde com base nos poucos casos que atendeu. Apesar de terem tido essas experiências, o atendimento baseado somente na opinião dos experts é algo restrito e que também não considera a diversidade do caso de cada paciente.

Pensando nisso, novas ferramentas computacionais de análise de dados em prontuários eletrônicos estão contribuindo para o desenvolvimento de novas ideias e instrumentos na ciência médica. Valendo-se da inteligência artificial, essas ferramentas estão sendo desenvolvidas para auxiliar na tomada de decisão quanto ao tratamento de pacientes, particularmente daqueles com casos mais graves.

Recorrer a essa tecnologia é uma solução para a “medicina de eminência”, pois o médico não tem acesso somente às dezenas de casos que já presenciou na sua carreira, mas, sim, a todo um banco de dados de milhares de pacientes, gerenciados e desenvolvidos por milhares de cientistas. Porém, o principal desafio é criar um algoritmo que não incorpore preconceitos e vieses dos médicos que criaram o processo de aprendizado de máquina, de forma que a inteligência artificial não se atenha tanto a bons ou maus comportamentos humanos.

Na tentativa de lidar com todos esses problemas, um livro do Laboratório de Fisiologia Computacional (PhysioNET- MIT Critical Data) do MIT (Massachusetts Institute of Technology) foi traduzido para o português para ser divulgado gratuitamente, com exemplos práticos do uso dessas novas ferramentas computacionais em grandes bases de dados médicos. De acordo com um dos coordenadores do Physionet/MIT Critical Data e um dos autores do livro, Leo Celi, “o que estamos tentando promover é que cada país, cada organização, construa seu próprio sistema de conhecimento médico, encarregando-se de suas próprias pesquisas. O que temos feito é criar bancos de dados a partir de registros eletrônicos de saúde, e isso é o que gostaríamos de fazer em muitos países. Um elemento importante em nossa iniciativa é tornar esses conjuntos de dados acessíveis a diferentes especialistas, a diferentes perspectivas, de forma a entender muito sobre nossos pacientes. Imagine se pudéssemos fazer isso por pacientes no Brasil!”.

Leo Celi, um dos coordenadores do Physionet/MIT Critical Data e um dos autores do livro Análise Secundária de Registros Eletrônicos de Saúde

O projeto principal é sediado em Boston, partindo de um conjunto de dados obtidos nas unidades de terapia intensiva de um hospital local. Os pesquisadores coletam esses conjuntos de informações e as disponibilizam ao público, após remover qualquer dado que possa identificar uma pessoa em específico. São cerca de 30 mil pesquisadores analisando esse banco de dados, e a ideia de oferecer acesso a todo esse conhecimento de forma gratuita e online é justamente para ampliar o conhecimento e o alcance da iniciativa, tornando a curadoria e o gerenciamento desses dados um trabalho coletivo e em constante desenvolvimento.

“Nosso evento mais recente no Brasil foi em abril de 2019”, conta o Leo Celi, do MIT. “Oferecemos conjuntos de dados aos participantes do nosso Datathon e metade dos participantes trabalha com dados do governo, do Ministério da Saúde, sendo que a colaboração contou desde o início com o apoio da Fundação TVML, através de bolsas do TVML MIT-Brazil Seed Fund, e ainda está em andamento.” A meta é que o conjunto de dados seja acessível ao maior número possível de cientistas.

Uma das principais vantagens dessa iniciativa é a ênfase na diversidade da pesquisa ao disponibilizar publicamente um recurso tão rico em informações. “Comparamos a produção científica de conjuntos de dados que estão disponíveis para a comunidade de pesquisa no geral com a produção de pesquisa limitada apenas a investigadores internos, com bases de dados privadas. O que descobrimos é que há um melhor equilíbrio de gênero entre os investigadores quando o conjunto de dados está disponível publicamente. Quando está disponível apenas para investigadores internos, você preserva um padrão: basicamente só os professores brancos do sexo masculino conseguem publicar algo”, explica Celi.

A tradução do livro para o português foi realizada pelo médico intensivista brasileiro, diretor científico da Sociedade Mineira de Terapia Intensiva, Leandro Braz de Carvalho. O lançamento da obra em português fez parte das celebrações do 12º aniversário do programa MIT-Brazil. “Por meio de nossos diversos programas e, nesse caso, graças ao suporte da Fundação TVML, podemos dar suporte a pesquisadores do MIT, como Leo Celi, ao conectá-los com instituições, pesquisadores e profissionais brasileiros como o Dr. Leandro, que se envolveu no projeto e pôde deixar esse recurso acessível para mais pessoas”, afirma Rosabelli Coelho-Keyssar, diretora do programa MIT-Brazil.


O livro Análise Secundária de Registros Eletrônicos de Saúde ganha tradução para o português e explica como o uso de informações coletadas com inúmeros pacientes é mais fiel às diversidades populacionais. A publicação também está disponível em quatro idiomas (inglês, espanhol, mandarim e coreano), sendo que a versão em inglês conta com 1,3 milhão de downloads e mais de 200 citações. Faça o download gratuito aqui:


**Artigo publicado originalmente na Revista Medicina S/A, edição 20.
Faça o download gratuito aqui
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