A lacuna entre longevidade e envelhecimento saudável

Por Leonardo Vedolin

O escritor e jornalista da National Geographic Dan Buettner ficou conhecido por estudar regiões do mundo conhecidas como “zonas azuis”, cidades supostamente com grande quantidade de centenários que vivem com autonomia e qualidade de vida. Okinawa, no sul do Japão; Icaria, na Grécia; Sardenha, na Itália; Loma Linda, nos Estados Unidos; e Nicoya, na Costa Rica, foram alguns dos focos de sua pesquisa, que procurou entender a dieta, o estilo de vida e as relações afetivas destas pessoas – informações que poderiam estar ligadas à longevidade.

Mesmo com as críticas e o ceticismo em relação ao método científico aplicado por Buettner, o jornalista ganhou notoriedade graças ao timing de sua pesquisa: tendências globais como o envelhecimento populacional, o crescimento da economia prateada (termo relacionado às atividades desenvolvidas para satisfazer as demandas dos 50 +) e a popularização da medicina regenerativa.

Neste contexto, é inegável que parte crescente da população está disposta a “comprar” qualquer fio de esperança que possa levar a uma vida mais longa e saudável. O resultado desta nova onda são obras como o livro Outlive, de Peter Attia, ou o documentário Don’t Die: The Man Who Wants to Live Forever.

Como médico e executivo, gosto da ideia de pensamento de longo prazo, do crescimento a partir da melhoria contínua e do uso de tecnologias para que possamos viver melhor. Sendo pragmático, me pergunto: é possível viver mais e melhor?

O conceito de tempo de vida saudável pode ser definido como os anos que uma pessoa vive sem limitações físicas, distinto do termo expectativa de vida, que não considera a qualidade dos anos vividos. Os dados são inequívocos: mesmo com a pandemia pelo Covid-19, o mundo tem experimentado um aumento na expectativa de vida para ambos os gêneros. No Brasil, o IBGE divulgou que a expectativa de vida aumentou em 11,3 meses em 2023 em relação a 2022, alcançando 76,4 anos e superando o patamar pré-pandemia.

Entretanto, dados mostraram que, entre 2000 e 2019, a lacuna entre longevidade e anos vividos com saúde aumentou 13%, atingindo uma média de 9,6 anos. Um estudo conduzido pela Mayo Clinic, nos Estados Unidos, analisou dados de 183 países membros da Organização Mundial da Saúde (OMS) e concluiu que a discrepância entre expectativa de vida e expectativa de saúde cresce a cada dia, com milhões de pessoas vivendo mais anos, porém de maneira menos autônoma e saudável, ou seja, quase uma década convivendo com dores, mobilizada reduzida e/ou autonomia comprometida.

DNTs

As doenças crônicas não transmissíveis (DNTs), como problemas cardiovasculares, diabetes e câncer, são os principais fatores por trás dessa lacuna, de acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), no relatório World Populations Prospect 2024. Segundo o documento, problemas crônicos representam hoje a “nova pandemia”, ultrapassando as questões infecciosas na maioria das regiões, sobrecarregando cada vez mais o sistema de saúde e provocando grande impacto econômico. A preocupação com tema ganhou tanta proporção que ONU e OMS têm programada para setembro uma reunião para tratar exclusivamente do tema.

O que a ciência tem comprovado há anos, independentemente de se viver em uma zona azul ou não, é que grande parte da DNTs são preveníveis e podem ser diagnosticadas precocemente. Para combatê-las, ONU e OMS apostam em uma abordagem multidimensional que inclui campanhas para modificação de hábitos, como manter uma dieta alimentar adequada, evitar o consumo de álcool e o tabagismo, aumentar a frequência de atividade física e melhorar a qualidade do sono. Paralelamente, observo a popularização do uso de wearables e sensores, que utilizam dados e capacidade analítica para ampliar o diagnóstico e o engajamento dos usuários em sua saúde.

Além disto, crescem significativamente os investimentos na medicina personalizada e regenerativa, que buscam na integração de práticas saudáveis e uso de suplementos nutricionais e farmacológicos, que o envelhecimento saudável seja físico, mental ou social. Na fronteira da ciência, o domínio cada vez maior das terapias genéticas também representa um ponto de virada para a redução da lacuna entre anos de vida e longevidade sadia. A capacidade de identificar genes associados a doenças relacionadas ao envelhecimento oferece não apenas tratamento, mas a perspectiva real de prevenção de condições que, anteriormente, pareciam inevitáveis com o passar dos anos.

Cito aqui apenas os impactos na saúde, mas o envelhecimento (saudável ou não) trará ainda consequências em outras esferas. Economicamente, espera-se maior pressão sobre o já sobrecarregado sistema de saúde, devido ao aumento do custo assistencial. Do ponto de vista social, será fundamental a discussão sobre as novas formas de trabalho com a automação de processos, o letramento digital de uma geração mais velha, novas visões sobre a previdência social e mudanças no padrão de consumo para atender um cliente mais sênior e com características específicas.

Diante deste cenário, percebo poucas discussões políticas articuladas sobre o tema. São necessárias ações conjuntas que tornem a “quarta idade”, a parcela da população que mais cresce no Brasil, digna de ser usufruída. Isso é sobre adicionar mais saúde aos anos de vida que todos teremos. E menos sobre apenas viver mais.


*Leonardo Vedolin é Vice-presidente Médico da Dasa.

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