A lei que flexibiliza a quebra de patentes farmacêuticas

Por Pedro González Tinoco e Victoria Francesca Buzzacaro Antongini

A publicação da Lei nº 14.200/2021, em 03/09/2021, trouxe mudanças significativas ao procedimento do licenciamento compulsório previsto na Lei nº 9.279/1996 (Lei de Propriedade Industrial) com o objetivo de garantir amplo acesso aos insumos farmacêuticos em casos de emergência nacional, internacional, interesse público ou calamidade pública, tendo como principal motivador a pandemia de Covid-19.

O licenciamento compulsório é instituto previsto da Lei de Propriedade Industrial que busca viabilizar o uso e produção de uma tecnologia patenteada por certo titular para terceiros, por meio da suspensão temporária do direito de exclusividade deste titular, o qual somente podia ser requerido por pessoa com legítimo interesse e que tenha capacidade técnica e econômica para realizar a exploração eficiente do objeto da patente.

Após a alteração legal trazida pela Lei nº 14.200/2021, o licenciamento compulsório poderá ser determinado de ofício nos casos de emergência nacional/internacional ou de interesse público declarado pelo Poder Executivo Federal, ou ainda em razão de reconhecimento de estado de calamidade pública pelo Congresso Nacional, para que a tecnologia possa ser explorada caso o seu titular não atenda à necessidade pública.

Para tanto, o Poder Executivo Federal publicará lista de patentes, a qual será elaborada em conjunto com instituições públicas e privadas, indicando as tecnologias que são potencialmente úteis ao enfrentamento das situações atípicas acima indicadas, com a consequente análise individualizada a respeito da necessidade do licenciamento compulsório.

Importante ressaltar que as patentes farmacêuticas atingidas serão tão somente aquelas cujos titulares não são capazes de atender à situação emergencial e assegurar a satisfação da demanda interna, ou seja, aquelas cujas tecnologias não estão em produção ou licenciamento voluntário para terceiros, sendo que o licenciamento se dará de forma temporária e não exclusiva.

Por se tratar de licenciamento não exclusivo e temporário, aquele que teve sua patente compulsoriamente licenciada passará a receber 1,5% (um e meio por cento) sobre o preço líquido de venda, podendo ser o percentual ajustado de acordo com cada caso, considerando o valor econômico, os custos de produção, o preço de venda no mercado, a duração da licença e as estimativas de investimentos necessários para a sua exploração.

Entretanto, caso o titular da patente que teve sua licença compulsória declarada deseje sua exclusão do licenciamento, deverá assumir compromissos objetivos capazes de assegurar o atendimento da demanda interna em condições de volume, de preço e de prazo compatíveis com as necessidades da situação, se comprometendo a (i) explorar diretamente a patente ou o pedido de patente no país; (ii) licenciar voluntariamente a patente ou o pedido de patente; ou (iii) firmar contratos transparentes de venda de produto associado à seu ativo.

Sobre o licenciamento compulsório no Brasil, relembramos que este já foi aplicado no país em 2007, no caso da emergência sanitária de Aids, frente ao abuso de preços do antirretroviral Efavirenz, de combate ao vírus HIV, pelo laboratório americano Merk Sharp & Dohme, tendo este sido declarado como insumo de interesse público e sua importação realizada na modalidade de genéricos de uma empresa farmacêutica indiana, conforme Decreto nº 6.108/2007.

Dessa forma, vejamos que a publicação da Lei nº 14.200/2021 traz algumas alterações em relação ao procedimento de licenciamento compulsório, especialmente para cenários de calamidade pública como o que enfrentamos por conta da pandemia de Covid-19.


*Pedro González Tinoco é sócio da área de Propriedade Intelectual do Almeida Advogados.
*Victoria Francesca Buzzacaro Antongini é advogada da área de Propriedade Intelectual do Almeida Advogados.

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