Um terço das pessoas evita obter informações sobre a própria saúde
Annals of Behavioral Medicine é uma revista médica mensal publicada pela Oxford University Press.
Um estudo nela publicado no início de agosto mostra que cerca de um terço das pessoas evita ou tende a evitar obter informações sobre sua saúde, mesmo quando o acesso a elas é cada vez mais amplo.
A pesquisa analisou 92 estudos anteriores, envolvendo 564.497 participantes de 25 países. Os resultados revelam que embora o diagnóstico precoce seja muito importante para o sucesso de tratamentos, muitas pessoas resistem a exames preventivos e consultas de rotina. Trata-se da primeira estimativa global sobre o fenômeno, com implicações relevantes para o estabelecimento de políticas de saúde.
Segundo os autores do estudo, a tendência é mais forte diante de doenças incuráveis: 41% evitam informações relacionadas ao Alzheimer e 40% ao Huntington. Em casos de doenças graves, mas tratáveis, como HIV (32%) e câncer (29%), os índices caem um pouco. Já em doenças crônicas e controláveis, como diabetes, a evasão foi menor, ficando em 24%.
Os pesquisadores definem “evitação de informações médicas” como qualquer comportamento voltado a atrasar ou impedir o acesso a dados disponíveis, mas considerados indesejados, desde adiar consultas até recusar exames.
Embora custo e falta de informação sejam fatores frequentemente lembrados, o estudo aponta que o fenômeno não se explica apenas por isso. A Alemanha, por exemplo, onde planos de saúde cobrem consultas e informam pacientes sobre serviços disponíveis, também registrou altos índices de evasão.
“Uma possibilidade é que a decisão de não querer saber seja deliberada”, afirmou Ralph Hertwig, coautor do estudo e diretor do Centro de Racionalidade Adaptativa do Instituto Max Planck, em Berlim. Hertwig lembra que o grupo já identificou esse tipo de “ignorância deliberada” em outras áreas da vida, motivada por razões diversas.
Foram identificados 16 principais fatores que influenciam a evasão, entre eles sentir-se sobrecarregado, baixa confiança na própria capacidade de cuidar da saúde, medo de julgamento, desconfiança e falta de confiança no sistema médico. Questões como gênero, raça ou etnia não tiveram peso relevante.
As variações regionais observadas sugerem que os diferentes sistemas de saúde podem influenciar o comportamento das pessoas, ressaltando que a prática não deve ser automaticamente classificada como irracional: pode ser uma forma de lidar com a ansiedade diante de más notícias.
“Observamos que menor confiança no sistema médico está associada à maior evasão de informações”, destacou Konstantin Offer, principal autor do estudo e pesquisador do Instituto Max Planck. “Restaurar a confiança poderia levar a maior engajamento das pessoas.”
Em resumo, evitar check-ups ou não querer saber o resultado de exames é mais comum do que parece. A dúvida que permanece é como essa tendência, cada vez mais evidenciada, pode impactar os sistemas de saúde e as pessoas no longo prazo.
*Vivaldo José Breternitz é Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo, professor e consultor.