IA e novas tecnologias revolucionam diagnóstico do câncer de mama
O câncer de mama é o tipo mais incidente e a principal causa de morte por câncer entre mulheres no Brasil. A cada ano, o Instituto Nacional de Câncer (Inca) estima 73,6 mil novos diagnósticos no País, com taxa de incidência de 41,8 casos a cada 100 mil mulheres, segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca).
Neste Outubro Rosa, a campanha ganha reforços inéditos. Inteligência Artificial (IA), mamografia 3D, telemedicina e até dispositivos vestíveis prometem transformar o rastreamento precoce e ampliar o acesso a exames em regiões remotas.
Avanço tecnológico como ponto de virada
Para Kenneth Corrêa, palestrante de Dados, Inteligência Artificial e Tecnologias Emergentes e professor na Fundação Getúlio Vargas (FGV), a convergência dessas inovações pode mudar a forma como a sociedade enfrenta a doença.
“Os avanços mais impactantes vêm da convergência de múltiplas tecnologias. A Inteligência Artificial aplicada à análise de imagens, por exemplo, já está elevando a precisão dos diagnósticos a um novo patamar”, afirma Corrêa. Estudos do Imperial College London mostram que sistemas como o Mia detectam até 13% mais casos de câncer do que análises humanas isoladas. Combinada à mamografia 3D (tomossíntese), que melhora a detecção em até 40% em comparação ao exame 2D, a tecnologia aumenta a acurácia e otimiza o fluxo de trabalho em hospitais.

IA como “copiloto” dos radiologistas
É justamente nesse cenário complexo que a Inteligência Artificial mostra seu potencial. Os algoritmos de aprendizado de máquina são treinados com milhões de exames, permitindo identificar padrões sutis e microcalcificações que podem passar despercebidos ao olho humano. “A IA atua como um ‘copiloto’ para o radiologista, fazendo uma primeira varredura e destacando áreas de potencial preocupação. Isso não só aumenta a precisão, como também padroniza a qualidade da análise”, explica Kenneth Corrêa.
Iniciativas como o Google for Health (ou Google Health), iniciativa da Google que integra tecnologia, dados e inteligência artificial para melhorar a saúde das pessoas e o funcionamento de sistemas de saúde, têm investido no desenvolvimento de algoritmos, transformando a IA em uma ferramenta que aumenta a capacidade humana e torna o diagnóstico mais rápido e confiável. Outra inovação destacada por Corrêa é a tecnologia Digistain, desenvolvida pelo Imperial College, capaz de analisar biópsias rapidamente e prever o risco de recorrência, ajudando a evitar quimioterapia desnecessária.
Wearables e telemedicina na linha de frente
Outra frente promissora são os dispositivos vestíveis, que monitoram continuamente alterações no tecido mamário e auxiliam pacientes em tratamento, acompanhando sono, atividade física e estresse, fornecendo dados valiosos para a equipe médica.
“Os wearables transformam a paciente de uma figura passiva para uma participante ativa em sua própria saúde. Já existem protótipos de ‘sutiãs inteligentes’ equipados com biossensores que monitoram continuamente mudanças na temperatura e na elasticidade do tecido mamário, funcionando como um sistema de alerta precoce”, destaca Kenneth.
Telemedicina: quebrando barreiras geográficas
Em um país com as dimensões do Brasil, a telemedicina surge como ferramenta essencial para democratizar o acesso. “Uma paciente pode realizar uma mamografia em um centro de saúde local, e a imagem ser enviada digitalmente para análise por um especialista em um grande centro urbano, que por sua vez utiliza uma ferramenta de IA para auxiliar no laudo”, exemplifica o professor da FGV.
Essa abordagem quebra barreiras geográficas, reduz custos de deslocamento e garante que a qualidade do diagnóstico não dependa da localização da paciente.
Desafios para adoção em larga escala
Apesar do potencial, a implementação enfrenta obstáculos., Kenneth alerta para os desafios à implementação dessas tecnologias no Brasil. “O maior desafio não é a falta da tecnologia, mas sua implementação em escala. No Brasil, enfrentamos três grandes barreiras. A primeira é a de infraestrutura, com conectividade de internet irregular e equipamentos de diagnóstico desigualmente distribuídos pelo país. A segunda é a capacitação, pois precisamos treinar os profissionais de saúde para que utilizem e confiem nessas novas ferramentas. Por fim, há as barreiras de custo e regulatórias, já que a incorporação de novas tecnologias no SUS, por exemplo, envolve processos burocráticos e um investimento inicial que nem sempre é priorizado”, pondera.
O futuro: redes de agentes inteligentes
Olhando para os próximos anos, Corrêa aponta a multimodalidade como grande tendência: IAs capazes de cruzar dados de exames, histórico genético, biópsias líquidas e wearables para gerar diagnósticos holísticos e preditivos.
“A próxima fronteira será a criação de Redes de Agentes Inteligentes. Imagine um agente de IA que monitora continuamente os dados de saúde de uma mulher, identifica um padrão de risco, agenda proativamente uma mamografia e, se necessário, alerta a equipe médica. Isso transforma a saúde de reativa para proativa”, projeta o especialista, citando como exemplo o projeto da Microsoft sobre superinteligência médica publicado em junho de 2024.
Segundo o especialista, essas inovações pavimentam o caminho para as chamadas ‘Organizações Cognitivas’, em que a IA se integra às operações de saúde, tornando o cuidado contínuo, personalizado e preventivo — um futuro que poderia ter mudado o destino de pacientes como Mônica.
“Estamos diante de uma mudança de paradigma. A tecnologia não substitui médicos ou pacientes, mas amplia suas capacidades e cria caminhos para um cuidado mais humano e acessível. Se conseguirmos transformar inovação em inclusão, o Outubro Rosa pode marcar não apenas a luta contra o câncer de mama, mas também o início de uma nova era na saúde preventiva no Brasil.” finaliza Kenneth Corrêa.