Genética e prevenção: ampliar o olhar sobre o câncer de próstata
Por Arthur Silva
Novembro é um mês de conscientização, mas também de reflexão sobre o quanto ainda precisamos avançar no enfrentamento do câncer de próstata. Segundo estimativas recentes do Instituto Nacional de Câncer (INCA), cerca de 71 mil novos casos da doença devem ser diagnosticados anualmente no Brasil — um número que reforça o desafio de diagnóstico precoce e o impacto dessa condição na saúde masculina.
Apesar dos avanços nas campanhas de prevenção, muitos homens ainda chegam ao consultório em estágios mais avançados da doença, quando os sintomas se tornam evidentes — como dificuldade para urinar, sangue na urina ou a sensação de esvaziamento incompleto da bexiga. Nessa altura, o tratamento tende a ser mais complexo e as chances de cura, menores. Essa realidade poderia ser diferente se a prevenção e o rastreamento fossem encarados com a seriedade e a constância que o tema exige.
O papel da genética no diagnóstico e na prevenção
Nos últimos anos, a medicina de precisão trouxe uma nova camada de entendimento sobre o câncer. Testes genéticos passaram a ser aliados importantes na detecção de predisposições hereditárias e na definição de estratégias personalizadas de vigilância e tratamento.
Hoje, é possível identificar mutações em genes como BRCA1 e BRCA2 — tradicionalmente associados ao câncer de mama e ovário — que também estão relacionadas ao aumento do risco para o câncer de próstata e outras neoplasias, como pâncreas e melanoma. Essa informação genética permite que pacientes e médicos adotem medidas preventivas antes mesmo do aparecimento de tumores visíveis.
Em termos práticos, isso significa transformar a lógica do diagnóstico: sair da reação e entrar na antecipação. Ao conhecer seu perfil genético, o paciente pode planejar check-ups mais regulares, ajustar hábitos de vida e discutir com seu médico possíveis abordagens terapêuticas mais adequadas.
Desafios de acesso e políticas públicas
Embora os benefícios sejam claros, o acesso aos testes genéticos ainda é limitado no Brasil. Em 2025, foi aprovado um projeto que prevê a oferta de exames genéticos no SUS para alguns tipos de câncer — como mama, ovário e colorretal. Trata-se de um avanço importante, que pode abrir caminho para a inclusão futura de testes voltados ao câncer de próstata.
Na saúde suplementar, alguns planos já cobrem o exame mediante critérios estabelecidos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o que também sinaliza uma crescente valorização da genética como ferramenta clínica.
No entanto, ainda há um longo caminho até que essa tecnologia se torne parte efetiva da rotina médica no país. É preciso ampliar o debate sobre custo-benefício, diretrizes de uso e treinamento de profissionais de saúde para interpretar os resultados corretamente — evitando tanto o uso ineficiente quanto inadequado desses recursos.
Quebrar tabus e mudar comportamentos
Mais do que acesso tecnológico, o combate ao câncer de próstata exige uma mudança cultural. Muitos homens ainda resistem a realizar exames preventivos por medo, vergonha ou desinformação. Falar sobre o tema com naturalidade e responsabilidade é um passo essencial para quebrar esse ciclo de negligência.
Prevenir é, em essência, um ato de cuidado consigo mesmo e com quem se ama. E quando falamos de genética, prevenção ganha um novo significado: é conhecer o próprio corpo em profundidade, antes que ele apresente sinais de alerta.
Um futuro de decisões mais informadas
A integração da genética à medicina oncológica representa uma oportunidade concreta de transformar a forma como diagnosticamos, tratamos e acompanhamos o câncer de próstata. Essa mudança, porém, depende de uma combinação entre conhecimento científico, políticas públicas inclusivas e uma postura mais ativa da sociedade diante da própria saúde.
Espero que, em breve, possamos olhar para a prevenção não apenas como uma campanha anual, mas como uma cultura permanente — apoiada em dados, tecnologia e, sobretudo, consciência.
*Arthur Silva é Gerente Regional LATAM de Diagnósticos de Oncologia e Precisão da QIAGEN.
