Formação de profissionais no setor de saúde é desafio atual
Os especialistas que participaram do webinar “A crise na formação de profissionais na saúde”, promovido pela Associação Nacional dos Hospitais Privados (Anahp), concordaram que os desafios são grandes. Silvia Cassiani, assessora regional de Enfermería y Técnicos de Salud da OPAS/OMS, apresentou dados demonstrando que até 2030 o setor vai enfrentar um déficit de 10 milhões de profissionais em todo o mundo e que “os enfermeiros representam 50% desse número”.
Cassiani alertou que o apagão de mão de obra será ainda mais crítico em regiões remotas, que atualmente já sofrem com o problema, e destacou a necessidade de “alinhar a formação com as necessidades específicas de cada comunidade”. De acordo com a especialista, os currículos devem ser relacionados com as demandas de saúde locais e o ensino ser promovido na região para formar profissionais com mais probabilidade de permanecerem no local.
Para complicar, a pandemia está promovendo uma evasão das carreiras em saúde. Vania Rohsig, diretora assistencial do Hospital Moinhos de Vento, contou que, antes da Covid-19, a organização tinha uma taxa de turnover de 12% a 15% na enfermagem e que agora o índice varia de 25% a 28%. “Muitos deles não foram para outras instituições, eles simplesmente abandonaram a profissão”, explicou. Cassiani completou que 4% da força de trabalho mundial em saúde pretende se aposentar ou iniciar carreira em outra área depois de ter enfrentado dois anos de emergência sanitária.
Rohsig ressaltou que, além da escassez de pessoas, grande parte dos candidatos em processos seletivos promovidos pelo hospital “não está qualificada tecnicamente”. Por isso, o Moinhos de Vento adotou a estratégia de contratar mais com base em valores do que em competências. “Vamos complementar a formação internamente porque eles não vêm prontos”, explicou.
Alexandre Holthausen, diretor de Educação no Hospital Israelita Albert Einstein, lembrou que a formação do profissional de saúde é complexa. “Tem que ser forte na técnica e na prática, ter bom desenvolvimento socioemocional, capacidade de liderar e seguir aprendendo continuamente. O sistema de ensino não está calibrado para essa realidade”, explicou.
Carlos Ferrara Jr., pró-reitor Acadêmico da Universidade São Camilo, destacou que uma das preocupações atuais entre os educadores é: “Será que o que ensinamos hoje será válido amanhã?”. Na sua opinião, os currículos devem ganhar a mesma dinâmica das inovações do setor para evitar esse risco e formar profissionais com sólidos conhecimentos técnicos, mas também com capacidade analítica, flexibilidade, olhar integrativo e multiprofissional, e totalmente aderentes à transformação digital.
Nesse sentido, Rohsig resumiu que a formação tem que estar sempre de acordo com a entrega de valor aos pacientes e Holthausen citou a recomendação do Institute for Healthcare Improvement (IHI) de melhorar a experiência do indivíduo, melhorar a saúde das populações e reduzir custos. Cassiani sugeriu que os estudantes devem ter mais horas de prática dedicadas à atenção primária em vez passarem o todo o tempo no ambiente hospitalar.
Os especialistas lembraram, no entanto, que a rígida regulamentação do ensino em saúde não favorece ajustes com agilidade. Rohsig exemplificou que quando um “excelente” técnico em enfermagem vai para fazer a graduação na área, tudo o que ele aprendeu é irrelevante no processo, ou seja, tem que começar do zero. “É preciso aproveitar esse legado”, sugeriu. Holthausen completou que as regras devem orientar mais do que taxar as grades curriculares. “O aprendizado tem data de validade curta, por isso é importante calibrar os currículos com rapidez”, disse.
Ferrara Jr. destacou que a evolução passa também pela qualificação dos docentes, uma das prioridades da São Camilo atualmente. Holthausen concordou lembrando que “ser um bom técnico não significa ser um bom educador” e Cassiani apontou que a concentração das pós-graduações nos grandes centros contribui para a escassez de professores.