Lideranças femininas debatem políticas públicas para câncer de mama
“O Brasil está na contramão da história: mesmo com tantas tecnologias, o número de casos de câncer avançado explodiu nos últimos anos. Juntas, podemos nos fortalecer para mudar este cenário”. Foi com esta fala que a presidente voluntária da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (FEMAMA) e Chefe do Serviço de Mastologia do Hospital Moinhos de Vento, Maira Caleffi, deu início à VIII Conferência Nacional de Lideranças Políticas Femininas, realizada na última sexta-feira (23), em São Paulo (SP).
Mais de 70 mulheres, entre lideranças políticas e representantes de ONGs, uniram-se para um dia exclusivamente dedicado a pensar em estratégias de acesso ao diagnóstico ágil e tratamento adequado às pacientes com câncer de mama. Deputadas federais e estaduais, vereadoras, secretária de saúde, primeira-dama e prefeita debateram questões políticas, sociais e econômicas que visam combater a segunda maior causa de mortalidade entre mulheres no Brasil.
O objetivo do evento foi sensibilizar e empoderar a comunidade para evidenciar a urgência da criação, aplicação e monitorização da efetividade de políticas públicas que possam melhorar o atual cenário do câncer de mama no Brasil. “Como médica, o que mais me causa angustia é ver a dificuldade pela qual o paciente passa até descobrir que está com câncer. O governo está muito focado na saúde básica, enquanto a oncologia, por ser vista como algo luxuoso e de alta complexidade, é deixada de lado. É necessário tornar essa questão um problema de atenção primária. Se nos postos de saúde não for considerada a possibilidade de ser um câncer, podem se passar meses até o paciente ter acesso ao diagnóstico”, afirma Maira.
Na primeira palestra, a oncologista clínica do Hospital Sírio Libanês, Andrea Shimada, apresentou um panorama do câncer de mama no Brasil e como cada tumor deve ser tratado de forma individual, além de novas drogas que estão surgindo. “Uma em cada 8 mulheres terá câncer de mama em algum momento da vida. Este é o tumor que mais incide entre o público feminino, e também o que mais mata – em mortalidade, ele só perde para as doenças cardiovasculares. Por isso, fica o questionamento: por que o câncer ainda não foi considerado um problema de saúde básica?”, ressalta a especialista.
Um dos pontos discutidos foi a atual situação do PLC 143/18, conhecido como PL dos 30 dias, que está aguardando aprovação do plenário do Senado. “Já se sabe que o diagnóstico ágil câncer aumenta exponencialmente a chance de sobrevida. Segundo relatório do TCU, o tempo médio para realização de uma mamografia no SUS foi de 36 dias no ano de 2017, e para que a paciente receba o resultado do exame são mais 21 dias, fora a demora para o retorno ao médico. Dessa forma, são no mínimo 57 dias até que ela receba seu diagnóstico”, comenta Ana Lucia Gomes, coordenadora de Relações Institucionais e Advocacy da FEMAMA. “Lutamos para que o prazo máximo de confirmação da hipótese diagnóstica seja de 30 dias”.
Outro ponto abordado foi a Lei 13.685/18, que estabelece a notificação compulsória do câncer, a qual teve sua proposta impulsionada na última edição da Conferência, em 2017, e foi aprovada em 2018 – porém, ainda aguarda regulamentação. De acordo com Manoela Onofrio, gerente executiva do Movimento GoAll, “dados reais sobre o câncer vão ajudar a melhorar a agilidade e qualidade do tratamento, além de auxiliar a aprimorar o planejamento de recursos”.
Além desses desafios, Maria Del Pilar Estevez Diz, oncologista clínica do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP), trouxe à pauta a necessidade de monitoramento de medicamentos essenciais para o tratamento do câncer de mama. O pertuzumabe, por exemplo, terapia que aumenta a sobrevida média global de pacientes metastático HER2+, ainda não está disponível no SUS. Já o trastuzumabe, apesar de ser aprovado para distribuição no SUS, ainda têm o acesso constantemente interrompido. “No fim das contas, o problema do câncer não é só o acesso ao medicamento, mas também ao diagnóstico e à toda linha de cuidado”, reforça.
Projetando o futuro
Depois das explanações, as mulheres trabalharam em duplas para que, a partir dos desafios discutidos, fossem criadas soluções e estratégias para serem, posteriormente, implementadas nos estados e municípios. A presidente voluntária da FEMAMA explica que “o debate e mobilização efetiva frente a essas questões têm que ser feitos além da esfera federal. Vamos buscar fiscalização junto às secretarias de saúde sobre a distribuição do pertuzumabe e trastuzumabe e, quanto ao PLC dos 30 dias, precisamos do apoio de governadores para se mostrarem favoráveis ao projeto”.
Já em relação à regulamentação do registro compulsório, as participantes buscarão mobilização do Ministério Público para exigir regulamentação e cumprimento da lei. “Não podemos nos acomodar com a situação que estamos vivendo agora – é inadmissível que uma lei que tenha entrado em vigor e tinha o prazo de 180 dias para ser regulamentada não tenha sido implementada ainda. Está na hora de dar um basta”, lamenta.