A evolução dos tratamentos para AVC nos últimos 20 anos

Por Feres Chaddad

Após a queda dos casos de Covid-19, os AVCs (sigla para Acidentes Vasculares Cerebrais) voltaram a ser a principal causa de óbitos no Brasil. Segundo um levantamento da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia, somente nos quatro primeiros meses de 2022 foram registradas mais de 35 mil mortes pela doença.

O derrame cerebral é também responsável pela maior incidência de danos neurológicos e incapacidade no mundo, com uma taxa que equivale a mais de 10% dos óbitos no planeta. Das pessoas afetadas, cerca de 70% têm algum prejuízo funcional e 30% apresentam dificuldades de locomoção.  

Os dados são alarmantes. No entanto, índices como esses impulsionaram avanços extremamente significativos nas últimas duas décadas, principalmente no que diz respeito à evolução dos tratamentos neurológicos. 

Um dos estudos mais recentes sobre o progresso da neurocirurgia nos tratamentos para AVC é o Artigo do The Lancet “20 years of improvement in stroke care: the rewards from finally funding more research”, publicado em maio de 2022. Segundo a revisão, as melhorias nesse campo se devem principalmente a três questões:  

1. rápida tradução de resultados de pesquisas sobre a prestação de serviços a pacientes com AVC;  

2. implantação de avaliação neurológica urgente para pacientes com suspeita de ataque isquêmico transitório ou AVC menor;  

3. rápida provisão de trombectomia para pacientes com AVC isquêmico maior. 

Entre as progressões mais importantes no tratamento de AVC nos últimos 20 anos, o estudo apresentou o desenvolvimento de exames por neuroimagem e dispositivos médicos tecnológicos, que ampliaram e aprofundaram a capacidade médica cirúrgica. Assim como mecanismos de avaliação emergenciais e preventivos, além de técnicas que auxiliam a recuperação e estimulam a reabilitação de pessoas que sofreram AVCs e apresentaram sequelas neurológicas. 

Urgência da continuação dos avanços em neurocirurgia  

O artigo do The Lancet ainda deixa claro que os avanços decorreram principalmente do investimento em pesquisas clínicas, focadas em diagnósticos, investigações, prognósticos e tratamentos que posteriormente tiveram efeitos nos cuidados com pacientes que sofreram AVC. O crescente envolvimento dos acometidos nas prioridades dos estudos também ajudaram a produzir dados e relatórios em necessidades clínicas específicas. 

Porém, nem sempre foi assim. Por diversas razões, os financiamentos de pesquisas específicas para AVCs foram negligenciados durante muito tempo. Pelo fato de doenças cerebrovasculares serem um aglomerado heterogêneo de acometimentos neurológicos, predominantemente degenerativos, que não se encaixavam nos modelos reducionistas favorecidos por muitas organizações científicas. Também pelo pouco investimento disponível para pesquisa clínica em geral, principalmente para o tipo de estudo à beira do leito para diagnóstico, investigação, prognóstico e tratamento de AVC, favorecendo pesquisas sobre câncer e doenças cardíacas. 

Existem ainda muitas necessidades clínicas não atendidas pelos sistemas de saúde e que precisam ser resolvidas. Intervenções eficazes para melhorar a reabilitação e recuperação de pacientes que sofreram AVC são escassas. Além disso, as causas de até metade de todas as doenças isquêmicas ainda não são claras, o que aumenta a preocupação, dificultando o trato cirúrgico em alguns casos.  

Progresso precisa se manter constante 

É fundamental dizer e reconhecer que profissionais da área ligados a universidades e que atuam também em centros de saúde continuam tendo um papel crucial na elevação do perfil de pesquisas em todas as áreas, especialmente sobre o AVC. Em particular, aqueles que priorizaram publicações de resultados com base em sua atuação neurocirúrgica.  

O futuro do tratamento do AVC parece mais brilhante agora e deve florescer ainda mais se as tendências de financiamento continuarem, embora exista uma lacuna considerável do investimento em comparação com outras condições, como doenças cardíacas e câncer. O prosseguimento na investigação para doenças cerebrovasculares é imprescindível e o argumento torna-se ainda mais forte visto os enormes custos de saúde e de assistência social, com especial atenção aos países subdesenvolvidos.  


*Feres Chaddad é Professor e Chefe da Disciplina de Neurocirurgia da UNIFESP, Chefe da Neurocirurgia da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo.

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