A importância da evidência científica em uma crise sanitária

Por Danilo Abreu

Estamos vivenciando a maior e mais severa crise sanitária do século e, me arrisco a dizer, uma das maiores crises da informação, visto que a capilarização da internet e redes sociais facilitou e muito a disseminação de informação, seja com viés ou não.

Para uma grande parcela da classe médica, muito preocupa a publicação de artigos apresentando drogas para determinada patologia com um nível de estudo muito insípido e, na maioria das vezes, insuficiente para que haja a tomada de decisão em prescrevê-la. É imprescindível saber o nível de evidência científica do dado em questão, assim como análise crítica da metodologia aplicada para obter tal dado — só assim o profissional médico consegue avaliar a aplicabilidade da medicação e seus riscos para cada paciente.

Para que seja incorporada à decisão clínica, devemos ter como prioridade a melhor evidência científica disponível, somada e equilibrada a outros fatores — como ética e conhecimento adquirido —, ligados ao paciente e ao profissional (valores pessoais, culturais, educacionais etc.), além de levar em conta as limitações (políticas de saúde, tempo etc.).

Ao iniciar a abordagem de conceitos técnicos, opto por alertar, assim como os psicólogos Daniel Kahneman e Amos Tversky o fizeram em 1971: cuidado com números pequenos.

Os seres humanos, em sua maioria, não são estatísticos de forma intuitiva. Isto é, dada uma informação com poucos dados (amostra pequena), pessoas tendem a confiar e tirar conclusões potencialmente precipitadas ao invés de questionar.

Amostras grandes são mais precisas do que amostras pequenas. As menores fornecem resultados extremos com mais frequência do que as grandes o fazem. Então apenas tamanho de amostra é suficiente para dizer que é a melhor evidência científica disponível? Não, há outras variáveis necessárias.

Quando uma pessoa afirma que tratou 100 pacientes com a medicação X e Y, e somente dois foram internados, qual é a pergunta que deveria ser feita? “Mas, e se não tratasse, qual seria o resultado?” Se essa pessoa também tivesse tratado outras 100 pessoas sem administrar a medicação X e Y (Grupo de Controle – sem intervenção) e também apenas duas ou três tivessem sido internadas, então não foi essa medicação (intervenção) que fez a diferença.

O que ocorre é que, na prática, atualmente, quem faz essas afirmações não tem o Grupo de Controle, parte vital do método científico, para afirmar isso. Ainda assim, não seria suficiente uma amostra grande, separada em dois grupos para obter o melhor nível de evidência. É preciso mais…

Os dois grupos (com intervenção e sem a intervenção) precisam estar em condições semelhantes, os examinadores e os examinados não podem interferir nos desfechos a serem avaliados. E, idealmente, não devem saber quem está em cada grupo.

Somando-se todas as etapas mencionadas até então, conseguiremos ter o segundo melhor nível de evidência científica disponível (prospectivo duplo cego randomizado controlado).

Além do nível de evidência, é importante avaliar, antes, durante e após o estudo, possíveis danos colaterais. Com poucas repetições (amostra pequena), e/ou curto período de tempo e/ou sem comparativo, não é possível afirmar se uma intervenção causa dano e não causa benefício, ou se causa benefício, mas o seu dano pode ser extremamente grave. Para pesar benefício e dano é mandatório verificar a variável risco-benefício, pois toda intervenção em saúde tem efeitos colaterais.

Por último, o melhor nível de evidência disponível encontra-se nas chamadas Revisões Sistemáticas, que são realizadas comparando, com boa metodologia, diversos estudos contidos no segundo melhor nível de evidência disponível (Ensaio Clínico Randomizado), observando características semelhantes e resultados diferentes para compilar todas as revisões e concluir, com alto poder de afirmação, se uma intervenção funciona ou não.

Em suma, quando nos depararmos com a questão de que há inúmeros estudos comprovando o benefício de determinado tratamento ou intervenção, precisamos nos perguntar: qual é o nível de evidência do estudo (Estudos in vitro? Estudo com Animais? Opinião de especialista? Relato de caso? Série de Casos? Caso controle? Coorte? Ensaio Clínico Randomizado? Revisão sistemática?)?

Fica a sugestão: um estudo de boa qualidade (Revisão sistemática ou Ensaio Clínico Randomizado) anula milhares de séries de casos.


*Danilo Abreu é superintendente médico-assistencial do Hospital Dona Helena, de Joinville (SC)

Damos valor à sua privacidade

Nós e os nossos parceiros armazenamos ou acedemos a informações dos dispositivos, tais como cookies, e processamos dados pessoais, tais como identificadores exclusivos e informações padrão enviadas pelos dispositivos, para as finalidades descritas abaixo. Poderá clicar para consentir o processamento por nossa parte e pela parte dos nossos parceiros para tais finalidades. Em alternativa, poderá clicar para recusar o consentimento, ou aceder a informações mais pormenorizadas e alterar as suas preferências antes de dar consentimento. As suas preferências serão aplicadas apenas a este website.

Cookies estritamente necessários

Estes cookies são necessários para que o website funcione e não podem ser desligados nos nossos sistemas. Normalmente, eles só são configurados em resposta a ações levadas a cabo por si e que correspondem a uma solicitação de serviços, tais como definir as suas preferências de privacidade, iniciar sessão ou preencher formulários. Pode configurar o seu navegador para bloquear ou alertá-lo(a) sobre esses cookies, mas algumas partes do website não funcionarão. Estes cookies não armazenam qualquer informação pessoal identificável.

Cookies de desempenho

Estes cookies permitem-nos contar visitas e fontes de tráfego, para que possamos medir e melhorar o desempenho do nosso website. Eles ajudam-nos a saber quais são as páginas mais e menos populares e a ver como os visitantes se movimentam pelo website. Todas as informações recolhidas por estes cookies são agregadas e, por conseguinte, anónimas. Se não permitir estes cookies, não saberemos quando visitou o nosso site.

Cookies de funcionalidade

Estes cookies permitem que o site forneça uma funcionalidade e personalização melhoradas. Podem ser estabelecidos por nós ou por fornecedores externos cujos serviços adicionámos às nossas páginas. Se não permitir estes cookies algumas destas funcionalidades, ou mesmo todas, podem não atuar corretamente.

Cookies de publicidade

Estes cookies podem ser estabelecidos através do nosso site pelos nossos parceiros de publicidade. Podem ser usados por essas empresas para construir um perfil sobre os seus interesses e mostrar-lhe anúncios relevantes em outros websites. Eles não armazenam diretamente informações pessoais, mas são baseados na identificação exclusiva do seu navegador e dispositivo de internet. Se não permitir estes cookies, terá menos publicidade direcionada.

Visite as nossas páginas de Políticas de privacidade e Termos e condições.

Importante: A Medicina S/A usa cookies para personalizar conteúdo e anúncios, para melhorar sua experiência em nosso site. Ao continuar, você aceitará o uso. Veja nossa Política de Privacidade.