Estabelecimentos de saúde avançam em digitalização, mas falham em capacitação

A adoção de tecnologias da informação e comunicação (TIC) nos estabelecimentos de saúde brasileiros tem avançado nos últimos anos, mas ainda é reduzido o percentual de profissionais da área que receberam capacitação específica para lidar com as demandas surgidas do processo de transformação digital. A TIC Saúde 2024, lançada nesta sexta-feira (11) pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), apresenta indicadores inéditos sobre o tema.

Conduzida pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br) do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), a 11ª edição da pesquisa mostra que apenas 23% dos médicos realizaram algum tipo de capacitação e formação na área de informática em saúde nos últimos 12 meses anteriores às entrevistas. A mesma proporção foi observada quanto aos enfermeiros (23%).

Entre os médicos que se capacitaram, os principais assuntos estudados foram: segurança do paciente (95%); ética, segurança e privacidade (85%); análise de dados e informação (84%); qualidade dos dados (82%) e cuidados centrados na pessoa (80%). Já entre os enfermeiros, segurança do paciente (85%), cuidados centrados na pessoa (80%), ética, segurança e privacidade (79%), e análise de dados e informação (75%) figuraram entre os temas mais recorrentes.

“Tendo em vista o avanço da saúde digital no país, é fundamental que os profissionais de saúde possuam formação específica para o uso adequado das tecnologias digitais, compreendendo seus potenciais e riscos”, avalia Alexandre Barbosa, gerente do Cetic.br|NIC.br.

Segundo a pesquisa, 92% dos estabelecimentos de saúde no Brasil possuem algum tipo de sistema eletrônico para o registro de informações dos pacientes. De 2023 para 2024, houve aumento de 5 pontos percentuais neste indicador.

Nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), o crescimento foi ainda mais elevado: passou de 89% para 97% na comparação entre os dois anos. Esta maior informatização se refletiu também na maior disponibilidade de alguns tipos de dados em formato eletrônico. Cerca de 95% das UBS têm informações em formato digital sobre vacinas dos pacientes. Além disso, 96% destas unidades mantêm o histórico do paciente e 76% possuem dados de admissão, transferência e alta neste mesmo formato.

“A adoção de sistemas eletrônicos em saúde possibilita melhoria na qualidade e na segurança do atendimento ao paciente, com um potencial de reduzir erros médicos, promovendo práticas clínicas mais seguras e facilitando o compartilhamento e monitoramento de dados entre diferentes níveis de atenção”, enfatiza Barbosa.

Universalização do acesso às TIC

O uso de computadores nos estabelecimentos de saúde brasileiros caminha para a universalização (97%), conforme o levantamento. Constatou-se avanço na adoção de notebooks (de 64% para 68%, de 2023 para 2024) e de tablets (de 36% para 39% no mesmo período). Nas UBS, destaca-se o aumento na utilização de tablets, de 44% para 53%, de um ano para outro.

Em 2024, a pesquisa investigou o uso das TIC por enfermeiros e médicos. As entrevistas com estes profissionais são realizadas a cada dois anos, portanto os dados apresentados devem ser comparados com os da edição de 2022. Os resultados indicam crescimento na adoção de tablets pelos enfermeiros em relação a 2022, passando de 9% para 13%, enquanto a utilização de computadores portáteis permaneceu estável (29%). No caso dos médicos, o aumento se deu no uso de computadores portáteis, que foi de 25% para 36% no mesmo período. Já o de tablets passou de 16% para 18%.

Ferramentas de IA Generativa

Nesta edição, a pesquisa traz um novo indicador sobre o uso de ferramentas de Inteligência Artificial (IA) Generativa pelos profissionais de saúde. Os resultados indicam que cerca de 16% dos enfermeiros utilizaram o recurso, sendo 11% nos estabelecimentos públicos e 26% nos privados. Nos hospitais com mais de 50 leitos de internação, essa ferramenta foi adotada por 23% dos enfermeiros. O principal uso foi para auxiliar em pesquisas (86%) e na comunicação entre a equipe de trabalho (66%).

Entre os médicos, a adesão à IA Generativa foi de 17%, sendo 14% nos estabelecimentos públicos e 20% nos privados. Assim como para os enfermeiros, um maior percentual de médicos dos hospitais com mais de 50 leitos de internação (21%) fez uso dessa ferramenta. O levantamento aponta que 69% utilizaram para auxiliar em pesquisas e 54% para auxiliar nos relatórios inseridos nos prontuários.

Cerca de 4% dos estabelecimentos de saúde brasileiros utilizam IA, sendo que, entre estes estabelecimentos, os recursos mais comuns foram: a automatização de processos de fluxos de trabalho (67%), a aplicação ou o uso de ferramentas de IA Generativa, como ChatGPT e Bard (63%), e a mineração de texto e a análise de linguagem escrita (49%).

Entre os estabelecimentos que não adotaram ferramentas de IA, as principais razões são: a falta de necessidade (59%), não ser uma prioridade (61%), e os custos serem muito altos (49%).

Telessaúde

A pesquisa TIC Saúde 2024 revela, ainda, que cerca de um terço dos estabelecimentos da área oferecem serviços online aos pacientes, como agendamento de consultas e exames, e visualização de resultados de exames. O resultado se manteve estável em relação a 2023.

No que se refere a serviços de telessaúde, a teleconsultoria (consulta entre profissionais de saúde sobre procedimentos clínicos e ações de saúde) foi a mais disponibilizada nos estabelecimentos de saúde (30%), seguido de teleconsulta (23%) e telediagnóstico (23%).

A teleconsultoria está disponível em 38% dos estabelecimentos públicos e em 23% dos privados; o telemonitoramento em 24% contra 9%, respectivamente; e a teleconsulta em 23% de ambos os estabelecimentos.

Segurança da informação

Em 2024, a pesquisa identificou avanços no uso de ferramentas de segurança da informação por parte dos estabelecimentos de saúde. Os principais aumentos se deram no uso de criptografia dos arquivos e e-mails (passou de 46% para 54%, entre 2023 e 2024), e criptografia da base de dados (de 40% para 46%). Além disso, a utilização de certificado digital subiu de 52% para 57% no mesmo período.

Em 47% dos estabelecimentos, os funcionários receberam treinamento em segurança da informação. No entanto, ainda se verifica uma disparidade importante entre os públicos (34%) e os privados (59%) que oferecem esse tipo de capacitação.

Sobre a adoção de medidas relacionadas à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), o levantamento mostra que tem sido mais prevalente nos estabelecimentos privados do que nos públicos. Em 2024, 57% dos privados e 28% dos públicos fizeram campanhas de conscientização interna sobre a LGPD, medida mais adota pelos estabelecimentos. A implementação de um plano de resposta em caso de incidente de segurança de dados pessoais foi feita por 45% dos estabelecimentos privados e 14% dos públicos. Já a nomeação de um encarregado de dados foi realizada por 43% dos privados e 14% dos públicos.

“Esses resultados demonstram que ainda há um desafio considerável para que os estabelecimentos de saúde se adequem às medidas estabelecidas pela LGPD”, conclui Barbosa.

A pesquisa

A pesquisa tem o objetivo de investigar a adoção das TIC nos estabelecimentos de saúde e sua apropriação por profissionais de saúde. Nesta 11ª edição, as entrevistas ocorreram pelo telefone entre fevereiro e agosto de 2024, com 2.057 gestores de estabelecimentos de saúde e 2.021 profissionais de saúde localizados em todo o território nacional.

A pesquisa é organizada pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), departamento do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br) e conta com o apoio institucional de organismos internacionais – como a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) e Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) – além do apoio institucional e técnico do Ministério da Saúde, da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), do Conselho Nacional de Secretarias de Saúde (Conass), do Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), da Sociedade Brasileira de Informática em Saúde (SBIS) e de especialistas vinculados a importantes universidades.

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