Erro médico em laudo radiológico: estratégias ativas na era digital
Por Adolfo Previdelli Bolinelli e Erick Falci Santos

Errar é um ato esperado e na área médica não será diferente. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) o Brasil registrou, em 2023, cerca de 25 mil processos por “erro médico” – ou danos materiais ou morais decorrentes da prestação de serviços de saúde, denominação que passou a ser adotada neste ano pelo Judiciário. O volume representa alta de 35% em relação a 2020.
Muito mais que debater o erro em si, destaco a importância nas medidas implementadas para evitá-los (“camadas de proteção”) e como proceder de maneira ética e transparente quando esses mecanismos falham.
Na prática, a precisão e a clareza dos achados nos laudos radiológicos são fundamentais para direcionar um bom tratamento. Um estudo recente, conduzido pelo médico Andrew Rosenkrantz e sua equipe da NYU Langone Health, publicado no Journal of the American College of Radiology, em maio de 2021, revelou que a radiologia foi responsável por 3,9% de todas as reclamações de negligência médica e por 12,8% das reclamações relacionadas aos erros de diagnóstico. Entre essas reclamações, as imagens oncológicas representam 44% dos casos de negligência, destacando a importância crítica da precisão nessa área.
Erros podem ocorrer nas diferentes etapas do processo diagnóstico. Destaco dois tipos: os de percepção e interpretação. Entender suas nuances é essencial na estratégia de boas práticas.
O erro de percepção refere-se à falha em perceber ou reconhecer informações relevantes durante a avaliação diagnóstica. Quando um erro de percepção ocorre, o médico pode deixar de identificar uma condição crítica, resultando em diagnósticos tardios. Por exemplo, a não percepção de um nódulo na mamografia pode levar a um atraso no diagnóstico de câncer de mama, impactando negativamente no prognóstico.
Já os erros de interpretação podem levar a diagnósticos incorretos, erros de lateralidade ou tratamentos equivocados. Por exemplo, a interpretação errônea de um nódulo hepático pode resultar em uma conduta muito superficial e/ou muito agressiva, desnecessária.
Portanto, precisamos lidar basicamente com dois cenários: as lesões não vistas e as que são identificadas, mas interpretadas erradas. Como proceder?
A seguir, discutiremos três situações fundamentais que podem contribuir para a redução de erros nos laudos de radiologia: a seleção de médicos qualificados, adequação da escala médica e a revisão sistemática dos laudos realizados em horários hostis.
A escolha de profissionais qualificados e com as devidas titulações perante o colégio brasileiro de radiologia (CBR) é a primeira camada de proteção visando minimizar os erros. A seleção criteriosa dos radiologistas que vão compor o time deve considerar não apenas a formação acadêmica, mas também sua especialização, subespecialização e o caráter em lidar com as cobranças da empresa. A captação de radiologistas competentes tem sido um grande desafio na área de teleradiologia.
A adequação da escala médica é outra camada essencial na prevenção de erros nos laudos radiológicos. A carga de trabalho excessiva e a falta de descanso levam à fadiga, comprometendo o nível de atenção e precisão dos médicos. Portanto, é fundamental que as escalas sejam organizadas de forma a garantir que os radiologistas trabalhem com a calma e remuneração adequadas.
Uma escala bem planejada não apenas melhora a qualidade do trabalho, mas também contribui para a saúde e o bem-estar dos médicos, reduzindo situações de “burn-out” e desatenção.
A revisão sistemática dos laudos realizados, principalmente em horários hostis, é uma camada de proteção crítica. Os turnos noturnos são inerentes à nossa profissão e nos coloca à prova em horários onde deveríamos estar descansando (“contra-fisiológico”). A maior concentração de equívocos nos laudos e perda dos prazos de entrega acordados ocorrem durante a madrugada e o motivo no parece muito óbvio: exaustão.
Para reduzir os riscos associados a esses horários, é importante implementar um sistema de revisão sistemática em que todos os laudos feitos durante os turnos noturnos sejam revisados por um segundo radiologista no primeiro horário do expediente regular. Essa prática ajuda a identificar possíveis erros a tempo de solucioná-los, além de uma segunda opinião que enriquece a discussão clínica. A utilização da tecnologia, como sistemas de inteligência artificial, pode auxiliar na triagem inicial dos laudos, destacando áreas que necessitam de atenção especial.
Por fim, ressalto que mesmo adotando todas as boas práticas e camadas de proteções preventivas, lidaremos eventualmente com erros estabelecidos. Nesse contexto, o diálogo e o bom senso na apuração dos fatos entre as lideranças são fundamentais. Assumir a responsabilidade e manter a transparência com os envolvidos não são as questões, devemos trabalhar para minimizar as situações indesejadas e evitar cobranças excessivas ou desleais. Estamos longe da perfeição.
*Adolfo Previdelli Bolinelli é CEO da Erad Solution e Erick Falci Santos é Diretor Geral da Erad Solution.