DNA: das epidemias à Medicina de Precisão, 70 anos de evolução
Por Selma Cavalli
Três letras capazes de identificar os seres vivos em suas particularidades: essa é a riqueza do DNA em toda sua complexidade, desvendada especialmente a partir da descoberta da dupla hélice, 70 anos atrás. Naquele momento, a Ciência avançava no entendimento sobre os organismos de humanos, hospedeiros, vírus e outros seres, aprimorando o desenvolvimento de soluções de saúde individuais e coletivas.
Enfrentar epidemias seria infinitamente mais complexo sem a constatação da cientista britânica Rosalind Franklin, capitalizada em 1953 por James Watson, Francis Crick e Maurice Wilkins.
No decorrer dessas sete décadas, a biologia molecular tem sido crucial para o combate a muitas doenças. Entre elas, estão as arboviroses, como dengue, zika e chikungunya, transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti. Originário da África e presente no Brasil desde o século XVIII, o vetor é responsável por epidemias de dengue desde 1980, mas seu DNA foi detectado somente em 2007 por cientistas norte-americanos e brasileiros. Com ciclos endêmicos e epidêmicos e milhões de vítimas até os dias atuais, finalmente em 2023 temos acesso à primeira vacina contra a doença – Qdenga/Takeda Pharma -, composta pelos quatro sorotipos do vírus obtidos por tecnologia de DNA recombinante.
Enfrentamos duas pandemias respiratórias neste século XXI. Em 2019, a Influenza A H1N1 retorna com força e é rapidamente combatida com atualização de vacinas e campanha de imunização nacional em 2010. E a Covid-19, causada pelo SARS-Cov-2, identificado na China em dezembro de 2019. Entre o início do período pandêmico, definido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em março de 2020, cientistas ao redor do globo gestaram estudos clínicos e deram luz a vacinas que já em dezembro daquele ano começavam a ser aplicadas, levando a esperança de retorno à normalidade. Muitos sequenciamentos genéticos foram necessários para isso e para que fossem desenvolvidos testes rápidos, autotestes e novas terapias.
Entre tantos desafios pungentes, cresce a preocupação global com o câncer, segunda principal causa de morte no mundo, ceifando mais de 9,6 milhões de vidas anualmente, afetando pacientes, famílias e sistemas de saúde. O esforço dos cientistas é proporcional à gravidade da situação: estão latentes as evidências sobre a importância do genoma para diagnóstico e tratamento, por meio da Oncologia de Precisão.
A análise molecular permite identificar alterações genéticas das células cancerígenas e como elas se comportam, contribuindo para o desenvolvimento de novas terapias. A partir do perfil molecular do tumor, é possível obter informações acionáveis para que médicos possam prescrever terapias-alvo, como a CAR-T, ou imunoterapias personalizadas. Temos equipamentos de ponta para realizar análises assertivas com uso de pequenas amostras do tumor, capazes de emitir resultados em apenas 24 horas por meio de fluxos automatizados.
A dupla hélice e a composição do DNA nos relembram que impactar positivamente o mundo é, desde sempre, fruto de esforço coletivo.
*Selma Cavalli é diretora de Biociências da Thermo Fisher no Brasil na América Latina.