Estudo defende ensaios clínicos mais inclusivos para ampliar vacinação
Em artigo publicado na revista científica Cell Host & Microbe da editora Cell Press (grupo Elsevier), pesquisadores da Fiocruz analisam desigualdades na cobertura vacinal entre grupos vulneráveis à Covid-19 grave e propõem estratégias mais inclusivas para garantir equidade na imunização de gestantes, idosos e pessoas imunocomprometidas. Segundo o estudo, apesar da eficácia comprovada das vacinas na prevenção de casos graves e mortes, a adesão entre esses grupos de alto risco continua preocupantemente baixa em diversas regiões do mundo. Os cientistas discutem fatores como barreiras de acesso, desinformação e a falta de dados específicos sobre segurança e eficácia para essas populações.
“Vacinas eficazes só cumprem integralmente seu papel quando chegam a quem mais precisa. Isso exige políticas baseadas em evidências, comunicação clara e ensaios clínicos verdadeiramente inclusivos”, afirmam os pesquisadores da Fiocruz Bahia, Viviane Boaventura, Manoel Barral e Thiago Cerqueira no texto do artigo, que foi intitulado Otimização da proteção vacinal para populações de alto risco (tradução livre). Essas conclusões reforçam a urgência de estratégias mais equitativas e baseadas em evidências científicas, garantindo que os benefícios das vacinas alcancem todos os grupos populacionais.
O artigo destaca que a maioria das vacinas é desenvolvida e testada em populações de baixo risco, excluindo justamente os grupos mais vulneráveis. Essa “proteção por exclusão” cria lacunas importantes de evidência científica e dificulta decisões de saúde pública, além de favorecer a disseminação de notícias falsas.

Os pesquisadores observam que esse cenário começa a evoluir. O ensaio clínico da vacina Abrysvo (Pfizer), aprovada para gestantes contra o vírus sincicial respiratório (VSR), demonstra que é possível realizar estudos seguros e eficazes com populações tradicionalmente excluídas.
A análise ainda conclui que a inclusão de populações vulneráveis nos ensaios clínicos e nas estratégias de imunização é tanto uma questão científica quanto de justiça social. Gestantes, idosos e indivíduos com comorbidades estáveis devem ser considerados elegíveis para estudos clínicos, salvo quando houver evidências concretas de risco.
Os pesquisadores também apontam o papel crucial dos estudos observacionais, fundamentais para compreender a efetividade das vacinas em condições reais. Esses estudos foram essenciais para identificar, por exemplo, o declínio da imunidade contra a Covid-19 e orientar a adoção de doses de reforço em diversos países.
Cobertura vacinal desigual reflete barreiras sociais e estruturais
Análises recentes mostram que a cobertura vacinal entre populações vulneráveis é de 10 a 20% menor do que na população geral. Entre gestantes, por exemplo, a adesão à vacina contra a Covid-19 nos Estados Unidos chegou a apenas 16% em 2021, com fortes disparidades raciais — 6% entre mulheres negras e 25% entre mulheres asiáticas. Em 2025, a taxa permanece próxima de 14%.
Entre pessoas vivendo com HIV, a adesão vacinal varia de 19 a 90%, com menores índices em países africanos e do Mediterrâneo Oriental. Já entre idosos, as menores coberturas foram registradas em países africanos (mediana de 47% para a primeira dose de reforço), enquanto a Europa apresenta os índices mais elevados.
Os autores também apontam que desigualdades socioeconômicas, hesitação vacinal, desinformação e politização das campanhas estão entre os principais fatores que sustentam essas disparidades.
Evidências recentes mostram, por exemplo, que idosos e pessoas imunocomprometidas respondem de forma diferente às vacinas convencionais. A senescência imunológica reduz a produção de anticorpos e a duração da proteção, reforçando a necessidade de formulações e esquemas de doses personalizados. Mesmo entre os imunocomprometidos (em que a eficácia pode ser menor) a vacinação continua oferecendo proteção substancial contra hospitalizações e mortes. (Com informações da Agência Fiocruz)
