Por que as contas não fecham na saúde suplementar?
Por Richard Oliveira
Tomado por sinais fracos em 2021 e mais fortes em 2022, as notícias preveem pela primeira vez na história prejuízo às operadoras de planos de saúde. Foram quase R$ 700 milhões negativos no semestre. Confesso que não me surpreendi dado o cenário pelo qual as operadoras e a saúde suplementar como um todo passaram nos últimos anos.
A pandemia foi a ponta de um gigantesco iceberg. A Covid-19 determinou mudanças rápidas, de modo que investimentos previstos para outras frentes da saúde precisaram ser aplicadas na gestão da pandemia para cuidar e salvar vidas, e quando o cenário pandêmico estabilizou, procedimentos, exames e consultas retidas foram feitas em velocidade de tsunami, levando consigo despesas que nem de longe eram proporcionais às receitas geradas pelas operadoras. O aumento dos gastos assistenciais (cirurgias, exames, consultas) não é fruto apenas da frequência de uso, mas de uma alta de preços de insumos que inflacionam o setor, provocada em parte pela própria pandemia, que não retomou um patamar de normalidade. Em termos numéricos, segundo o EBITDA, o resultado operacional das operadoras de saúde nos primeiros seis meses deste ano foi negativo (na ordem de R$822 milhões). A título de comparação, em 2018 foram R$5 bilhões e em 2019, 6 bilhões positivos para o mesmo período, ou seja, muita flexibilidade para adaptação das operadoras nesse novo formato. Há de citar, ainda, que a ANS determinou resoluções que reduzem pela metade o tempo para as operadoras se adequarem a todas elas, submetendo com severas multas aquelas que descumprem qualquer regra.
O sentimento de um gestor na área da saúde suplementar, como eu, é a de “salvem-se quem puder” diante de tantos desafios enfrentados e pouca compreensão pelos órgãos competentes. Como os beneficiários dos planos de saúde poderão arcar com reajustes que superam taxas de 30, 40%? E como colocar para as operadoras a responsabilidade de atender terapias, sendo passíveis de multas, se há escassez de profissionais, sem perspectivas de políticas que possam reverter esse quadro e, sem sequer, órgãos reguladores terem ajudado na precificação de tudo isso?
A responsabilidade da situação também se aplica à forma pela qual alguns médicos e pacientes utilizam o plano de saúde. De um lado, os profissionais que assinam requisições sem questionamentos ao paciente. Do outro, pacientes que praticam o turismo médico, saltando de especialista para especialista, sem compreender que o uso do plano descontrolado faz a curva da sinistralidade subir, elevando os custos gerais que serão pagos meses depois pela operadora e pelo próprio beneficiário, no reajuste seguinte. Essa é uma ponderação que precisa constar no plano estratégico de curto e longo prazo em todos os desdobramentos da “saúde”, estou falando da accountability (responsabilidade bilateral), a geração desse sinistro precisa ser medida e controlada com parcimônia. Os “utilizadores” são obrigados a conhecer todas as consequências de um mau manejo do seu plano de saúde e, mais importante, concentrar esforços no preditivo, isso sim, deixa todo o ecossistema fluido.
Me preocupa o futuro das operadoras, em um mercado competidor e acalorado como estamos inseridos, toda cadeia movida pelo setor sofrerá impactos. Com menos recursos em caixa, contratos serão rescindidos, parcerias com empresas podem ser pausadas, corte de custos e de pessoal se tornarão inevitáveis, contribuindo para a retenção da economia como um todo, além da empregabilidade que terá suas consequências.
Tudo isso faz elevar o nível de agressividade nos custos e estratégias, e entendo que para superar o cenário a tecnologia da informação e a gestão de dados precisam caminhar de mãos dadas para permitir escalabilidade nos serviços e no atendimento. Nas situações mais ofensivas, enxergo na verticalização o norte para autonomia e controle dos custos, além de um acompanhamento performado da administração para constância e resultado, inerente e rotineiro, que resultem no cliente no centro, melhor serviço entregue e remuneração meritocrática dos profissionais da ponta.
*Richard Oliveira é CEO da Unimed Grande Florianópolis.