O preço do adiamento de consultas médicas eletivas

Por Antonio Carlos Lopes

Com a explosão de casos de coronavírus no País e alta taxa de contaminação da doença, os hospitais brasileiros, já há muito tempo sucateados por descaso e falhas de gestão, concentraram-se em atender a população atingida pelo COVID-19. Por questões de saúde e segurança, os procedimentos eletivos foram todos postergados para depois da pandemia. Mas isso, não há a menor dúvida, terá um preço amargo.

Neste momento, a atenção limitada às urgências é essencial para conter o avanço do coronavírus e retomar a normalidade, todos concordam. Porém, enquanto isso, as pessoas que se encaixam no grupo de brasileiros com comorbidades, tipo hipertensão, obesidade ou diabetes, veem suas doenças evoluírem sem o acompanhamento terapêutico necessário. Estima-se que esse grupo represente quase metade da população. Futuramente, teremos dificuldades de responder às consequências desse buraco no atendimento.

Chegará a hora em que os casos não urgentes exigirão solução. Depois da pandemia, uma avalanche de consultas e ajustes de medicamentos se farão necessárias.

Atualmente, se o indivíduo precisa de um remédio, ele tem de apresentar uma receita, por vezes, uma receita especial. Contudo, em meio ao caos de agora e sem acesso a auxílio médico, ele simplesmente não consegue obter seus medicamentos seja na rede pública ou privada.

Quando virarmos a página da COVID, o que torço para que seja o mais breve, aqueles com comorbidades precisarão ser ainda mais cuidadosos. As regras preventivas de distanciamento social, utilização de máscara e álcool em gel e higienização das mãos serão fundamentais para evitar uma possível contaminação. Visto que a doença parece ser mais virulenta entre essas pessoas, recomenda-se cautela redobrada no retorno às atividades de rotina.

Os hospitais e profissionais de saúde também terão papel relevante em tal contexto: precisarão correr com competência atrás do prejuízo. Teremos, enfim, demasiado trabalho no pós-pandemia, para colocar a casa em ordem novamente.

Se antes já não havia oferta para todos os enfermos nos serviços públicos, a situação só tende a se tornar ainda mais desafiadora. Enfrentaremos uma enorme demanda reprimida, já que todos os procedimentos que não foram feitos agora, precisarão ser realizados depois.

Daí, ser essencial que a sociedade acenda o sinal de alerta desde já e começa a cobrar das autoridades responsáveis uma organização eficaz do sistema, para que não percamos mais vidas no Brasil.


*Antonio Carlos Lopes é presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica.

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