Pesquisadores formulam consenso para o tratamento do câncer de cabeça e pescoço na América Latina
Dezenas de pesquisadores se uniram para adaptar protocolos internacionais à realidade latino-americana e auxiliar a padronizar a conduta médica em casos de câncer de cabeça e pescoço.
O resultado do esforço é o “Latin American Consensus on the Treatment of Head and Neck Cancer”, publicado recentemente na revista JCO Global Oncology, e um marco para o tratamento do câncer de cabeça e pescoço no Brasil e na América Latina, segundo o cirurgião Renan Lira, coordenador da pós-graduação em Cirurgia Robótica de Cabeça e Pescoço do Ensino Einstein.
“Esse documento vai ajudar muito os especialistas que lidam com câncer de cabeça e pescoço a tomarem as melhores decisões possíveis para os seus pacientes, considerando as melhores práticas e evidências científicas”, avalia Lira.
Os pesquisadores consideraram as limitações de recursos em parte das unidades de saúde latino-americanas e incorporaram as possíveis restrições práticas ao documento.
“Não adianta dizer que é necessário realizar um PET scan para avaliar o câncer de orofaringe se não há oferta do exame em parte dos equipamentos públicos do Brasil, Bolívia ou Colômbia”, comenta o cirurgião Leandro Luongo Matos, professor do curso de medicina do Ensino Einstein e primeiro autor do consenso.
“Queremos prestar um serviço de saúde de qualidade, mas há indisponibilidade de recursos em grande parte dos países”, ressalta Matos.
No Brasil, o Instituto Nacional de Câncer (Inca) estima o surgimento de 39.550 novos casos de câncer de cabeça e pescoço por ano – incluindo os tumores de cavidade oral, tireoide e laringe –, e com frequência o diagnóstico ocorre em estágios avançados.
Recomendação para cada cenário – Até a publicação do consenso, as duas referências adotadas eram dos Estados Unidos e da Europa, baseadas em realidades diferentes da latino-americana.
Além disso, as diretrizes assistenciais regionais estavam desatualizadas e havia o desejo de produzir um documento que pudesse ser amplamente acessado e dar subsídio ao atendimento – o consenso foi disponibilizado de forma aberta, com download gratuito.
A equipe, que engloba especialistas do Brasil, Peru, Uruguai, Argentina, Colômbia, Canadá, Chile, México, Paraguai, Estados Unidos, Escócia e França, partiu do princípio de que locais com toda a estrutura necessária seguirão adotando a diretriz europeia ou norte-americana, e ponderou as outras opções em situações de ausência de recursos.
Ao todo, são apresentadas 48 recomendações relacionadas à avaliação do tumor – estadiamento e análise histopatológica – e às opções de tratamento. Cada uma delas é baseada nas evidências disponíveis na literatura, na análise de uma dupla de especialistas e nos possíveis meios à disposição da equipe de saúde. “É um documento muito abrangente, que inclui basicamente todos os tumores de cabeça e pescoço”, pondera Lira.
“O consenso contempla as diretrizes internacionais e orienta a, sempre que possível, praticar a conduta com melhor evidência”, diz Matos. “Mas apontamos também o mínimo para cada situação, damos alternativa quando o ideal não está ao alcance.”
Olhar para a América Latina – Profissionais do Einstein também têm atuado na divulgação do Código Latino-Americano e Caribenho contra o Câncer, primeira adaptação regional do Código Europeu Contra o Câncer.
Lançado no fim de 2023, o documento foi elaborado por mais de 60 especialistas da América Latina e do Caribe. Os profissionais discutiram as diretrizes de prevenção e detecção precoce da doença considerando as condições epidemiológicas, econômicas, sociais e culturais da região, como pobreza, desemprego, falta de moradia, água potável e saneamento, dificuldades no acesso à alimentação saudável e infraestruturas de saúde.