A cirurgia bariátrica para o controle de comorbidades em idosos
A revista Geriatrics Gerontology and Aging (revista científica da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia) publicou em sua mais recente edição (outubro de 2020) um artigo de revisão que aborda o procedimento de cirurgia bariátrica em idosos.
Apesar de no Brasil um em cada 5 idosos, em média, serem obesos e o número de idosos submetidos a procedimentos de cirurgia bariátrica estar crescendo substancialmente, esse assunto ainda tem sido pouco estudado.
Segundo dados da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, houve um aumento de 42,7% no número de cirurgias realizadas no país (de 72 mil em 2012 para 105 mil em 2017), muitas delas em indivíduos com mais de 60 anos de idade.
A indicação da cirurgia bariátrica para idosos segue os mesmos critérios já estabelecidos para os menores de 65 anos, ou seja, pacientes com índice de massa corporal (IMC) maior que 35 kg/m2 que tenham complicações como síndrome da apneia do sono (SAOS), hipertensão arterial sistêmica (HAS), diabetes melito (DM), dislipidemia e doenças articulares degenerativas e para pacientes com IMC maior ou igual a 40 kg/m2 que não tenham obtido sucesso na perda de peso após dois anos de tratamento clínico (incluindo o uso de medicamentos).
Nessa cirurgia, o desvio do fluxo de alimentos produz alterações nos hormônios intestinais que promovem a saciedade e suprimem a fome. O paciente submetido à cirurgia perde de 60 a 80% do excesso de peso inicial (jovens).
No geral, os estudos selecionados nessa revisão de literatura apontam para um grande número de evidências científicas que convergem para os efeitos benéficos da cirurgia bariátrica em idosos, como uma perda de peso média entre 25 e 35% do peso anterior à cirurgia.
Na Universidade de Brasília (UnB) temos um grupo de pesquisa que acompanha uma coorte de idosos submetidos a cirurgia bariátrica. Um dos principais achados de nossos estudos aborda o benefício metabólico da cirurgia bariátrica no idoso. Estudo publicado por nosso grupo recentemente na revista The Journal of Nutrition, Health & Aging. (2020;24(8):865-869) demonstrou ganhos clínicos significativos após 6 anos de cirurgia, sobretudo reduções no número médio de medicamentos usados, número de comorbidades, níveis de triglicerídeos e hemoglobina glicada, e substancial aumento dos níveis médios de HDL.
Para além dos ganhos metabólicos, os benefícios na esfera mental também são visíveis, como menor prevalência de sintomas depressivos, ansiosos, de abuso do álcool e de compulsão alimentar (dados ainda não publicados).
Talvez, mais que preocupação em relação ao benefício da cirurgia bariátrica em idosos, exista dúvida acerca de sua segurança. Apesar das plausíveis apreensões relativas a esse procedimento cirúrgico em indivíduos mais velhos, uma revisão sistemática com 38 estudos comparou a segurança da intervenção cirúrgica bariátrica entre idosos e jovens, demonstrando que a maioria dos estudos não observou diferenças na mortalidade precoce ou nas taxas de complicações entre os grupos.
Apesar dos referidos benefícios e da segurança da cirurgia em idosos, os médicos devem ficar atentos a possíveis déficits nutricionais. As principais deficiências nutricionais pós-bariátrica nos idosos, assim como nos jovens, dão-se pela redução da ingesta alimentar ou pela diminuição da área de absorção de nutrientes provocada pela cirurgia. Devem ser monitorados níveis de vitamina B12, folato, ferro, tiamina, vitamina D, cálcio, zinco e cobre.
Por fim, há espaço para que procedimentos de cirurgia bariátrica sejam indicados a idosos elegíveis, sem limite de idade, mas considerando uma boa avaliação funcional e a expectativa de vida. Recomenda-se também a necessidade do acompanhamento amiúde desses indivíduos, sugerindo estudos a longo prazo para a identificação de possíveis complicações tardias que ainda não foram estudadas.
*Rubens de Fraga Júnior é Especialista em geriatria e gerontologia. Professor titular da disciplina de gerontologia da Faculdade Evangélica Mackenzie do Paraná.