TEA: novos dados do CDC revelam desigualdades preocupantes
O número de crianças diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) continua a crescer nos Estados Unidos, segundo o mais recente relatório do CDC (Centers for Disease Control and Prevention), publicado em abril de 2025. O estudo, conduzido pela Autism and Developmental Disabilities Monitoring Network em 16 estados norte-americanos, mostra que, em 2022, uma em cada 31 crianças de 8 anos foi diagnosticada com autismo — uma prevalência de 32,2 casos por mil crianças.

Para a psicóloga Tatiana Serra, especialista no tema e atuante na área de neurodesenvolvimento infantil, esses dados são um sinal de alerta e de avanço ao mesmo tempo. “O aumento nos diagnósticos não significa necessariamente que mais crianças estão desenvolvendo autismo, mas sim que estamos identificando melhor — e, em alguns casos, mais cedo — os sinais do transtorno”, explica a profissional.
O relatório mostra que o TEA ainda é mais comum entre meninos — são 49,2 casos por mil contra 14,3 em meninas, o que representa uma razão de 3,4 para 1. No entanto, Tatiana destaca que esse número pode estar mascarando uma subnotificação: “Meninas costumam ter características mais sutis e são mais propensas a mascarar seus sintomas, o que pode atrasar o diagnóstico ou levar a uma identificação incorreta.”
Outro ponto marcante é a discrepância racial e social. A prevalência entre crianças asiáticas ou ilhéus do Pacífico (38,2), indígenas norte-americanas (37,5), negras (36,6) e latinas (33,0) foi superior à observada em crianças brancas (27,7). “A inversão de um padrão histórico é positiva no sentido de mostrar que mais crianças de grupos antes negligenciados estão sendo diagnosticadas. Mas, ao mesmo tempo, preocupa a associação com condições socioeconômicas desfavoráveis”, ressalta a psicóloga.
Entre as crianças diagnosticadas aos 8 anos, 39,6% também apresentavam deficiência intelectual (QI ≤70). Esse percentual chega a 52,8% entre crianças negras, um número considerado preocupante por especialistas. Para Tatiana Serra, essa realidade pode refletir a influência dos chamados determinantes sociais da saúde, como acesso precário a cuidados na gestação, exposição a toxinas e desnutrição.
“Esses fatores afetam o neurodesenvolvimento e, portanto, precisamos agir de maneira intersetorial. Não basta falar de diagnóstico: é preciso garantir direitos, suporte e políticas públicas adequadas”, afirma.
A boa notícia é que o número de crianças diagnosticadas até os 4 anos vem crescendo: aquelas nascidas em 2018 (4 anos em 2022) foram 1,7 vez mais diagnosticadas precocemente que as nascidas em 2014. Isso mostra um progresso na identificação precoce, fator crucial para um melhor prognóstico. “Quanto antes o diagnóstico, mais cedo iniciamos as intervenções que podem transformar a vida dessa criança e de sua família”, enfatiza Tatiana Serra.
Ainda assim, ela alerta que o diagnóstico precoce não está uniformemente distribuído: estados como Texas (Laredo) diagnosticam mais tardiamente, com idade média de 69,5 meses — quase 6 anos.
Segundo Tatiana Serra, os números escancaram a necessidade urgente de capacitação de profissionais da saúde e da educação, especialmente em regiões mais vulneráveis; ampliação do acesso a testes diagnósticos; sensibilização da sociedade para os sinais do autismo desde o primeiro ano de vida e equidade racial e social nos serviços de saúde mental e desenvolvimento infantil.
“O diagnóstico não pode ser um privilégio. É um direito”, finaliza a especialista que deixa um resumo dos dados do relatório.
Dados-chave do relatório:
- 1 em cada 31 crianças de 8 anos foi diagnosticada com autismo nos EUA em 2022
- Prevalência entre meninos: 49,2 por mil
- Prevalência entre meninas: 14,3 por mil
- Crianças negras, latinas e indígenas têm mais casos de autismo e maior associação com deficiência intelectual
- Crescimento de diagnósticos antes dos 4 anos: 1,7x maior entre nascidos em 2018 do que em 2014
- Em média, o diagnóstico ocorre aos 47 meses (com extremos entre 36 meses e 69,5 meses)