Maioria das pacientes com câncer do útero recebe a indicação de radioterapia
O câncer de colo do útero, também conhecido como câncer cervical, é o terceiro tumor maligno mais comum na população feminina brasileira com 17 mil novos casos previstos para cada ano do triênio 2023-2025 no Brasil, segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA). É também a quarta causa de morte de mulheres por câncer em todo mundo, segundo o levantamento Globocan 2022, da Organização Mundial da Saúde (OMS).
O câncer de colo do útero é prevenível por meio da vacina contra o HPV, disponível na rede pública para meninas e meninos de 9 a 14 anos; homens e mulheres imunossuprimidos de 9 a 45 anos que vivem com HIV/aids, transplantados de órgãos sólidos ou medula óssea e pacientes oncológicos. A mesma vacina, que há dez anos é oferecida no Sistema Único de Saúde (SUS) protege do câncer de colo do útero e de outros tumores na região anal, assim como de tumor de orofaringe, na região de cabeça e pescoço.
Já a prevenção secundária, com foco no diagnóstico precoce, consiste em rastrear as lesões precursoras em visitas periódicas ao médico. A mulher deve fazer o teste para rastrear o câncer do colo do útero e de suas lesões precursoras a partir dos 25 anos se já tem atividade sexual, sendo que os dois primeiros exames devem ser realizados com intervalo anual e, se ambos os resultados forem negativos, os próximos devem ser realizados a cada 3 anos.
Além disso, o Ministério da Saúde anunciou neste março lilás (mês de conscientização sobre câncer de colo do útero) a incorporação ao SUS de uma nova análise, que é o teste molecular para identificação e classificação do vírus HPV, ampliando assim o programa de rastreamento de câncer de colo do útero na saúde pública.
Radioterapia em câncer de colo do útero
A escolha do tratamento mais adequado para os tumores colo-uterinos é uma decisão que deve ser tomada pela equipe de oncologia (que inclui clínicos, cirurgiões e radio-oncologistas, entre outros profissionais) em conjunto com a paciente. De modo geral, a primeira abordagem do câncer cervical costuma ser cirúrgica. Mas isso é válido para os casos em que o tumor está em fase inicial. “Pacientes com tumores localmente avançados costumam ser submetidas a protocolos que associam a quimioterapia (com uma ou mais substâncias) e radioterapia associada à braquiterapia, não sendo realizada a cirurgia. Além disso, a imunoterapia começa a ser também administrada em tumores ginecológicos, como o câncer cervical em fase mais avançada”, detalha a radio-oncologista Raquel Guimarães, membro da Sociedade Brasileira de Radioterapia (SBRT) e chefe do serviço de Radioterapia do Hospital do Câncer 1 do Instituto Nacional de Câncer (HC1-INCA).
Raquel Guimarães explica que, quando o diagnóstico de câncer de colo do útero ocorre em mulheres jovens, é comum a preocupação com a fertilidade. Nas fases mais iniciais, é possível submeter a paciente à cirurgia com preservação de fertilidade. A partir de um determinado estágio da doença, a cirurgia deixa de ser uma opção, porque passa a ser uma intervenção muito mutilante e que muitas vezes não traz os mesmos resultados da radioterapia. Para as pacientes em idade fértil que receberão as doses de radiação recomenda-se o congelamento de óvulos. “Quando as pacientes não podem ser operadas, principalmente quando há um risco cirúrgico muito elevado, seja porque tem alguma comorbidade ou porque são pacientes, por exemplo, muito obesas, dentre outros fatores, a principal indicação é a radioterapia”, explica Raquel Guimarães. A especialista acrescenta que em alguns casos, quando a doença não foi completamente retirada por cirurgia, ou quando existe um risco de recidiva, a abordagem é complementada com radioterapia.
Braquiterapia
Com o potencial de aumentar as chances de remissão do câncer de colo do útero em casos de doença localmente avançada há a indicação de braquiterapia associada à radioterapia externa. Enquanto a radioterapia externa é feita com o paciente deitado em equipamento conhecido como acelerador linear, que dispara feixes de radiação sobre a pele em área determinada, a braquiterapia é um outro tipo de radioterapia que emite radiação por uma fonte inserida na massa tumoral ou em região próxima. Feita de modo temporário ou permanente, a braquiterapia tem indicações clínicas para casos de outros tipos de câncer, além do colo do útero como corpo do útero (endométrio), mama e próstata.
Na braquiterapia, a dose programada de radiação chega às células cancerígenas por meio de aplicadores, cateteres ou placas que conduzem o material radioativo de curto alcance. Inseridos com a ajuda de sedação e guiados por ultrassom, esses dispositivos são retirados após cada sessão. Há situações em que a braquiterapia é permanente, como no tratamento do câncer de próstata, em que a fonte da radiação cápsulas, chamadas de “sementes” contendo o material radioativo milimetricamente posicionadas no tecido tumoral ou áreas circundantes com a ajuda de agulhas.
A inserção dos aplicadores e a introdução das sementes radioativas é feita após um planejamento rigoroso. As doses e a administração da radiação entregue pela braquiterapia são atualmente calculadas com tecnologia 2D ou 3D. Os equipamentos usados para obter as imagens necessárias a esse cálculo e também para a administração da dose podem variar de acordo com a técnica utilizada. Na braquiterapia 2D, geralmente são feitas radiografias, em diferentes ângulos e posições, com os aplicadores já posicionados em relação ao tumor.
No sistema 3D, as imagens são captadas por tomografia computadorizada (TC) ou ressonância magnética (RM). As imagens coletadas, bidimensionais ou tridimensionais, são digitalizadas e usadas por softwares que calcularão os pontos a serem irradiados, a distribuição da radiação e a intensidade das doses no tumor e tecidos normais. Em geral, as imagens tridimensionais permitem uma distribuição mais precisa da dose de radiação, focando mais nas áreas-alvo e reduzindo a dose que chega aos tecidos saudáveis circundantes.
As mesmo tempo em que pode oferecer um bom resultado, a radioterapia interna (como é também chamada a braquiterapia) não está isenta de riscos e complicações a longo prazo para a qualidade de vida da paciente. Como são próximos do colo do útero, órgãos como bexiga e reto também recebem uma parte da dose do tratamento e há toxicidade para esses órgãos. Pode haver, por exemplo, incontinência urinária, sangramento retal, ressecamento vaginal e disfunção sexual. Por isso, também é tão importante que as mulheres tenham acesso à fisioterapia ginecológica no período pós-tratamento.