Câncer em pessoas mais jovens: um alerta que exige prevenção
Estamos vivendo uma mudança no perfil do câncer. A doença, historicamente associada ao envelhecimento, está se tornando cada vez mais frequente entre adultos com menos de 50 anos. Embora continue a afetar majoritariamente pessoas mais velhas, o crescimento dos casos entre adultos jovens acende um alerta que não pode ser ignorado. Um estudo publicado na revista científica BMJ Oncology mostrou que o número de diagnósticos nessa faixa etária aumentou 79% nas últimas três décadas, enquanto as mortes subiram 28% no mesmo período.
Os casos já presentes nos consultórios e centros de diagnóstico, não estão restritos a um único tipo de tumor. No entanto, entre os jovens adultos abaixo de 50 anos, a escalada mais evidente é a do câncer colorretal e do câncer de mama. Esse fenômeno não pode ser atribuído a um único fator. O câncer é uma doença multifatorial, mas hoje é possível apontar com mais clareza os grandes problemas atuais: a poluição ambiental, os hábitos de vida sedentários e, principalmente, o consumo excessivo de alimentos ultraprocessados.
O ambiente onde vivemos e as escolhas diárias que fazemos estão moldando os padrões de adoecimento da nova geração. Já há evidências de que a poluição ambiental pode estar associada a um risco maior de desenvolver a doença, e fatores genéticos e histórico familiar também entram nessa equação. É um cenário complexo que exige atenção constante de profissionais, gestores e da sociedade como um todo.
Existem várias hipóteses, mas nenhum martelo foi batido. Alguns pesquisadores apontam para o aumento das taxas de obesidade nas últimas décadas, o que está claramente associado ao risco de câncer de início precoce. Já outros relatam que a mudança nos hábitos alimentares, especialmente o aumento no consumo de comidas ultraprocessadas, e os estilos de vida cada vez mais sedentários também estão fortemente ligados ao aumento das taxas de câncer em jovens.
Um estudo publicado na revista Nature ajuda a entender por que o câncer colorretal está crescendo entre os jovens. Pesquisadores de vários países, incluindo do A.C.Camargo, analisaram o DNA de tumores de quase mil pacientes em 11 países. Eles descobriram mais mutações ligadas a uma toxina produzida por certas bactérias do intestino em pessoas com menos de 40 anos. Essas mutações podem estar relacionadas a mudanças no microbioma intestinal causadas por fatores como dieta pobre, uso excessivo de antibióticos e alimentos industrializados.
Outro ponto de atenção é a menarca precoce, quando a primeira menstruação acontece muito cedo. Isso aumenta o tempo de exposição do hormônio estrogênio ao longo da vida, o que pode favorecer o desenvolvimento de câncer de mama em mulheres jovens. Esse exemplo mostra como o acesso a uma alimentação saudável, a prática de exercícios e o cuidado com o meio ambiente influenciam o risco de câncer desde cedo.
Diante desse novo cenário, é preciso rever as estratégias de prevenção e diagnóstico. Os protocolos atuais, voltados principalmente para pessoas mais velhas, devem considerar também os jovens. Isso inclui dar mais atenção aos sintomas nessa faixa etária, revisar os critérios de rastreamento e investir em campanhas educativas com linguagem e formatos que falem diretamente com esse público.
*Antonio Antonietto é diretor médico do A.C.Camargo Cancer Center.