Atenção Primária: como garantir a sustentabilidade dos sistemas de saúde
Por Marcos Loreto
De acordo com o Ministério da Saúde, Atenção Primária à Saúde (APS) é o primeiro nível de atenção em saúde e se caracteriza por um conjunto de ações, no âmbito individual e coletivo, que abrange a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação, a redução de danos que possam comprometer suas possibilidades de viver de modo saudável e a sua manutenção.
Na sua essência, o modelo é o primeiro ponto de contato a oferecer atendimento multidisciplinar e integral ao paciente de forma preventiva, descentralizada e democrática. Dados da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) mostram que a APS pode atender de 80% a 90% das necessidades de saúde de uma pessoa ao longo de sua vida. No Brasil algumas experiências de APS foram implementadas de forma inaugural no século XX, mais especificamente em 1924, com a criação dos centros de saúde que, apesar de manterem a divisão entre ações curativas e preventivas, organizavam-se a partir de uma base populacional e trabalhavam com educação sanitária.
Quando falamos de sistema privados, vemos cada vez mais healthtechs surgirem oferecendo o modelo da atenção primária. De acordo com o Distrito HealthTech Report 2020, durante a pandemia, o Brasil teve um aumento de 118% no número de healthtechs na comparação de 2020 e 2018, passando de 248 para 542 empresas do setor.
Levando em conta que o modelo de APS tem como um dos objetivos principais a prevenção, podemos dizer que seus impactos vão muito além do indivíduo. O sistema é capaz de desenvolver uma atenção integral que impacta positivamente na situação de saúde coletiva. Portanto, a APS possibilita que os sistemas de saúde, seja ele público ou privado, se mantenham sustentáveis.
Mas, o que é um sistema de saúde sustentável? Harvey Fineberg, médico americano que ficou conhecido por seu trabalho na Universidade de Harvard, traz uma visão muito interessante sobre o assunto, em um artigo publicado pelo The New England Journal of Medicine. Aponta que, para ser bem-sucedido, o sistema de saúde precisa ter: 1) pessoas saudáveis; 2) um cuidado efetivo, seguro e centrado no paciente; e 3) justiça (um sistema que trata todos da mesma maneira e é justo também com os profissionais). Além disso, ele elenca outros três atributos necessários para manter a sustentabilidade:1) ser acessível financeiramente para pacientes, empresas e governos; 2) ser bem aceito por quem faz parte dele (pacientes e profissionais de saúde); e 3) ser adaptável, já que as necessidades de saúde mudam constantemente – vide a pandemia que estamos vivendo, as descobertas científicas, etc.
Tudo parece bastante simples, mas sabemos que ainda esbarramos em diversos obstáculos, tanto na saúde pública quanto na privada, quando falamos sobre o desenvolvimento e ampliação de um sistema de saúde mais sustentável. Estamos inseridos em um modelo em que a prevenção é pouco abordada e praticada. A população vive cada vez mais, porém o cultivo de hábitos saudáveis ainda tem um alcance baixíssimo e, ouso dizer, muitas vezes, elitizado. Precisamos enxergar a saúde de uma forma mais ampla, além dos serviços. Saúde também é prevenção. Como você enxerga a sua saúde daqui 20 anos? Por que não cuidar dela desde já para viver melhor o tempo que você tem pela frente? Esses questionamentos me levam a defender cada vez mais o planejamento da saúde, o atendimento primário e tudo que envolve a prevenção de doenças. Podemos construir para um futuro mais saudável e, claro, muito mais sustentável e democrático.
*Marcos Loreto é Diretor Médico da Omint