A importância da filantropia no desenvolvimento econômico

Por Silvia Brandalise

Os períodos de grandes sofrimentos, como a epidemia do coronavírus, nos permitem conhecer a realidade de um país. A busca investigativa do reflexo desta catástrofe possibilita delinear e planejar ações que minimizem os danos sofridos no presente e no futuro próximo.

Os ensinamentos gerados se conjugam com o aprendizado de outros conteúdos, como a cidadania e o espírito empreendedor, que contribuem para a autonomia e formação de um novo Ser. Levam a pessoa ser capaz de olhar para fora de si mesma.

Agudamente, emerge a necessidade de se atuar na comunidade. Eclode o Voluntariado Corporativo por empresas, que passam a exercer efetivamente a sua responsabilidade social. Surge a possibilidade de trabalho com o Governo, para influir nas políticas públicas e alcançar a nossa visão do bem-estar social.

Um claro sentimento de urgência surgiu durante a pandemia, nos mobilizando a cristalizar nossas ações. Ao transcender as barreiras geográficas, socioeconômicas e culturais, se permite um encontro de um novo empreendedorismo vinculado à Cidadania, ao cuidado com o Meio Ambiente, da Saúde, delineando-se um novo projeto de Vida. Se descobre que não somos uma entidade, somos uma causa. É um novo começo.

A brecha que se desponta na Saúde é exponencial. A Saúde de hoje e a Saúde do Amanhã. Buscar a solução dos problemas do presente, objetivando tomar as decisões para um futuro melhor.

Se descobre a importância da Ciência para a compreensão do mundo atual e a solução dos principais problemas que enfrenta a humanidade, como na área da Saúde com as doenças crônicas – entre elas o câncer. Durante estes meses da pandemia, o câncer da criança e de jovens continuou a invadir os hospitais, em ritmo acelerado.

No Brasil, milhares de crianças lutam contra o câncer a cada ano, enfrentando batalhas que ameaçam a vida. Elas são cuidadas pelos familiares, amigos e comunidade, que lutam juntos para socorrê-las. Todavia, os tratamentos para o câncer pediátrico não mudam há 30 anos. Em quase 20 anos, somente uma nova droga foi expressamente desenvolvida para as crianças com câncer.

Não há novas drogas para o câncer infanto-juvenil, por que não existe o financiamento suficiente para seu desenvolvimento. O câncer da criança corresponde a cerca de 2-3% dentre todos os tipos de câncer dos adultos. Trata-se de um pequeno mercado consumidor.

Os avanços obtidos pelas pesquisas tornaram o câncer pediátrico mais tratável. Nos países desenvolvidos, a sobrevida em 5 anos aumentou para 80%, mas sérios desafios continuam. As crianças que sobrevivem frequentemente lutam com significantes complicações e, por isso, os pesquisadores estão trabalhando para desenvolver tratamentos especificamente para o câncer pediátrico.

Ainda sabemos muito pouco sobre as causas do câncer pediátrico. Um esforço internacional da Organização Mundial da Saúde se materializou na criação do Consórcio Internacional do Câncer da Criança. No Brasil, o Centro Infantil Boldrini integra este consórcio.

É imperioso investir em Educação, Inovação e Globalização do conhecimento. Articulando a filantropia empresarial com a rede do setor público, setor privado, terceiro setor e Universidades/Institutos de Pesquisa em muito se avançará em novas descobertas. As alianças não são difíceis e requerem visões a longo prazo.

No momento de se debater como cortar os gastos com a Saúde, devemos ter a certeza de que protegemos aqueles que não são capazes de levantar a voz por si mesmos. Veja o baixo interesse na pesquisa contra o câncer pediátrico. As crianças doentes não podem advogar por elas mesmas. Não votam. Não contribuem para campanhas. Não têm lobistas.

O Governo Federal deveria investir mais na pesquisa do câncer pediátrico. Entretanto, reconhecemos a presença de inúmeras outras demandas. Vamos, então, usar as forças do mercado e técnicas de financiamento inovadoras para preencher esta lacuna.

Precisamos buscar na filantropia empresarial investimentos estruturantes, não apenas nas emergências, mas enraizar a cultura de doações corporativas, compartilhadas com as instituições de pesquisa e poder público, visando a promoção do desenvolvimento de jovens pesquisadores no Brasil e autonomia no país no desenvolvimento de novos medicamentos.

Nada justifica nosso país importar de diferentes países vários princípios ativos contra o câncer e outras doenças e simplesmente envasá-los. Este é um papel secundário, além de ser desmotivador para a permanência em nosso país de milhares de pós-graduandos egressos das Universidades brasileiras, que com frequência migram para os países desenvolvidos. Jovens pesquisadores, altamente engajados com novas tecnologias, utilizando sua expertise em nosso país representam a cristalização do almejado desenvolvimento sustentável da nação.


*Silvia Brandalise é fundadora e diretora do Centro Infantil Boldrini e do Centro de Pesquisas Boldrini. Professora aposentada do Departamento de Pediatria/FCM/UNICAMP e membro fundador da Sociedade Brasileira de Oncologia Pediátrica. 

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