Saúde Suplementar: Por que os planos de saúde estão tão caros?

Por Márcio Mantovani

Não é de hoje que os planos de saúde estão ficando cada vez mais caros. Prova disso é que, de acordo com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), em apenas três anos, houve redução de 3,1 milhões de usuários de convênios médicos. Muitas dessas pessoas acabam migrando para o Sistema Único de Saúde (SUS) e, devido a superlotação, fica cada vez mais complicado atender essa alta demanda.

Frequentemente recebo perguntas sobre os motivos do encarecimento dos serviços privados de saúde. É uma questão que permeia roda de amigos, familiares, clientes e até mesmo em palestras.

Existem muitos motivos para justificar a constante elevação do custo dos planos de saúde, mas neste artigo vou me ater apenas a pontos estruturais, sem discutir modelos de negócios, má gestão das companhias, fraudes etc. Então vamos lá:

1) O avanço da tecnologia

Em todo o mundo existem milhões de pesquisas sendo feitas, equipamentos sendo criados, procedimentos sendo testados; muitos destes progressos servem para tratar doenças que já existem de forma mais simples e com mais assertividade, mas com custo inicial muito maior.

2) Avanço da idade populacional

A partir de determinada idade, o índice de utilização de serviços médicos tende a aumentar radicalmente, mesmo em indivíduos saudáveis. Como os preços dos planos de saúde são de certa forma, divididos entre os participantes de todas as idades de uma carteira de cliente, automaticamente, todos pagam mais caro.

3) Regulação com viés socialista

A criação da Lei 9.656/98, que regulamenta os planos de saúde, tem mais de 20 anos e foi essencial para que se separasse o joio do trigo. Hoje temos empresas sérias e comprometidas com o atendimento do cliente.

Sei que há várias críticas às operadoras, mas você já pensou como seria sua vida sem elas? O SUS teria capacidade de atender os mais de 200 milhões de brasileiros de maneira integral?

Mas passados mais de 20 anos com diversas ingerências no setor, a lei se tornou um problema para os usuários de planos de saúde e levou muitas operadoras à falência. Exemplo disso é a regulamentação de reajustes para planos pessoa física, que culminou na retirada do produto do mercado por quase todas as empresas do setor, por perceberem que, ao longo do tempo, não conseguiriam atender seus clientes, devido aos reajustes abaixo da inflação médica.

Não há aqui nenhuma crítica política em si, o ponto aqui é outro: quando o estado obriga as operadoras a cobrir quase que na totalidade todo e qualquer procedimento, incluindo tratamentos caríssimos, e que às vezes atendem apenas casos muito específicos, o preço dos planos aumenta para todos os usuários do sistema.

Isto se repete com relação à regulamentação do reajuste por idade: a lei diz que não se pode realizar reajuste a partir dos 59 anos, portanto, como equalizar o valor a ser cobrado de uma pessoa com 60 anos e outra com 80 anos? Cobrando a diferença dos mais novos, inclusive da pessoa com 60 anos.

Quer outra regra? Os planos de saúde só podem cobrar até 6 vezes o valor de uma criança, para pessoas acima de 59 anos (além de outras regras no meio do caminho). Portanto, o preço tende a ficar caro para todos os usuários do sistema para cobrir esta diferença de custo entre os com idade mais avançada.

O objetivo aqui não é discutir se são justas ou não estas regras, mas demonstrar o motivo do alto custo dos planos de saúde.

4) Falta de produtos alternativos com menos coberturas (ainda um problema de regulação)

A legislação obriga aos planos de saúde a ter cobertura integral (Rol), para qualquer tipo de doença. Isto causa o efeito reverso, pois para que as operadoras tenham produtos completos que absorvam todos os riscos, inclusive a inclusão de coberturas após o fechamento do contrato com o cliente (outra anomalia do sistema), seus produtos tendem a custar mais caro.

5) Judicialização da saúde

No Brasil criou-se o hábito de judicializar tudo. E como primícia constitucional, na área de saúde, os juízes primeiro permitem ao usuário ser tratado por conta da operadora (mesmo que o usuário não tenha direito), para depois se discutir o contrato. Na prática, a operadora dá o tratamento (paga por ele) e só depois se discute de quem é a responsabilidade pelo pagamento. E ainda que a operadora um dia ganhe este processo, após ter tido gastos com contas médicas e honorários de advogados, a chance de recuperar os valores é ínfima.

Eu sei que você deve estar me odiando, mas quem você acha que paga esta conta afinal?

6) “Vender seguro para carro batido”

Você já imaginou se houvesse a obrigação de uma seguradora vender seguro para carro batido? O que acha que aconteceria com o valor da cobertura de seguros para os clientes que ainda não bateram seus carros?

Isto acontece na saúde: os planos de saúde são obrigados a aceitar o cliente e dar cobertura (mesmo após dois anos de carência) para qualquer doença, seja qual for o valor deste tratamento. E mais, não poderá cobrar R$ 1,00 a mais em comparação ao cliente da mesma idade com saúde perfeita.

Não podemos misturar as coisas: uma é o estado ter a obrigação de atender qualquer cidadão, outra é exigir que uma empresa privada faça isso. Portanto, essa obrigação ajuda a encarecer o produto.

7) Reserva técnica obrigatória

As operadoras são obrigadas a manter uma reserva técnica em dinheiro. Este dinheiro fica aplicado em um fundo específico e mal remunerado em um banco e não pode ser usado para melhora do atendimento e diminuição do custo. Portanto, as companhias são obrigadas a cobrar mais dos clientes para constituir e manter essas reservas.

8) Cheque em branco

Em diversos países, os planos de saúde são vendidos com valores de cobertura máxima determinada em contrato. Com isto, o risco deste plano de saúde tem um limitador claro, que é o valor máximo que a companhia tem que indenizar por serviços de saúde referente aquele cliente.

Já no Brasil, a cada novo cliente, a operadora de planos de saúde assina um cheque em branco para cobrir todo e qualquer problema de saúde que este usuário venha ter. Sendo assim, a companhia precisa precificar em seu produto, o imponderável.

9) Problema estrutural do sistema de saúde privado

As operadoras também não têm tido lucros exorbitantes. Existe um problema estrutural ocorrendo no mercado nos últimos 20 anos, mas isso é tema para outro artigo.

Conclusão

Não existe solução simples e mágica para o tema. É preciso muita coragem para enfrentar os desafios do setor, pois se não houver uma discussão séria, sem viés populista, que busque soluções técnicas e de longo prazo, cada dia mais as pessoas e empresas terão dificuldades em manter seus planos de saúde e sairão do sistema privado, colocando mais dificuldades para o sistema público em absorver mais pacientes.


*Márcio Mantovani é sócio-fundador da healthtech Clude.

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