Projeto busca ampliar cuidados paliativos no Sistema Único de Saúde
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que, em todo o mundo, apenas uma em cada 10 pessoas que precisam de cuidados paliativos recebe esta abordagem. São mais de 56 milhões de pessoas, incluindo 25,7 milhões no último ano de vida, que necessitam desse conjunto de práticas assistenciais — destas, 78% vivem em países de baixa e média renda. O órgão afirma, ainda, que a demanda global por cuidados para pessoas com doenças ameaçadoras da vida continuará crescendo conforme ocorre o envelhecimento da população acompanhado pelo aumento da carga de doenças crônicas não transmissíveis e, portanto, estima que a necessidade por cuidados paliativos deverá quase dobrar até 2060.
No Brasil, um mapeamento feito pela Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP), em 2019, identificou a existência de apenas 191 equipes especializadas, sendo que a maioria, 55%, está concentrada no Sudeste do país. Além disso, dos cerca de 2.500 hospitais existentes, menos de 10% têm profissionais capacitados em cuidados paliativos.
Com base neste cenário, em 2020 o MS e o CONASS, por meio do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (PROADI-SUS), iniciou o Programa de Cuidados Paliativos no SUS – Atenção Hospitalar, Ambulatorial Especializada e Atenção Domiciliar. A iniciativa é conduzida pelo Hospital Sírio-Libanês e visa capacitar equipes atuantes no sistema público e implementar protocolos de cuidados paliativos em grupos de serviços de saúde de todo o Brasil. Em seu primeiro ano de atuação, 2020, foi observado um incremento médio 52% nos serviços em relação a processos em cuidados paliativos que envolvem: capacitação da equipe, estabelecimento de protocolos, integração da rede, disponibilidade de medicações essenciais para controle de sintomas, implementação de planejamento de cuidados e diretivas antecipadas, e alocação de recursos. No triênio de 2021-2023, a expectativa é aumentar em 20% a maturidade global dos serviços em cuidados paliativos ao final da implementação comparado ao início do projeto.
“O projeto trabalha com grupos de serviços de uma mesma região, sendo um hospital, um ambulatório de especialidade e um serviço de atenção domiciliar. Capacitando profissionais e implementando protocolos, buscamos beneficiar pacientes com doenças ameaçadoras da vida e suas famílias. Com isso, esperamos fomentar o cuidado centrado na pessoa e o trabalho em equipe, melhorar a qualidade da assistência nesta área e otimizar a alocação dos recursos de saúde”, afirma a coordenadora médica do projeto, Maria Perez Soares D’Alessandro. A proposta é que, progressivamente, estas práticas estejam disponíveis aos pacientes que delas necessitarem dentro da estrutura do SUS, organizando uma linha de cuidado que integre os vários pontos da Rede de Atenção à Saúde (RAS).
Estudos científicos mostram que o baixo desenvolvimento de cuidados paliativos se associa ao prolongamento do sofrimento do paciente com tratamentos pouco eficazes, o que pode contribuir com à superlotação de Unidades de Terapia Intensiva (UTI) e Unidades de Urgência e Emergência, além do aumento de custos e atendimentos de baixa qualidade. “A iniciativa vai ao encontro da recomendação da OMS, feita em 2014, de desenvolvimento de políticas de cuidados paliativos baseadas em evidências para apoiar o fortalecimento dos sistemas de saúde”, ressalta Maria.
Atualmente, o projeto atua nos estados do Amapá, Bahia, Espírito Santo, Paraná, Goiás e Pará. A proposta é que seja implementado em todos os estados brasileiros até o final de 2023. Em 2021, atuou no apoio na organização da gestão da crise dos hospitais para o enfrentamento da Covid-19, ação integrada com outros projetos do PROADI-SUS, Lean nas Emergências e Reab Pós-Covid-19. Foram realizadas 37 tutorias de cuidados paliativos, com a participação 850 profissionais de saúde de mais de 80 hospitais distribuídos em 25 estados. Além disso, foram publicados 2 E-books publicados visando apoiar a organização dos hospitais do SUS frente a pandemia do Covid-19.
“Quando se fala em cuidados paliativos, as pessoas acham que o paciente já está no caminho da morte e eu falo que os cuidados paliativos falam de vida. A gente tem muito o que aprender e trabalhar. Acredito demais no PROADI-SUS e sei o tanto que temos levado para a ponta da linha o aprendizado e a expertise desses hospitais, melhorando cada vez mais o atendimento dos nossos pacientes SUS, que é o nosso maior interesse e o nosso maior legado”, afirma Adriana Melo Teixeira, diretora do Departamento de Atenção Hospitalar e de Urgência do Ministério da Saúde (DAHU/SAES/MS).
Como funciona e resultados do projeto
O Projeto de Cuidados Paliativos no SUS começou em 2020 com atuação no estado de São Paulo e no Distrito Federal. Sua atuação se inicia com a indicação do MS e do CONASS sobre os estados selecionados para participarem e, as Secretarias Estaduais de Saúde, por sua vez, indicam os serviços que deverão ser contemplados. Após reuniões de alinhamento com representantes das secretarias de saúde e gestores dos serviços, a equipe do projeto inicia a fase de diagnóstico. Este visa compreender a realidade local de forma a subsidiar a construção de planos de ação alinhados com as demandas locais para aprimorar a prática de cuidados paliativos. A duração do projeto em cada estado é de aproximadamente 10 meses, considerando o período de monitoramento.
“A fase final conta com monitoramento dos indicadores e resultados, apoiando o processo de amadurecimento para que os protocolos e novos fluxos sejam incorporados por toda a equipe. Em paralelo a isso, trabalhamos a questão da sensibilização e capacitação por meio do ensino à distância com o curso Cuidados Paliativos para não paliativistas, workshops e discussões clínicas e de acompanhamento de indicadores ao longo de todo o projeto”, explica Maria Perez Soares D’Alessandro.
Em 2020, o projeto contou com mais de 300 profissionais aprovados na capacitação EAD; mais de 100 profissionais participantes dos workshops de CP; implementou de instrumentos de triagem de demandas de CP nos serviços; apoiou a integração da Rede de Atenção à Saúde (RAS) através da implementação de cartas e registros sobre Planejamento Terapêutico visando melhor comunicação sobre CP entre os outros pontos da RAS; e publicou o Manual de Cuidados Paliativos disponível em no site do projeto Cuidados Paliativos e no site do CONASS. Dos participantes, 98% referiram mudança de cuidado centrado na doença para um cuidado mais centrado na pessoa.
Os resultados preliminares do ciclo 1 iniciado no segundo semestre de 2021 incluem: 1225 profissionais inscritos no EaD; 264 profissionais inscritos no workshop; 601 profissionais participantes nas aulas temáticas. Em novembro de 2021 foi realizado o “Primeiro Encontro Anual do Projeto PROADI-SUS de Cuidados Paliativos” com 764 inscrições. Foram apresentados 3 trabalhos no “III Congresso Paulista de Cuidados Paliativos”.
“Cuidados paliativos é um modo de lidar fundamentalmente com o sofrimento de alguém com uma doença que ameace a vida. Não é somente para quem está no fim da vida, é para quem tem risco, e quem tem risco e sofre com isso tem indicação dessa abordagem. Dessa maneira, a gente pode enxergar que cuidados paliativos está indicado para todos os pacientes de UTI, que têm câncer, insuficiência cardíaca, demência, uma doença grave. A gente pode usar todos os nossos conhecimentos para cuidar da pessoa como um todo”, afirma Daniel Neves Forte, gerente médico de humanização e cuidados paliativos do Hospital Sírio-Libanês.