Os cuidados que a área de compras deve ter ao negociar contratos de saúde
Por Ricardo Sant’Ana
A pesquisa de benefícios da Lockton, consultoria e corretora de seguros norte-americana, aponta que após a folha salarial, os planos privados de assistência médica são o segundo maior investimento das empresas. Em média, as corporações chegam a ter custos com planos de saúde equivalentes a 12% da folha nominal de pagamento, podendo chegar a 17%, conforme o setor.
A manutenção deste benefício tem sido um grande desafio para o empregador devido ao alto valor e os expressivos reajustes anuais, decorrentes da inflação do segmento e níveis de utilização. Neste sentido, o papel e a importância da área de compras vem crescendo a cada ano, com a prerrogativa de sempre buscar os melhores negócios na contratação de serviços, produtos e insumos.
No entanto, é importante ressaltar que o ano de 2020 apresentou algumas peculiaridades interessantes, já que em função da pandemia de Covid-19 e do isolamento social, o uso do sistema privado de saúde foi bem inferior às médias de anos anteriores, causado pela baixa utilização dos serviços médicos eletivos.
A pesquisa da Lockton ainda aponta que 38% das empresas não tiveram aumento nos custos ou registraram retração nos valores gastos com planos de saúde oferecidos a seus funcionários em 2020. O levantamento ouviu 469 empresas em 44 setores da economia. De acordo com o levantamento, 29% do total da amostra disse não ter experimentado aumento de preço nos contratos, enquanto 9% verificaram retração nos custos do benefício.
Logo, é possível reparar que o reajuste anual foi inferior ao histórico de anos anteriores, o que não deixa de ser uma boa notícia, mas que deve ser vista com cautela, já que o que era economia (savings) pode virar um expressivo aumento de custo nos próximos anos.
Este é um ótimo cenário para demonstrar, com exemplo, a necessidade de as áreas de compras terem cautela na negociação dos contratos de saúde, não só em cenários instáveis.
A busca pela redução de custos tem acontecido com frequência e as áreas de compras das empresas muitas vezes encabeçaram a liderança por buscar alternativas no mercado de forma a acomodar o orçamento. Contudo, é importante sinalizar que existem alguns fatores na busca de um novo contrato que devem ser levados em consideração de forma a evitar que a economia obtida com o novo plano se torne uma grande dor de cabeça.
Listo alguns exemplos:
Prêmios mais baixos vs. contrato de dois ou mais anos
Conforme mencionado, é necessário avaliar a dinâmica do preço apresentado frente ao horizonte do período de contrato, especialmente nas apólices que possuem a análise de sinistralidade própria como uma das métricas de reajuste.
Em outras palavras, se o custo for muito baixo de forma a não comportar a dinâmica do volume dos sinistros, ao fechar o ciclo do primeiro ano, poderá haver um reajuste excessivamente elevado que comprometerá todo o saving obtido na implementação do benefício. Sendo o contrato de múltiplos anos e geralmente com cláusulas de penalidades de saída, é fundamental estar atento a esses detalhes.
Sinistralidade no primeiro ano de contrato
Um detalhe pouco explorado, mas de enorme importância, é que no primeiro ano de contrato dos planos de saúde, geralmente a sinistralidade apurada nos 2 a 3 primeiros meses é descartada da apuração. Isso acontece por conta de um efeito chamado IBNR, ou seja, quando o sinistro ocorreu, mas ainda não foi reportado. É comum achar que a sinistralidade no primeiro ano está muito boa e descobrir depois que terá que arcar com um reajuste expressivo.
Multa ou penalidade pelo cancelamento da apólice atual fora do período acordado
O cancelamento da apólice vigente fora de um período específico pode impactar no pagamento e multas que, geralmente, podem chegar a três faturas. É preciso ficar atento.
Análise da abrangência geográfica
Nem todas as operadoras possuem uma rede nacional e é muito importante avaliar se todas as regiões em que a empresa aloca colaboradores e dependentes estão cobertas de forma satisfatória. Muitas vezes, há a necessidade do aumento de custos para adequação ou até mesmo revisão da operadora escolhida.
Além disso, alguns outros pontos que devem ser avaliados previamente para se evitar surpresas de aumento de custo ou cobertura:
- Mapear casos de extensão no benefício para demitidos e aposentados, como preveem os artigos 30 e 31 da Lei 9.656/98, que asseguram os direitos do aposentado e demitidos sem justa causa de se manterem no plano de saúde, nas mesmas condições da vigência do contrato de trabalho, desde que arquem integralmente com seus custos.
- Se há a presença de colaboradores afastados, remidos, PJ’s, entre outros.
- No caso de grupos menores, a aceitação após análise das declarações pessoais de saúde;
Nota-se assim como a diferença entre a redução de custo e uma grande dor de cabeça podem estar em detalhes técnicos, que precisam ser avaliados de forma cautelosa antes de qualquer decisão. Na linha de frente, a área de compras das empresas precisa entender toda essa dinâmica para que não haja surpresas futuras. A saúde e o bem-estar dos colaboradores e seus familiares deve sempre ser uma prioridade!
*Ricardo Sant’Ana é diretor de Benefícios da Lockton Brasil