Fiocruz aponta que quilombolas sofrem mais mortes evitáveis

Um estudo inédito que analisa as condições de vida e padrões de mortalidade aponta que a população quilombola adulta morre mais por causas que poderiam ser evitadas do que a população geral. Uma comparação entre taxas de homicídio a cada 100 mil quilombolas, por exemplo, aponta uma diferença de cerca de 45% a mais de mortes nesta população do que entre pessoas não quilombolas.

As informações foram divulgadas na primeira edição no Boletim Saúde Quilombola no Brasil: Evidências para equidade, realizado por meio de uma parceria entre a Fiocruz, a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) e o Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (UFBA). O principal objetivo foi avaliar as desigualdades nas causas de mortes entre quilombolas e população em geral.

Entre as mulheres, a taxa de mortes por infarto agudo do miocárdio é 18% maior entre quilombolas do que entre as demais mulheres da amostra. Nos casos de derrame, a diferença aumenta para 38%. Os homicídios também são mais comuns entre mulheres quilombolas. Entre os homens, as desigualdades se repetem: a cada 100 mil quilombolas, 35 morrem por homicídio, enquanto na população geral são 30 mortes.

As condições de vida ajudam a explicar esses resultados. Entre os quilombolas, 55% não têm acesso à água potável, 54% não possuem rede de esgoto e 51% não contam com coleta de lixo. Para comparação, segundo o Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o acesso à água entre a população brasileira é de 81%, e o acesso à energia elétrica é praticamente universal.

A análise por idade também revela desigualdades persistentes. Entre mulheres quilombolas com 60 anos ou mais, a taxa de mortalidade por HIV/Aids é 200% maior do que na população geral. Já a taxa de suicídio entre mulheres de 20 a 35 anos é 66% mais frequente nas comunidades quilombolas.

“Os dados são devastadores. A população quilombola, em linhas gerais, tem altas taxas de mortalidade por causas evitáveis, por coisas que não deveriam mais matar em 2025”, comenta o fisioterapeuta e integrante da Conaq, Mateus Brito. Ele conta que durante muito tempo o grupo buscou dados sobre como os quilombolas nascem, como vivem, do que adoecem e como morrem, mas havia uma invisibilidade com relação aos dados sobre esta população.

O estudo analisou dados de cerca de 64 mil quilombolas em idade adulta que tiveram a vida acompanhada entre os anos de 2011 e 2020 e estão na Coorte de 100 Milhões de Brasileiros, desenvolvida pelo Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia). A base reúne informações de pessoas inscritas no Cadastro Único e beneficiárias de programas sociais do Governo Federal. Dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade também foram utilizados.

Muitos quilombolas morrem sem saber a causa

Mortes por causas mal definidas, quando médicos não conseguem descobrir ou registrar o motivo do óbito, foram o resultado mais frequente encontrado entre todas as faixas etárias e homens e mulheres entre quilombolas. A taxa é 35% maior do que na população geral.

“Na população quilombola, que enfrenta diversas barreiras de acesso aos serviços de saúde, o não conhecimento das causas de morte e a persistência disso em todos os grupos etários, tanto em homem quanto em mulheres, sugere desigualdades no acesso a diagnóstico oportuno e na qualidade da informação em saúde”, explica a pesquisadora associada ao Cidacs/Fiocruz Bahia, Poliana Rebouças.

Causas de mortalidade entre quilombolas variam entre regiões

O estudo também identificou diferenças regionais significativas nas causas de morte entre quilombolas e a população geral. No Nordeste, destacam-se as mortes relacionadas a diabetes (29 contra 28 por 100 mil) e desnutrição (3 contra 2).

No Norte, a taxa de mortalidade por tuberculose chega a 3 por 100 mil entre quilombolas, contra 2 na população geral. A equipe destaca que as desigualdades regionais na infraestrutura de saúde afetam a qualidade dos registros, especialmente em municípios do Norte e Nordeste.

De acordo com a equipe de pesquisa, a falta de capacidade técnica nos órgãos municipais e a qualificação insuficiente de médicos no preenchimento correto e completo das declarações de óbitos ajudam a explicar esta situação. “Não há ainda nos sistemas de informação em saúde no Brasil registro específico para população quilombola, que considere suas especificidades”, defende Poliana.

No Sudeste, chama atenção as diferenças de mortalidade por homicídios, quase 189% de diferença de taxas sendo maior entre quilombolas e do que não quilombolas; doenças de chagas 267% e doença falciforme 550%. Diabetes, tuberculose, diarreia e uso problemático de álcool também aparecem na lista.

No Centro-Oeste, a maiores diferenças nas causas de mortalidade entre população quilombola e não quilombola a cada grupo de 100 mil pessoas estão nos homicídios (22 contra 16), derrame (19 contra 14) e cirrose (15 contra 10). No Sul, outras causas apareceram como gripe/pneumonia (42 contra 28), derrame (38 contra 19), tuberculose (10 contra 2). No caso da taxa de doença falciforme, o resultado é 4800% maior entre quilombolas do que não quilombolas.

Para a equipe envolvida no estudo, a melhoria nas condições de vida da população quilombola passa pela necessidade de políticas de saúde que incluam ações de vigilância em saúde, atenção integral à saúde da população quilombola, educação em saúde, fortalecimento dos saberes e práticas das medicinas quilombolas, além de preservação da sociobiodiversidade, eixos encontrados na proposta da Política Nacional de Saúde Integral da População Quilombola (PNASQ). (Com informações da Agência Fiocruz)

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