Diversidade também é competência em saúde

Por Leonardo Alvares

Recentemente, no dia 30 de setembro, o Ministério da Educação homologou as novas Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Medicina. Acredito que para muitas pessoas, mesmo que da área da medicina, esse pode parecer apenas mais um ajuste técnico na formação médica, mas, na minha visão, trata-se de um marco histórico e que me deixou muito entusiasmado. Pela primeira vez, o documento traz com clareza a necessidade de formar médicos preparados não apenas para diagnosticar e tratar doenças, mas também para reconhecer, respeitar e acolher a diversidade humana em todas as suas dimensões.

Ao longo da minha trajetória como médico endocrinologista, professor e pesquisador, percebi (porque não aprendi sobre isso na faculdade) que um dos maiores vazios da formação médica no Brasil está justamente na falta de preparo para atender pessoas diversas, e eu falo especialmente sobre a população trans. Isso se traduz, na prática, em barreiras de acesso, diagnósticos tardios e desfechos de saúde piores do que poderiam ser. Somando-se a episódios de transfobia em equipamentos de saúde, a insegurança médica neste perfil de atendimento por desconhecimento técnico reforça o afastamento da possibilidade de acesso à saúde.

Para ilustrar o que estou falando, compartilho um dado divulgado pela ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transsexuais): 36% das pessoas trans já tiveram atendimentos de saúde recusados devido a sua identidade de gênero. Esse cenário me trouxe um incômodo, que me motivou a dedicar minha carreira à saúde de pessoas trans e a construir pontes entre assistência, pesquisa e ensino.

Quando falamos sobre a formação médica, estamos também falando sobre gestão da qualidade do cuidado. Preparar equipes e currículos para lidar com a diversidade não é apenas uma pauta ética, mas uma estratégia de inovação institucional: profissionais mais capacitados geram maior adesão ao tratamento, reduzem erros e melhoram indicadores de eficiência em saúde. Isso significa que diversidade e gestão caminham juntas e que o investimento em competências humanas é também uma decisão de gestão responsável.

Por isso, ao me deparar com as novas diretrizes do MEC, que colocam ênfase em competências humanas e sociais e com um direcionamento voltado, principalmente, para populações historicamente marginalizadas, como indígenas, quilombolas, pessoas com deficiência e a comunidade LGBTQIAPN+ fico mais confiante que estamos avançando e evoluindo. Principalmente, porque a medicina que eu acredito para o futuro precisa ser capaz de olhar para cada paciente de forma integral, considerando pontos para além da biologia, como sua história, identidade, contexto social e cultural.

Realmente acredito que a diversidade também é competência em saúde. Não se trata apenas de um compromisso ético, moral ou de direitos humanos, embora esses aspectos sejam, sim, fundamentais. Trata-se da qualidade do cuidado com cada pessoa que procura atendimento. Quando médicos estão preparados para acolher realidades diversas, eles reduzem o risco de abandono de tratamento e incentivam o paciente a seguir o tratamento corretamente, o que contribui para melhores resultados clínicos.

Como professor, percebo o impacto que esse tema causa nos alunos. Muitos se surpreendem quando descobrem que ainda estamos distantes de uma prática médica verdadeiramente inclusiva. Entretanto, a boa notícia é que há uma nova geração de futuros médicos que estará mais preparada, informada e pronta para construir uma medicina mais justa e acolhedora.

As diretrizes do MEC, não são um ponto de chegada, mas de partida. Agora, precisamos garantir que saiam do papel e se transformem em conhecimento e práticas concretas nas salas de aula, nos estágios e, sobretudo, nas clínicas e hospitais. Só assim conseguiremos formar profissionais capazes de oferecer um atendimento digno a todas as pessoas, independente do grupo que pertençam.

Diversidade não é um detalhe. É uma competência essencial, e deve estar no centro da formação médica brasileira.


*Leonardo Alvares é médico especialista em Endocrinologia e Metabologia, doutor pela USP e autor do livro “Saúde de Pessoas Transgênero – Práticas Multidisciplinares”.

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