Atenção primária digital no combate ao câncer de mama

Por Thaís Cunha Dias Ferreira

O mês de outubro é um marco para a saúde feminina. A cada ano, a campanha Outubro Rosa mobiliza atenção, amplia a conscientização e promove o acesso à informação sobre prevenção e diagnóstico precoce do câncer de mama. Mas, em nosso trabalho na saúde, temos que ir além de lembrar as mulheres da importância da mamografia preventiva. O verdadeiro desafio é reinventar a forma como o sistema de saúde antecipa sinais, cria vínculos duradouros e sustenta o cuidado de maneira contínua, depois que as luzes da campanha se apagam.

O câncer de mama permanece como o tipo que mais mata mulheres no Brasil. Entre 2018 e 2023, somamos mais de 173 mil óbitos e 319 mil diagnósticos positivos, dos quais 37% já em estágio avançado. Não se trata apenas de estatística, mas sim de um retrato real do sistema que ainda não consegue converter conhecimento científico em prevenção efetiva.

A recente decisão do Ministério da Saúde de ampliar a faixa etária do rastreamento ativo por mamografia para mulheres de 50 a 74 anos, e abrir a possibilidade para aquelas entre 40 e 49 mediante indicação médica, é um avanço significativo. Ela reconhece uma realidade já descrita por estudos e levantamentos recentes: um deslocamento epidemiológico que expõe mulheres fora da faixa “clássica” de risco. Só entre 2018 e 2023, mais de 108 mil brasileiras com menos de 50 anos receberam o diagnóstico de câncer de mama. Nas mulheres acima dos 70, foram mais de 53 mil casos no mesmo período. Em outras palavras, a doença está se espalhando para idades mais jovens e mais avançadas, o que exige coragem para repensar protocolos e ampliar as janelas de rastreamento.

Esses números derrubam a falsa ideia de que rastrear antes dos 50 ou depois dos 69 não seria custo-efetivo. Pelo contrário, mostram que a realidade já se impõe de maneira dramática e que manter recomendações rígidas e restritivas seria condenar milhares de mulheres ao diagnóstico tardio. Ampliar a faixa etária não pode ser visto como gesto simbólico, mas como sinal de que precisamos reestruturar a estratégia preventiva.

É nesse ponto que a atenção primária à saúde, especialmente em sua vertente digital, torna-se decisiva para o sistema de saúde suplementar. Quando estruturada por meio da telemedicina, a APS não é apenas uma porta de entrada, mas um radar permanente. Consultas remotas com médicos de família podem identificar sinais precoces, mas seu valor maior está no acompanhamento longitudinal. A paciente não se perde entre encaminhamentos, não depende apenas da iniciativa própria e tem alguém que a lembra, orienta e acompanha. Esse “olhar contínuo” é justamente o que falta para transformar a prevenção em rotina.

Durante a pandemia, ficou evidente o potencial desse modelo. Empresas nativas digitais, que nasceram com a telemedicina no DNA, mostraram que é possível oferecer cuidado de qualidade em larga escala, com agilidade, protocolos clínicos bem definidos e centralidade no usuário. Elas consolidaram soluções que hoje estão maduras para apoiar operadoras de saúde na implantação de programas estruturados de atenção primária digital e encurtam o caminho entre a intenção e o impacto real, trazendo interoperabilidade de sistemas, escalabilidade e experiência de cuidado já testada em situações-limite.

Para as operadoras de planos de saúde, há uma dicotomia clara. Estruturar a atenção primária digital exige investimento em infraestrutura tecnológica, integração de sistemas, equipes capacitadas e uma nova cultura clínica. Mas os retornos são concretos. Não apenas financeiros — com a redução de internações e terapias agressivas —, mas também em fidelização e valor percebido pelas pacientes. É um caminho que exige visão de futuro, porque os resultados não aparecem de um dia para o outro. Mas se a lógica da prevenção é justamente olhar adiante, esse talvez seja o melhor exemplo de investimento que se paga no tempo, salvando vidas.

O alcance da APS digital vai além da prevenção. Durante o tratamento do câncer de mama, ela pode encurtar o tempo até o início da terapia, evitando atrasos que comprometem as chances de sobrevivência. No acompanhamento pós-tratamento, garante vigilância contra recidivas, acompanhamento de efeitos tardios e suporte emocional, papel muitas vezes negligenciado na rotina do sistema de saúde. Ao integrar especialistas, nutricionistas e psicólogos em uma mesma plataforma de cuidado, a telemedicina transforma a experiência da paciente e cria uma rede mais eficiente e humana.

Segundo o INCA, até 2025 teremos em média 73 mil novos casos de câncer de mama por ano no Brasil. Esse número não pode ser enfrentado apenas com campanhas sazonais. Outubro Rosa cumpre papel fundamental ao mobilizar a sociedade e iluminar a pauta, mas o que vai realmente mudar a curva da doença é a arquitetura de um sistema que não espere o problema aparecer para agir.

O futuro do cuidado em câncer de mama começa no primeiro nível de atenção, com telemedicina integrada, programas de rastreamento contínuos e acompanhamento longitudinal. Se aceitarmos que a incidência está se deslocando para idades antes e depois da faixa clássica, a única resposta coerente é ampliar o olhar preventivo e estruturar a APS digital como catalisador desse movimento. Cada consulta remota, cada lembrete, cada vigilância realizada a tempo pode representar a diferença entre uma vida interrompida e uma história preservada.


*Thaís Cunha Dias Ferreira é Coordenadora Médica na Dr. Online.

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