Saúde mental no Setembro Amarelo: um chamado coletivo
Por Thirza Reis
Setembro Amarelo nos convida, todos os anos, a falar sobre suicídio e saúde mental. É um tema sensível, cercado de estigmas e silêncios, mas que precisa ser enfrentado com coragem e presença. Quando olhamos para os dados do Ministério da Saúde, vemos que o suicídio é a quarta maior causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos no Brasil. Mas não é apenas entre os mais jovens que esse sofrimento se expressa: estudos mostram que, entre mulheres adultas de 35 a 50 anos, as taxas também vêm crescendo, revelando que pressões invisíveis, múltiplos papéis e expectativas sociais podem pesar de forma silenciosa e devastadora.
Uma vez ouvi uma palestrante dizer que “a ferida que não sangra dói mais”. Fiquei pensando sobre isso e ela tem razão. Pois a ferida que não sangra é invisível aos olhos e faz com que a pessoa que a sente questione sua verdade e seu valor. E este é o problema do adoecimento psíquico e emocional: ele não sangra, e justamente por isso é tantas vezes negligenciado. É necessário darmos visibilidade a essas dores para que não sigam sendo escondidas.
Falar de saúde mental é falar de vida, de escolhas cotidianas, de relações que podem ser tanto fonte de adoecimento quanto de cura. No ambiente de trabalho, esse tema se torna ainda mais urgente. Relações tóxicas, culturas organizacionais centradas apenas em metas e pressões constantes corroem a autoestima e fragilizam a saúde emocional. Por outro lado, ambientes que cultivam pertencimento, confiança e diálogo aberto podem ser fatores protetores, um espaço em que a pessoa se sente vista, validada e apoiada para pedir ajuda antes que o sofrimento se torne insuportável.
É nesse contexto que a liderança assume um papel fundamental. Líderes atentos, empáticos e preparados são capazes de reconhecer sinais de sofrimento em suas equipes e de acolher sem julgamento. Mas isso não é algo natural ou instintivo: é uma competência relacional que precisa ser desenvolvida e apoiada. Não basta cobrar que os líderes sejam o suporte para os outros se não lhes oferecemos também um espaço seguro de cuidado. Cuidar de quem cuida é uma responsabilidade que precisamos assumir coletivamente. Um líder adoecido, solitário em meio às pressões de resultados, dificilmente conseguirá sustentar uma equipe saudável.
Por isso, quando pensamos em Setembro Amarelo, não podemos restringir nossa atenção apenas à prevenção de crises individuais. Precisamos olhar para as estruturas que criamos e alimentamos todos os dias. Precisamos cultivar organizações que não apenas intervenham frente ao adoecimento, mas que promovam saúde mental de forma preventiva, intencional e estratégica. Que permitam que a vulnerabilidade seja reconhecida como força, que deem suporte real aos que estão na linha de frente e que compreendam que ninguém deve carregar o peso da vida sozinho.
O amarelo, neste mês, não deve ser apenas uma cor de alerta. Ele pode ser também a chama que ilumina o caminho da presença, da coragem de pedir e oferecer ajuda, da decisão de transformar ambientes em espaços onde a vida seja possível em sua plenitude. Falar sobre suicídio é falar sobre a importância das pessoas, reconhecer as vulnerabilidades que muitas vezes são invisíveis e cuidar das relações. É sobre a necessidade de cuidar das lideranças e sobre o compromisso coletivo de criar uma cultura de cuidado que sustente cada pessoa em sua jornada.
Pois, no fim das contas, saúde mental não se preserva apenas em consultórios ou campanhas, mas no modo como nos relacionamos todos os dias. E cada gesto — um olhar atento, uma escuta generosa, uma palavra de apoio — pode ser aquilo que impede o silêncio de se transformar em despedida.
*Thirza Reis é psicóloga e Sócia-Diretora da Homero Reis Relações Inteligentes e Coaching.