Como testes genéticos estão revolucionando os tratamentos
Nos últimos anos, a medicina personalizada deixou de ser uma promessa distante para se tornar realidade em muitos hospitais e clínicas do Brasil — graças ao avanço dos testes genéticos e biomarcadores, impulsionados pela Patologia Clínica. “Hoje, conseguimos identificar com precisão mutações genéticas e alterações biológicas que permitem ajustar os tratamentos de forma individualizada, melhorando a eficácia e reduzindo os efeitos colaterais, especialmente em câncer, doenças autoimunes e neurológicas”, explica João Bosco de Oliveira Filho, médico patologista clínico e oncogeneticista e coordenador do Comitê Científico de Genômica e Bioinformática da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML).
Os laboratórios de Patologia Clínica brasileiros vêm incorporando tecnologias sofisticadas como os painéis de sequenciamento de nova geração (NGS), Sequenciamento do Exoma e, mais recentemente, o sequenciamento completo do genoma. “Esses testes são fundamentais não só para diagnosticar e prever o risco de doenças, mas também para guiar terapias mais eficazes e seguras”, destaca João Bosco.
Entre os principais exames disponíveis atualmente estão o Sequenciamento do Genoma Completo, painéis tumorais multigene, expressão gênica, biópsia líquida (ctDNA), além de biomarcadores imuno-oncológicos e testes de farmacogenômica. “Cada um tem indicações precisas, que vão desde a definição de quimioterapia mais adequada em câncer de mama até o ajuste seguro de medicamentos em doenças inflamatórias intestinais”, ressalta o especialista.
Segundo ele, o impacto clínico desses exames é concreto. “Por exemplo, pacientes com câncer de pulmão que apresentam mutações EGFR (receptor do fator de crescimento epidérmico) podem receber medicamentos alvo-específicos como o osimertinibe, aumentando significativamente a sobrevida. Já em doenças infecciosas, identificar variantes genéticas permite evitar reações adversas graves, como no caso do teste HLA-B*57:01, essencial para pacientes HIV positivos tratados com abacavir”, detalha João Bosco.
Apesar dos avanços, ampliar o acesso a esses testes ainda é um desafio no Brasil. “Temos gargalos importantes: desde o financiamento e reembolso parcial pelos planos de saúde e SUS, até desigualdade regional e falta de profissionais capacitados em genômica”, aponta o especialista. Outro ponto crítico é a necessidade de infraestrutura tecnológica que garanta a privacidade e a gestão segura dos dados genômicos, conforme previsto na LGPD.
Para garantir a confiabilidade dos resultados, os laboratórios seguem padrões internacionais rigorosos. “Além das acreditações, como o PALC-SBPC/ML e ISO 15189, existe regulamentação sanitária específica e diretrizes técnicas para classificação e validação de variantes genéticas, o que assegura a qualidade dos testes”, reforça João Bosco.
O futuro da medicina personalizada é promissor. “Veremos biópsias líquidas ainda mais sensíveis para detectar resíduos mínimos de doença e novos modelos multi-ômicos, integrando dados genéticos, proteômicos e inteligência artificial. Também há expectativa em torno do uso de sequenciamento de longas leituras e biomarcadores imunológicos mais refinados, além da expansão das terapias gênicas”, antecipa o coordenador da SBPC/ML.
Segundo ele, esses avanços deverão reduzir o tempo para chegar ao tratamento ideal e ampliar ainda mais a abrangência da medicina personalizada no Brasil. “Para isso, é fundamental que políticas públicas acompanhem essa evolução, garantindo acesso equitativo e formação contínua de profissionais”, conclui João Bosco.