Cuidado masculino não se limita ao câncer de próstata

Por Hilton Monteiro da Rocha Neto

É curioso como a saúde masculina, apesar de ser um tema recorrente em campanhas de conscientização, parece sempre limitada a um mesmo ponto de partida: o câncer de próstata. Claro, essa é uma questão essencial, e os esforços para promover exames preventivos e diagnósticos precoces são extremamente válidos. Mas será que essa abordagem única não está deixando de lado outros problemas igualmente importantes e negligenciados?

A verdade é que há um silêncio que atravessa boa parte das questões de saúde masculina – e que simboliza mais do que as pessoas gostariam de admitir. Problemas como disfunção erétil, ejaculação precoce e a diminuição da libido são muito mais comuns do que se imagina, mas raramente recebem a mesma atenção. E não por falta de relevância: são condições que afetam diretamente a autoestima, a saúde mental e os relacionamentos dos homens.

Segundo uma pesquisa da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), mais da metade dos entrevistados já enfrentou falhas na “hora H”. Esses números são alarmantes, mas talvez o dado mais preocupante seja aquele que não está na pesquisa. Há uma quantidade extensa de homens que sofrem em silêncio, com vergonha de buscar ajuda. A cultura de “não falar sobre isso” ainda é tão enraizada que cria barreiras invisíveis, mas poderosas, entre o problema e a solução.

Essa omissão, infelizmente, é cúmplice de um ciclo de negligência que perpetua a ideia de que cuidar da saúde – especialmente a sexual – é um sinal de fraqueza. A disfunção erétil, por exemplo, é tratada como um tabu, enquanto deveria ser um tema central em campanhas educativas, não um coadjuvante. Do mesmo modo, a ejaculação precoce, que afeta cerca de 25,8% dos homens brasileiros, conforme o estudo Mosaico Brasil, é muitas vezes reduzida a piadas ou mal-entendidos, quando na verdade exige acompanhamento médico e psicológico.

E o que dizer da libido? Pouco se fala sobre como o desejo sexual pode ser impactado por uma combinação de fatores hormonais, fisiológicos e psicológicos. Ansiedade, estresse, depressão e até o uso de certos medicamentos podem influenciar o desejo masculino, mas essa conversa raramente vai além dos consultórios – só quando o problema já está insustentável.

Outro ponto curioso é que, enquanto as ações sobre câncer de próstata promovem um discurso assertivo e direto, as questões relacionadas à saúde sexual masculina ainda caminham com passos tímidos e hesitantes. É como se houvesse um medo de invadir um terreno desconfortável, de mexer em um vespeiro cultural que associa masculinidade à negação da fragilidade. Até quando se pode dar ao luxo de ignorar isso?

Se o objetivo é transformar a relação dos homens com o bem-estar, é preciso ir além dos esforços tradicionais. Não se trata de substituir campanhas, mas de complementá-las, trazendo à tona temas que não apenas afetam o corpo, mas fatores mentais e emocionais. Afinal, é impossível dissociar a saúde sexual de aspectos psíquicos. Tudo faz parte de um mesmo organismo.

A mídia, as instituições de saúde e a sociedade como um todo têm um papel importante nessa mudança. Criar ações que abordem questões como disfunção erétil ou perda de libido com naturalidade pode ser um passo poderoso para romper o silêncio. Mais do que isso, é necessário mudar a narrativa de que cuidar da saúde é um sinal de fraqueza; representa um ato de coragem e autoconsciência.

A saúde masculina é muito mais do que exames de rotina ou consultas anuais. É um campo vasto, cheio de nuances que só poderão ser exploradas quando a sociedade abrir espaço para o diálogo e para o cuidado integral. Talvez, quando a observância for além do óbvio, finalmente o sistema dará aos homens a chance de viver de forma mais plena e saudável. Seja no sentido do corpo, da mente ou do coração.


*Hilton Monteiro da Rocha Neto é médico urologista e andrologista especializado em saúde sexual masculina.

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