Doença renal crônica custa caro para pacientes e sistema de saúde
Por José Moura Neto
Qual a distância entre o diagnóstico de doença renal crônica (DRC) e a diálise? Entre o início da condição e essa fase do tratamento, existem diversos estágios – que podem se estender ao longo de anos. A possibilidade de a doença ser completamente assintomática em seus estágios iniciais é o grande desafio por trás dessa condição, o que muitas vezes resulta em atrasos no diagnóstico e, consequentemente, no tratamento. O diagnóstico tardio pode fazer com que a DRC seja identificada quando os rins já estão comprometidos e incapazes de filtrar o sangue de forma adequada. A descoberta da DRC em estágio avançado altera o desfecho da doença, impacta a qualidade de vida dos pacientes e sobrecarrega o sistema de saúde.
A DRC acomete 1 em cada 10 brasileiros. O Censo de Diálise da SBN (Sociedade Brasileira de Nefrologia) estima mais de 150 mil pacientes em diálise, número que mais do que dobrou nos últimos quinze anos. Terapias que substituem a função renal, como a hemodiálise, a hemodiafiltração, a diálise peritoneal ou o transplante renal, podem ser necessárias no estágio mais avançado da doença, quando os rins já não conseguem desempenhar suas funções de forma adequada.
Além dos impactos significativos em pacientes e familiares, a DRC em seus estágios mais avançados custa caro para sistemas de saúde em todo o mundo. No Brasil, cerca de 80% dos pacientes em diálise são atendidos pelo Sistema Único de Saúde, que sofre há alguns anos com tabelas e valores defasados. Em razão da falta de vagas e desassistência gerada pelo subfinanciamento do setor, o cenário tem sido denunciado pela SBN e por veículos de imprensa como uma ‘crise humanitária’. A estimativa de custos associados à DRC apresentada no estudo Inside-CKD foi de 3,6 bilhões de dólares em 2021, correspondendo a 2,7% dos gastos nacionais em saúde. Para 2026, projeta-se um aumento de 20,9%, atingindo um custo estimado de 4,4 bilhões de dólares – ou mais de 20 bilhões de reais, correspondendo a 3,2% dos gastos nacionais em saúde.
Infelizmente, a maioria dos pacientes com DRC no Brasil não sabe que tem a doença, ainda subdiagnosticada, como mostrou recentemente o estudo Reveal-CKD. Apenas 3% dos pacientes com DRC no estágio 3 foram notificados com o CID Primário da doença – estágio em que os sintomas podem tornar-se evidentes.
É fundamental diagnosticar os pacientes com doença renal crônica em seus estágios iniciais. Essa responsabilidade não se limita apenas à nefrologia e deve ser estendida também a outras especialidades médicas. Para isso, não precisaremos de grandes avanços tecnológicos ou novas (e caras) descobertas. A popularização de ferramentas diagnósticas baratas e disponíveis, como o exame simples de urina e a dosagem de creatinina no sangue, tem o potencial de mudar significativamente o panorama da doença renal crônica no país e reduzir o custo para pacientes e sistema de saúde.
*José Moura Neto é médico nefrologista e presidente da Sociedade Brasileira de Nefrologia.