O conceito de qualidade, visto por quem trabalha no setor, é um parâmetro de extrema relevância quando falamos em assistência em saúde, tendo em vista que a qualidade assistencial passa a estabelecer um perfil diferenciado no modo de fazer o cuidado.
Entende-se a qualidade como um processo dinâmico, ininterrupto e de atividade permanente e exaustiva de identificação de falha nas rotinas e procedimentos, que devem ser periodicamente revisados, atualizados e difundidos com a participação de todas as hierarquias profissionais.
Historicamente, em termos de desenvolvimento de métodos de padronização e melhoria contínua no ambiente das indústrias, a qualidade nasce na Revolução Industrial. Entretanto, a qualidade assistencial no ambiente hospitalar nasceu no século passado, em meados do ano de 1924, por meio de ações do Colégio Americano de Cirurgiões (CAC), que buscou estabelecer princípios para qualificar o atendimento no departamento através do Programa de Padronização Hospitalar.
Inicialmente, o programa não considerou o dimensionamento dos recursos humanos necessários para colocar em prática a padronização dos processos, e tampouco determinou a forma de avaliação dos resultados. Daí nasce a criação do Manual de Padronização como um documento mais desenvolvido e estruturado. No entanto, por estar isolada, a associação não conseguiu mantê-lo.
No Brasil, as iniciativas de classificação e categorização dos hospitais tiveram início a partir da gestão do sistema de saúde pública. Na década de 1930, o Censo Hospitalar do Estado de São Paulo foi criado com o intuito de regionalizar e hierarquizar os serviços, servindo de inspiração para outras propostas de qualificação da assistência em saúde. No ano de 1951, o Congresso Nacional do Capítulo Brasileiro do Colégio Internacional de Cirurgiões foi realizado em São Paulo. Nele, foram estabelecidos os primeiros padrões mínimos para o centro cirúrgico no Brasil. Foi necessário o envolvimento de diferentes associações para que os formatos de padronização da qualidade assistencial tenham a estrutura a que hoje temos acesso.
A partir desse movimento, iniciou-se a criação de sistemas de acreditação estruturados, e a qualidade assistencial passou por diferentes eras. A primeira foi a da inspeção, onde um conceito de qualidade ainda “primitivo” exprimia a finalidade de descobrir se o que se fazia entregava o resultado de acordo com o programado. Assim, 100% da prática eram inspecionados.
A medição e a quantificação dos resultados trouxeram a próxima era, a do controle estatístico, onde as fases do processo poderiam ser medidas por meio de diferentes indicadores. Essa era foi particularmente importante por nos ajudar a entender que há certa estabilidade nos processos, e assim identificar problemas e agir para evitar que eles ocorram. Após um grande salto, entramos na era da garantia da qualidade. Como o controle estatístico havia auxiliado na evolução dos processos, tornou-se possível identificar melhor o que causava os problemas. Assim, percebemos que não era apenas um processo que afetava todo o resultado.
Com isso, o foco passa a ser o sistema de gestão, quando surge o conceito da “cadeia de valor”. O sistema de gestão visa garantir a qualidade em todos os caminhos do processo até a entrega do resultado. A partir daí, o sistema se torna mais exigente, e entra em cena, na década de 1980, o mais importante dos elementos: o cliente.
Dessa forma, para além dos processos, a satisfação do cliente passou a ser o mais importante. Tudo precisava considerar a “dor do cliente”, e as necessidades reais almejadas por ele ao procurar uma determinada assistência. Agora, estamos adentrando a 5ª era da qualidade, na qual a estratégia é o mais importante.
A coleta e a análise das informações, bem como a análise dos processos a fim de identificar o que agrega ou não valor ao cliente ou paciente, precisam gerar ações e decisões com direcionamento estratégico. O objetivo é tomar decisões estratégicas por meio da gestão das informações e de tudo o que é necessário para analisar as opções e decidir pelo caminho mais ideal, em tempo real. Por isso, avançamos para ferramentas que nos ajudem a integrar os sistemas, melhorar a comunicação, agilizar a análise dos dados e conseguir prever as falhas, preparando-nos para os riscos eventuais.
A tecnologia aliada ao setor de qualidade
A utilização de tecnologias-chave, como a Inteligência Artificial (IA) na análise dos dados, torna-se cada vez mais uma realidade. No campo da saúde, é o sonho dos gestores poder trabalhar sem a necessidade de “apagar incêndios” todos os dias, com uma gestão mais estratégica e participativa. Almejamos ferramentas que nos apoiem na implantação de processos de melhoria contínua da qualidade assistencial, aplicando métodos práticos e objetivos. Queremos tornar realidade uma filosofia que respeite as pessoas, o ambiente, trazendo flexibilidade e qualificando o cuidar em saúde ao ponto de cuidar de quem cuida. A ideia é oferecer o ambiente mais qualificado possível para a promoção, a prevenção e a recuperação da saúde.
Para que a 5ª era da qualidade faça sentido, é preciso entender o que é primordial, a fim de que cada etapa do desenvolvimento do conceito formal e pessoal de qualidade faça sentido. O sentido traz vida às ações, as ações trazem vida aos processos, e os processos trazem vida aos resultados.
Nesse contexto, a tecnologia acaba sendo uma ferramenta poderosa, que pode ajudar os profissionais de qualidade a melhorar a eficiência dos serviços prestados aos pacientes. Ao usar a tecnologia de forma eficaz, os profissionais podem ajudar a garantir que os pacientes recebam o melhor atendimento possível.
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*Caroline Brandão é Gestora de qualidade corporativa na AHBB | Rede Santa Casa.