O melhor dessa inovação passa por uma tríade: cultura organizacional, comprometimento da liderança e investimento em tecnologia. Para explorar esse tripé e ajudar as empresas do setor de saúde a serem guiadas da maneira menos árdua, precisamos brevemente rememorar o que ocorreu nos últimos anos no setor financeiro.
Em 2018, o Banco Central iniciou as discussões sobre a criação de um sistema financeiro aberto entre as instituições, tanto privadas como públicas. Em 2019, o Bacen começou a ouvir o público por meio de consultas e foi amadurecendo a ideia do open banking, até que, em fevereiro de 2021, alterou a nomenclatura para open finance, incluindo não só bancos, mas também fintechs e operadoras de créditos, investimentos e abertura de contas de PF e PJ, entre outros serviços e produtos.
Primeiras lições
Aqui fica evidente algumas das diretrizes para as empresas e instituições públicas do setor de saúde. A primeira é que o open health precisa de uma liderança estável e, preferencialmente, que seja neutra o suficiente para garantir a todos os atores do setor a equidade necessária para oferecer serviços e produtos entre os participantes da iniciativa, incluindo investidores, fornecedores e, claro, os pacientes — clientes finais, em síntese. No setor financeiro, como descrito, a instituição responsável foi o Banco Central.
A título de exemplo, a iniciativa pode ser conduzida pelo Ministério da Saúde, que no ano passado lançou um projeto, tendo como referência o open finance, para “estimular a concorrência e promover maior qualidade no acesso à contratação de planos de saúde para mais de 49 milhões de beneficiários”. De lá para cá, não houve mais comunicação sobre o plano. No mais, como visto, foram praticamente seis anos da primeira discussão sobre o open banking até a posição em que hoje se encontra o open finance.
Em outras palavras, o open health vai levar um bom tempo para ser construído. Uma operação como essa, que impacta milhares de negócios e milhões de pessoas, não será e nem deve ser feita do dia para noite. Assim como ocorreu no setor financeiro, as instituições que irão guiar o open health devem viabilizar segurança, treinamentos, debates, propostas atrativas às empresas e tempo para que possam se adequar às propostas. Ademais, tudo isso deve ser feito de forma equânime.
Tríade do open health
Poderíamos chamar esse tópico mais prático de “como as empresas fazem; ou como elas deveriam fazer”. Não se trata aqui de passo de ousadia, pois cada empresa sabe o que é o melhor no momento e para o futuro. No entanto, como dito, estamos olhando para as experiências positivas e negativas que ocorrem na trajetória do open finance, e como as empresas podem aproveitar esses exames pragmáticos.
Esse é um tema complexo e vem sendo debatido há décadas. Nos últimos anos, ganhou destaque no mercado, incluindo no setor de saúde. Quando falamos de cultura organizacional alinhada ao projeto de open health, abordamos o comprometimento que executivos e colaboradores têm em vivenciar hábitos e rotinas alinhados com o projeto.
Isso significa afundar a cabeça em reuniões, debates, muita leitura e estudo de iniciativas e tecnologias que são ou podem ser aplicadas em um modelo na saúde. Assim como ocorreu no open finance, o open health é um experimento sério que precisa ter respaldo, vivência e oportunidades de descobertas, pois estamos falando de inovação.
Como qualquer outra cultura, a do open health não é um estágio, é uma etapa que deve ser construída e finalizada. Ela deve ser constante, começa hoje e nunca termina. Em outras palavras, ela precisa ser alimentada com novas perspectivas e retroalimentada com o que já foi visto. Fora isso, quanto maiores o projeto e sua evolução, a cultura organizacional do open health tende a ser ainda mais envolvente e desafiadora na empresa.
As empresas que não estiverem inseridas nesse contexto tendem a ficar à margem da inovação e serem menos relevantes no mercado. Investimento tecnológico é vital. Não existe open health sem esse investimento. Nessa lógica, sejamos sinceros, empresas que não reservam recursos financeiros para isso tendem a desaparecer nos próximos anos. Assim, todas as vezes que a palavra inovação aparecer no setor de saúde, leia open health, interoperabilidade de dados, personalização de serviços, produtos e comunicação.
Se a corporação não vê no open health o futuro da organização — a escolha é de cada um —, recomendamos no mínimo que invista em processos e ferramentas digitais, a começar por um prontuário digital. Em outras palavras, para sobreviver hoje e no futuro, as empresas de saúde precisam ser digitais. Na prática, é uma corrida contra o tempo. E, se você acha que sua empresa já alcançou um teto na digitalização, continue pesquisando e saiba que há muito a ser feito.
O setor de saúde tem capacidade de não só alcançar, mas também superar números como esses do open finance. Resta saber quem irá liderar esse projeto e quais empresas estarão envolvidas, uma vez que hoje o seu desenvolvimento é uma questão de tempo e, principalmente, de iniciativas.
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*Laís Fonseca é CEO da tech health QBem. Graduada em Administração e Políticas Públicas com MBA pelo MIT Sloan.