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Gestão Clínica

Manejo clínico de potenciais doadores de órgãos

A adoção de um pacote de medidas clínicas na forma de um checklist pode auxiliar na redução de perdas de potenciais doadores de órgãos?

O estudo DONORS (Donation Network to Optimize Organ Recovery Study), um grande ensaio clínico randomizado por clusters, demonstrou que um checklist guiado por metas para orientar o manejo clínico de potenciais doadores de órgãos pode auxiliar na diminuição de perdas de doadores por parada cardíaca, desde que haja adesão à maioria das metas clínicas indicadas na ferramenta. Os resultados foram apresentados por Glauco Westphal, no XXVIII Congresso Brasileiro de Medicina Intensiva, e publicados no periódico JAMA Network Open. Westphal é investigador principal do estudo e membro da Brazilian Research in Intensive Care Network (BRICNet).

O DONORS foi uma proposição da BRICNet, operacionalizada pelo Hospital Moinhos de Vento e financiada pelo Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (PROADI-SUS). Além disso, houve apoio da Coordenação Geral do Sistema Nacional de Transplantes (CGSNT), da Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina (SC Transplantes), da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB), da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), da Organização Nacional de Transplantes da Espanha e do projeto canadense Canada Donate.

O checklist foi estruturado a partir de uma meticulosa revisão da literatura que envolveu 25 especialistas sobre o tema. Essa força tarefa gerou as 19 recomendações que compõem a versão atualizada das Diretrizes Brasileiras de Manutenção do Potencial Doador de Órgãos publicadas nos periódicos Annals of Intensive Care Medicine e Critical Care Science. Assim, o pacote de medidas sugeridas pelo checklist testado no estudo contou com as melhores evidências disponíveis sobre o tema.

Aplicação do checklist

Westphal e seus colaboradores envolveram 63 hospitais distribuídos em 20 estados brasileiros. Na fase preparatória da pesquisa, os pesquisadores realizaram treinamentos presenciais sobre aplicação do checklist de manejo do potencial doador direcionados às equipes das Unidades de Terapia Intensiva (UTI) e das Coordenações Hospitalares de Transplantes (CHT) dos hospitais participantes do grupo intervenção (que utilizou o checklist de metas).

Enquanto isso, o grupo controle foi instruído a manter as práticas habituais de manejo do potencial doador de órgãos. Após a conclusão do estudo, as equipes de todos os centros do grupo controle também receberam treinamento. Adicionalmente, ambos os grupos de hospitais receberam treinamento de comunicação em situações críticas e de entrevista familiar para doação de órgãos, alcançando 426 profissionais treinados presencialmente e 3.766 virtualmente. 

Os investigadores detiveram-se ao cuidado clínico destinado aos potenciais doadores de órgãos em morte encefálica, pois as perdas de doadores durante o manejo clínico podem alcançar 20%, fato que contribui fortemente para a escassez de órgãos destinados para transplantes.

No período de junho de 2017 e novembro de 2019, foram incluídos 1.535 potenciais doadores em morte encefálica, 792 no grupo controle e 743 no grupo intervenção. Embora a intervenção tenha promovido uma diminuição de 30% na ocorrência de perdas de doadores (grupo controle: 14.8%; grupo intervenção: 9.4%), o resultado não alcançou significância estatística.

Pacote de medidas clínicas

Por outro lado, observou-se claramente um comportamento de dose-resposta da intervenção – quanto maior a adesão aos itens do checklist, menor a taxa de perdas de potenciais doadores. “Ou seja, se você comparar o checklist guiado por metas com um medicamento reconhecidamente eficaz, é fácil entender que não basta utilizar o medicamento (checklist) se não houver atenção à dose e à frequência corretas”, disse Glauco Westphal.

Quando os hospitais foram divididos em centros de “alta adesão” e de “baixa adesão” ao checklist, houve diminuição significativa de perdas de doadores nos centros de alta adesão (6.9%) quando comparados aos hospitais de baixa adesão (12.3%) e aos do grupo controle (14.8%). As taxas de doações efetivas foram maiores no grupo de alta adesão (51.8%) quando comparadas aos hospitais de baixa adesão (41.2%) e ao grupo controle (35.5%).

O estudo DONORS foi o maior ensaio clínico randomizado já conduzido envolvendo potenciais doadores de órgãos em morte encefálica. A abrangência nacional em diferentes realidades socioeconômicas permite generalizar os resultados para diferentes cenários.

“Embora a comparação direta entre os grupos intervenção e controle tenha sido inconclusiva quanto ao uso do checklist para guiar a manutenção do potencial doador, os resultados destacam a importância de se atentar para a utilização conjunta de diferentes medidas clínicas para esse manejo”, destacou Westphal. “Portanto, não basta simplesmente adotar um checklist de metas se não houver atenção sobre a adesão a um pacote de medidas clínicas”, conclui.


O estudo Effectiveness of an Evidence-Based Checklist to Delay Cardiac Arrest in Potential Brain-Dead Organ Donors, publicado em dezembro de 2023, está disponível no JAMA. https://jamanetwork.com/journals/jamanetworkopen/fullarticle/2812886

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